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Carreira2 dezembro 2025

Como você comunica as informações sobre riscos para o seu paciente?

O que significa para um paciente ouvir que há 4% de chance de complicações após uma cirurgia? Saiba como explicar os dados a ele

As pesquisas médicas estão nos fornecendo cada vez mais uma quantidade enorme de dados numéricos para descrever informações de riscos de mortalidade, probabilidades de benefícios ou malefícios esperados, efeitos adversos. Isso é algo bom para a tomada de decisão em saúde, mas que aumentou a dependência da interpretação adequada desses números, gerando um problema entre informações disponíveis e a capacidade do paciente para compreendê-las.

Para nós, médicos, essa comunicação não acaba apenas ao transmitir as estatísticas durante uma explicação de risco ao paciente. Na verdade, gira em torno da construção de uma estratégia para dar sentido aos números a fim de que a conversa com o paciente tenha a compreensão acessível e seja capaz de sustentar a confiança necessária para uma decisão compartilhada.

O que significa para um paciente ouvir que há 4% de chance de complicações após uma cirurgia? Ou que a probabilidade de um efeito colateral grave de um medicamento é de 2%? Números isolados pouco significam se não forem contextualizados dentro da realidade do paciente.

O que vemos é que, diante da decisão de um procedimento médico ou de uma escolha de tratamento, muitos pacientes não compreendem, ignoram ou distorcem esses dados, recorrendo a relatos pessoais ou fontes de internet para embasar suas escolhas.

Quem nunca percebeu durante uma consulta um receio do paciente porque o vizinho passou mal quando usou o remédio que será prescrito ou por que um conhecido teve complicações na mesma cirurgia que o paciente vai realizar?

Existem estratégias específicas para que os médicos superem a complexidade desse desafio da comunicação médica. Pensando nisso, Peters et al compartilharam no artigo Communicating Numeric Risk Information to Patients, publicado no Journal of General Internal Medicine, a perspectiva sobre alguns desses desafios, como superá-los e sugerem boas práticas para comunicar informações sobre riscos aos pacientes.

 

O que torna a comunicação de risco tão difícil? 

Diversos fatores contribuem. Há uma tendência entre comunicadores, incluindo médicos, de preferir usar descrições verbais ou qualitativas ao falar dos riscos em diversos contextos. Para isso, usamos palavras como “raro” ou “comum”, em vez de citar os números em si. O problema é que os pacientes interpretam essas expressões de forma muito variável e podem, por exemplo, superestimar a probabilidade de algo negativo acontecer.

Alguns pacientes, mesmo adultos, também têm baixa familiaridade com números e compreensão limitada mesmo para estatísticas simples. Ou, quando entendem um número, nem sempre conseguem atribuir a ele um significado prático. A diferença entre 16% e 20% de mortalidade, por exemplo, pode parecer irrelevante para uns ou preocupante para outros. Também tem peso sobre esses resultados, os atalhos mentais que utilizamos para tomar decisões, como dar mais importância para experiências pessoais de amigos ou familiares do que às evidências científicas em geral.

Outro ponto que aumenta a dificuldade da comunicação de risco é a incerteza dos dados numéricos, que são baseados em populações específicas e não necessariamente se aplicam ao paciente. Sem deixar de falar do fato de que nós, médicos, podemos presumir que os pacientes compreendem termos técnicos ou estatísticos durante uma explicação, quando na realidade essas informações são mal interpretadas.

 

Como superar os desafios da comunicação de riscos?

Peters et al apontam algumas estratégias para enfrentar os desafios da comunicação de risco. A primeira delas é, sempre que possível, usar números ao invés de palavras. Dizer que há “7% de chance de dor de cabeça” pode ser mais fácil de compreender do que “dores de cabeça são comuns”. Outro ponto é reduzir o esforço cognitivo do paciente, apresentando os dados mais relevantes, já calculados e contextualizados, sem sobrecarga de informações.

Também faz parte dessa comunicação dar significado aos números, comparando valores de referência ou traduzindo em termos. O médico deve, por exemplo, explicar que um risco de 6% costuma ser considerado ruim ou que o risco do paciente é de 6%, mas o risco médio na população é de 12%. Também explicar que estimativas são aproximações, que variam conforme as características individuais de cada paciente. Isso pode ser feito com expressões como “em torno de”, “aproximadamente” ou mostrando ao paciente os intervalos de confiança.

Como última estratégia proposta, o médico deve testar sua comunicação com a técnica de ensino reverso, pedindo que o paciente repita com suas próprias palavras o que entendeu. Assim é possível identificar falhas na compreensão e corrigi-las antes de uma decisão equivocada.

Por fim, não basta sermos médicos cientificamente precisos, também somos educadores e tradutores do conhecimento médico. A comunicação de riscos é um processo que exige linguagem acessível e contextualizada, estratégias de alfabetização em saúde, interpretação e empatia para fortalecer a autonomia e a confiança do paciente no processo de cuidado.

Autoria

Foto de Juliana Karpinski

Juliana Karpinski

Editora médica assistente de Carreira da Afya. Médica e Jornalista formada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). MBA em Gestão Estratégica pela UFPR.

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