Como otimizar a ventilação mecânica no intraoperatório?
Estudos recentes levantaram a hipótese de que a quantidade de energia transmitida na ventilação mecânica poderia induzir lesão pulmonar.
Durante o período intraoperatório é preciso se preocupar sobre como o paciente irá evoluir após a cirurgia. Pequenas alterações em parâmetros ventilatórios podem modificar a morbimortalidade de quem está sendo operado. Nesse sentido devemos manter parâmetros de ventilação mecânica protetora durante o ato operatório.
Existe uma ideia que tenta unificar os diversos parâmetros da ventilação mecânica protetora, dentro da ideia de “energia mecânica transmitida ao paciente”. Esse é o conceito de mechanical power (potência mecânica), cuja unidade se dá em joules por minuto (J/min). Ele integra o trabalho realizado pelo ventilador mecânico que acaba sendo transmitido para o pulmão do paciente.
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Estudos recentes levantaram a hipótese de que a quantidade de energia transmitida do ventilador mecânico para o pulmão poderia induzir lesão pulmonar. Contudo, não está claro se o mesmo conceito que é aplicado para paciente que está com Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) pode ser aplicado para o pulmão de um paciente previamente hígido que será submetido a uma cirurgia eletiva. Isso ocorre pois um paciente com o pulmão doente possui uma mecânica pulmonar diferente de um paciente hígido.
Hipótese do Estudo sobre ventilação mecânica
Foi publicado na revista Anesthesiology um estudo interessante que questionou se um Mechanical Power maior estaria associado à insuficiência respiratória com necessidade de reintubação após o ato cirúrgico.
Método
O estudo foi desenhado como uma coorte retrospectiva que analisou dados de dois grandes hospitais (Massachusetts General Hospital e Beth Israel Deaconess Medical Center em Boston, Massachusetts) entre 2008 e 2018. Os dados foram extraídos de prontuários eletrônicos, assim como registros dos parâmetros do ventilador. A amostra foi composta por 230.767 adultos que seriam submetidos a procedimentos eletivos, não cardíacos, sob anestesia geral, com ASA I a IV. O cálculo do mechanical power foi baseado na seguinte fórmula:
Mechanical power (J/min) = 0,098 × RR × Vt × (PEEP + ½[Pplat − PEEP] + [Ppeak − Pplat])
Sendo RR a frequência respiratória; Vt o volume corrente; PEEP a pressão positiva no fim da expiração; Pplat a pressão de platô e Ppeak a pressão de pico.
Os desfechos propostos foram: insuficiência respiratória com necessidade de reintubação em sete dias no pós-operatório e hipoxemia após a extubação (definida como saturação menor que 90% em até dez minutos da extubação ou até a saída da sala cirúrgica). As análises de regressão logística foram realizadas para avaliar as relações entre mechanical power e os desfechos.
Resultados
No total 2.024 casos (0,9%) precisaram de reintubação por insuficiência respiratória em até sete dias de pós-operatório. A mediana do mechanical power foi maior em pacientes que apresentaram insuficiência respiratória pós-operatória (7,67 [IQR 5,64-10,11] vs 6,62 [IQR 4,62-9,10] J/min; p < 0,001). Um mechanical power maior foi associado a maiores chances de reintubação no pós-operatório: cada aumento de 5 J/min aumentou as chances de reintubação em 31%. Hipoxemia pós-extubação ocorreu em 8.374 (4,7%) pacientes. Maiores chances de hipoxemia pós-extubação foram associadas com maior mechanical power.
Discussão sobre a ventilação mecânica no intraoperatório
Houve uma associação estatística entre um maior mechanical power durante a ventilação mecânica no intraoperatório e a insuficiência respiratória com necessidade de reintubação no pós-operatório. Ocorreu um aumento nas chances de reintubação de 1,31 para cada aumento no mechanical power de 5 J/min.
Contudo, como foi um estudo retrospectivo, não é possível determinar uma relação de causa-efeito. Não se pode dizer, através dos dados, que uma modificação no mechanical power realmente irá afetar os resultados do paciente. Também é preciso lembrar que a mecânica respiratória de um paciente submetido à cirurgia eletiva é completamente distinta de um paciente na UTI com SDRA. Talvez a observação de um paciente com mechanical power mais alto, possa ser usado para identificar aqueles em maior risco de insuficiência respiratória após a cirurgia.
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Mensagem Prática
O mechanical power está sendo ativamente estudado no contexto de terapia intensiva, como fator a ser controlado na SDRA, a fim de evitar lesão pulmonar induzida pelo ventilador. Esse estudo nos mostrou que esse fator pode ser importante em pacientes submetidos a cirurgias eletivas, para predizer insuficiência respiratória no pós-operatório. No entanto, devemos aguardar estudos prospectivos randomizados antes de aplicar o conceito de mechanical power para guiar ajustes na ventilação mecânica dos pacientes.
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