Cirurgias pancreáticas são conhecidas pela alta morbidade que variam de 10% a 20%. Uma das principais complicações relacionadas a esses procedimentos é a fístula pancreática. O uso de drenos abdominais é amplamente usado com o objetivo de reduzir as complicações relacionadas às fístulas, permitindo a drenagem de secreções.
Entretanto, atualmente, seu uso vem sendo questionado devido a complicações relacionadas aos drenos como infecções e, até mesmo, aumento nas taxas de fístulas. Em um mundo com protocolos de aceleração da recuperação pós-operatória como o Enhanced Recovery After Surgery (ERAS) e Aceleração da Recuperação Total Pós-Operatória (ACERTO) no Brasil, o uso racional e limitado de drenos deve ser incentivado, desde que com respaldo científico.
Dado ao surgimento de novos estudos pregando a não colocação rotineira de drenos em cirurgias pancreáticas, Leite LF et. al. realizaram uma meta-análise para avaliar tais indicações e suas possíveis consequências.
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Métodos
O estudo brasileiro, publicado em agosto de 2025, realizou uma revisão sistemática e meta-análise de estudos relacionados a drenagem ou não da cavidade abdominal em cirurgias pancreáticas. Foram analisados artigos publicados entre 2001 e 2024.
Resultados
Após criteriosa seleção, foram analisados 5 artigos que englobaram, ao todo, 1337 pacientes, dos quais 676 foram submetidos a drenagem abdominal após cirurgia pancreática e 661 não foram submetidos a drenagem profilática. Em relação ao tipo de cirurgia realizada, 604 foram submetidos a pancreatectomia distal, 666 a duodenopancreatectomia e 67 a outros tipos de ressecção.
Nos primeiros 90 dias de pós-operatório, o grupo randomizado para drenagem profilática apresentou menores taxas de mortalidade (RR 0,22; IC 95% 0,06-0,75; P < 0,05), com significância estatística. Entretanto, não houve diferenças estatisticamente significativas nas análises das morbidades geral (RR 1,08; IC 95% 0,97-1,21; P =0,17) e maior (RR 1,02; IC 95% 0,76-1,44; P = 0,92). Também não foram encontradas diferenças significativas entre os dois grupos nas avaliações das taxas de abscesso abdominal (RR 0,98; IC 95% 0,54–1,78; P = 0,93), acúmulo de líquidos abdominais (RR 0,56; IC 95% 0,11–2,93; P = 0,48), infecção da ferida operatória (RR 1,07; IC 95% 0,75–1,52; P = 0,70), hemorragia (RR 1,11; IC 95% 0,63–1,97; P =0,71) e reabordagem cirúrgica (RR 1,22; IC 95% 0,83–1,80; P = 0,31)
O estudo conduzido por Leite LF et. al. também avaliou a ocorrência de fístulas de acordo com o escore de risco para fístulas. A avaliação dos grupos com baixo risco para o desenvolvimento de fístulas pancreáticas revelou maiores taxas dessa complicação no grupo submetido a drenagem profilática (RR 4,32; IC 95% 1,27–14,64; P <0,01), mas não houve diferença estatisticamente significativa nos grupos de médio e alto risco para fístula em relação a drenagem profilática (RR 1,18; IC 95% 0,79–1,52; P = 0,41).
A comparação por tipo de cirurgia não revelou diferenças nas taxas de fístulas entre os grupos com drenagem profilática e sem drenagem nas duodenopancreatectomias (RR 1,05; IC 95% 0,26–4,200). Entretanto, nos pacientes submetidos a pancreatectomias distal, os que submetidos a drenagem profilática apresentaram maiores taxas de fístulas (RR 1,87; IC 95% 1,23–2,860
Mensagem prática
Sabe-se, atualmente, que os drenos profiláticos não reduzem as taxas de ocorrência de fístula. Entretanto, quando presentes, seu uso é feito com a justificativa de reduzir complicações relacionadas às fístulas, como acúmulo de líquidos, coleções e abscessos na cavidade, além de poder direcionar a fístula, quando presente.
O presente estudo não encontrou vantagens sólidas para o uso profilático de drenos, mesmo em cirurgias complexas e com várias anastomoses como a duodenopancreatectomia. Entretanto, ainda é precoce a indicação formal ou contraindicação dos drenos profiláticos, sendo sensato a avaliação criteriosa no decorrer da cirurgia e dos riscos associados, a critério da equipe cirúrgica.
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