A redução ou a perda do movimento intestinal após cirurgias abdominais, chamada de íleo adinâmico, é normal e o intestino delgado volta às suas funções habituais em cerca de 24 a 48 horas e o cólon, em, aproximadamente, 48 a 72 horas.
Apesar de esperado, o íleo adinâmico pode causar desconforto e dor abdominal e, quando prolongado, prejuízos à recuperação pós-operatória e prolongação do tempo de internação.
Alguns agentes anestésicos estão envolvidos no mecanismo do íleo adinâmico, como os agentes bloqueadores neuromusculares não despolarizantes (NBNMs), usados para relaxamento neuromuscular na anestesia geral. O efeito de curarização residual no pós-operatório contribui para fraqueza muscular resultando na redução ou parada das contrações intestinais.
Alguns medicamentos são usados para reverter os efeitos dos NBNMs, como a neostigmina, que é um inibidor da acetilcolinesterase e tèm efeito procinético. Entretanto, a neostigmina causa náuseas e vômitos pós-operatórios.
Outros medicamentos como atropina, um agente anticolinérgico, também é usada para reverter os efeitos dos NBNMs. Estudos estão avaliando os efeitos de outros medicamentos, como o sugammadex, uma gama-ciclodextrina modificada, no reestabelecimento das funções intestinais pós-operatória.
Assim, um estudo recentemente publicado teve por objetivo avaliar os efeitos do sugammadex sozinho ou associado à atropina e à neostigmina na recuperação das funções intestinais em pacientes submetidas à cirurgia ginecológica abdominal sob anestesia geral. O bloqueador neuromuscular usado foi o rocurônio.
Método
Trata-se de ensaio unicêntrico, prospectivo e randomizado, que avaliou 90 pacientes com idade entre 18 a 65 anos, divididas em 3 grupos: grupo S, que recebeu sugammadex (2 mg/kg) apenas; grupo S1N, que recebeu sugammadex (1 mg/kg) + neostigmina (20 µg/kg) + atropina (10 µg/kg); e grupo S2N, que recebeu sugammadex (1,5 mg/kg) + neostigmina (20 µg/kg) + atropina (10 µg/kg).
O desfecho primário foi o tempo da primeira eliminação de flatus. Os desfechos secundários foram o tempo da primeira evacuação e o tempo de recuperação, definido pelo Train-of-four-ratio (TFOR) 90, que é uma medida usada para avaliar a recuperação da função neuromuscular após uso de bloqueadores neuromusculares.
Resultados e discussão
O tempo até o início da dieta via oral foi em média de 6 horas nos 3 grupos. A quantidade média de fluido administrado nas primeiras 24 horas foi de 2850ml do grupo S e 3000ml nos grupos S1N e S2N.
O tempo até a primeira eliminação de flatus foi, em média, de 12 horas no grupo S e 15 horas nos grupos S1N e S2N. O tempo médio até a primeira evacuação foi de 36 horas no grupo S e 38 horas nos grupos S1N e S2N. Portanto, em nenhum desses desfechos foi observado diferença estatisticamente significativa entre os 3 grupos (p> 0,05).
Por outro lado, em relação ao tempo para alcançar a TFOR de 90% e ao tempo de extubação, houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos, p< 0,01 e p< 0,03, respectivamente.
Os dados obtidos no presente estudo revelam que a neostigmina associada ao sugammadex não reduziu o tempo de retorno da função intestinal ou a redução do íleo adinâmico nas pacientes submetidas à cirurgia ginecológica abdominal sob anestesia geral.
Mensagem prática
A neostigmina adicionada ao sugammadex não mostrou acelerar a recuperação da função intestinal. Entretanto, o estudo mostrou que doses menores de sugammadex (1,5mg/kg) tem efeitos semelhantes a doses maiores (2 mg/kg) em combinação com a neostigmina.
Considerando os custos dos medicamentos e o fato de o preço da neostigmina corresponder a 10% do valor do sugammadex, essa combinação pode ajudar a reduzir custos hospitalares com eficácia semelhante. Entretanto, é importante ressaltar que o presente estudo, dado as suas limitações, não corresponde a um estudo com força para estabelecimento de condutas.
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