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Cirurgia17 novembro 2022

Como otimizar a ventilação mecânica no intraoperatório?

Estudos recentes levantaram a hipótese de que a quantidade de energia transmitida na ventilação mecânica poderia induzir lesão pulmonar.

Por André Aranda

Durante o período intraoperatório é preciso se preocupar sobre como o paciente irá evoluir após a cirurgia. Pequenas alterações em parâmetros ventilatórios podem modificar a morbimortalidade de quem está sendo operado. Nesse sentido devemos manter parâmetros de ventilação mecânica protetora durante o ato operatório.

Existe uma ideia que tenta unificar os diversos parâmetros da ventilação mecânica protetora, dentro da ideia de “energia mecânica transmitida ao paciente”. Esse é o conceito de mechanical power (potência mecânica), cuja unidade se dá em joules por minuto (J/min). Ele integra o trabalho realizado pelo ventilador mecânico que acaba sendo transmitido para o pulmão do paciente.

Leia também: Quando iniciar a mobilização de pacientes graves na ventilação mecânica?

Estudos recentes levantaram a hipótese de que a quantidade de energia transmitida do ventilador mecânico para o pulmão poderia induzir lesão pulmonar. Contudo, não está claro se o mesmo conceito que é aplicado para paciente que está com Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) pode ser aplicado para o pulmão de um paciente previamente hígido que será submetido a uma cirurgia eletiva. Isso ocorre pois um paciente com o pulmão doente possui uma mecânica pulmonar diferente de um paciente hígido.

Como otimizar a ventilação mecânica no intraoperatório?

Hipótese do Estudo sobre ventilação mecânica

Foi publicado na revista Anesthesiology um estudo interessante que questionou se um Mechanical Power maior estaria associado  à insuficiência respiratória com necessidade de reintubação após o ato cirúrgico.

Método

O estudo foi desenhado como uma coorte retrospectiva que analisou dados de dois grandes hospitais (Massachusetts General Hospital e Beth Israel Deaconess Medical Center em Boston, Massachusetts) entre 2008 e 2018. Os dados foram extraídos de prontuários eletrônicos, assim como registros dos parâmetros do ventilador. A amostra foi composta por 230.767 adultos que seriam submetidos a procedimentos eletivos, não cardíacos, sob anestesia geral, com ASA I a IV. O cálculo do mechanical power foi baseado na seguinte fórmula:

Mechanical power (J/min) = 0,098 × RR × Vt × (PEEP + ½[Pplat − PEEP] + [Ppeak − Pplat])

Sendo RR a frequência respiratória; Vt o volume corrente; PEEP a pressão positiva no fim da expiração; Pplat  a pressão de platô e Ppeak a pressão de pico.

Os desfechos propostos foram: insuficiência respiratória com necessidade de reintubação em sete dias no pós-operatório e hipoxemia após a extubação (definida como saturação menor que 90% em até dez minutos da extubação ou até a saída da sala cirúrgica). As análises de regressão logística ​​foram realizadas para avaliar as relações entre mechanical power e os desfechos.

Resultados

No total 2.024 casos (0,9%) precisaram de reintubação por insuficiência respiratória em até sete dias de pós-operatório. A mediana do mechanical power foi maior em pacientes que apresentaram insuficiência respiratória pós-operatória (7,67 [IQR 5,64-10,11] vs 6,62 [IQR 4,62-9,10] J/min; p < 0,001). Um mechanical power maior foi associado a maiores chances de reintubação no pós-operatório: cada aumento de 5 J/min aumentou as chances de reintubação em 31%. Hipoxemia pós-extubação ocorreu em 8.374 (4,7%) pacientes. Maiores chances de hipoxemia pós-extubação foram associadas com maior mechanical power.

Discussão sobre a ventilação mecânica no intraoperatório

Houve uma associação estatística entre um maior mechanical power durante a ventilação mecânica no intraoperatório e a insuficiência respiratória com necessidade de reintubação no pós-operatório. Ocorreu um aumento nas chances de reintubação de 1,31 para cada aumento no mechanical power de 5 J/min.

Contudo, como foi um estudo retrospectivo, não é possível determinar uma relação de causa-efeito. Não se pode dizer, através dos dados, que uma modificação no mechanical power realmente irá afetar os resultados do paciente. Também é preciso lembrar que a mecânica respiratória  de um paciente submetido à cirurgia eletiva é completamente distinta de um paciente na UTI com SDRA. Talvez a observação de um paciente com mechanical power mais alto, possa ser usado para identificar aqueles em maior risco de insuficiência respiratória após a cirurgia.

Ouça mais: Ventilação mecânica: como iniciar? [podcast]

Mensagem Prática

O mechanical power está sendo ativamente estudado no contexto de terapia intensiva, como fator a ser controlado na SDRA, a fim de evitar lesão pulmonar induzida pelo ventilador. Esse estudo nos mostrou que esse fator pode ser importante em pacientes submetidos a cirurgias eletivas, para predizer insuficiência respiratória no pós-operatório. No entanto, devemos aguardar estudos prospectivos randomizados antes de aplicar o conceito de mechanical power para guiar ajustes na ventilação mecânica dos pacientes.

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Referências bibliográficas

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