Muitas pessoas tem doenças que nem sequer conseguimos imaginar a dor. Uma doença autoimune avassaladora, um câncer, uma doença transmissível de difícil tratamento, uma falência de órgão vital. Quantas vezes não me peguei imaginando como eu reagiria se, no lugar de médica, estivesse eu na cadeira do paciente recebendo aquela notícia que estava dando. Como reagiria? Como gostaria que me contassem sobre a minha doença?
Dar uma notícia difícil nunca é simples. Para muitos médicos, esse é um dos momentos mais desafiadores da prática clínica. É necessário sentimento, sensibilidade, tato. Mais do que informar um diagnóstico, trata-se de acolher, ouvir, entender e caminhar com o paciente diante de uma realidade que, ao menos temporariamente, mudará sua vida.
Mas sim, podemos fazer desse momento algo menos sofrido. Algumas estratégias bem estudadas podem tornar esse processo mais humano, eficaz e, sim, menos desgastante para todos os envolvidos. Vamos aprender com quem estudou sobre o assunto.
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Estratégias de comunicação
Comunique-se de forma clara, empática e adaptada
Precisamos saber que a forma como entregamos a notícia faz total diferença para o paciente. Diretrizes da Sociedade Americana de Oncologia Clínica enfatizam a importância de uma linguagem simples, livre de jargões técnicos, e de um tom empático. Frases como “Eu gostaria de ter melhores notícias, mas…” demonstram humanidade e criam espaço para que o paciente se sinta acolhido.
Após a entrega da notícia, é essencial fazer uma pausa. Respire, abaixe a cabeça, seu paciente precisa processar o que ouviu. O silêncio nessa hora pode ser constrangedor, mas o paciente precisa disso; o cérebro dele estará a mil e esse tempo de silêncio será essencial. Reações emocionais devem ser recebidas com escuta ativa e empatia – e não com pressa de resolver ou preencher o silêncio.
Além disso, adaptar a quantidade de informação ao estado emocional do paciente é um sinal de sensibilidade clínica. Perguntar “Você gostaria que eu explicasse mais?” ou “Como você está se sentindo com isso até aqui?” ajuda a modular o ritmo da conversa e a incluir o paciente como agente ativo no diálogo.
Promovendo aceitação e enfrentamento
Estudos com pacientes com mieloma múltiplo mostram que a aceitação do prognóstico está associada a apoio social, foco no presente e um certo grau de pensamento positivo.
Os médicos podem, portanto, estimular o paciente a valorizar momentos significativos mesmo diante de um futuro incerto. E não, isso não é oferecer falsas esperanças, mas é ajudar o paciente a encontrar sentido, forças e autonomia dentro da nova realidade da doença e, ao mesmo tempo, seguir com o tratamento da melhor forma possível.
Construindo entendimento compartilhado
Outro fator que influencia a aceitação é o sentimento de que médico e paciente estão alinhados quanto à compreensão do quadro clínico. Quando o médico utiliza as próprias palavras do paciente ao explicar a doença ou recomendar um tratamento, há um ganho significativo em adesão.
O paciente e os familiares sabem o que fazer, sabem qual é o próximo passo. Essa prática sinaliza respeito pela perspectiva do outro e fortalece o vínculo terapêutico.
Preparação e presença real reduzem sofrimento
A forma como a notícia é estruturada também impacta diretamente o bem-estar emocional do paciente. Pesquisas mostram que, quando o paciente é previamente preparado para a possibilidade de um diagnóstico ruim, tem a chance de convidar alguém de confiança para estar presente, recebe explicações claras e consegue tirar suas dúvidas no mesmo dia, os níveis de ansiedade e depressão são consideravelmente menores.
Uma notícia ruim dada de surpresa podem levar o paciente a nem entender o que foi dito. Se o paciente preferir, deixe que leve mais acompanhantes, dentro do contexto possível do local.
Modelos que ajudam na prática
Para médicos que buscam um guia mais estruturado, vale conhecer modelos como o SPIKES, Ask-Tell-Ask e NURSE. Eles oferecem um roteiro claro para conduzir conversas difíceis, reconhecendo emoções, validando esperanças e alinhando expectativas realistas ao cuidado possível.
No caso de doenças complexas e progressivas, como o Parkinson, doença renal crônica terminal, a comunicação centrada no paciente — que respeita seus valores, sua história e suas necessidades — é ainda mais essencial. A entrega do diagnóstico pode ser uma oportunidade de fortalecer a confiança e abrir espaço para decisões compartilhadas ao longo do caminho.
Conclusão
Receber um diagnóstico difícil é, quase sempre, um momento que marca a vida de uma pessoa. Para nós, médicos, pode ser apenas mais uma consulta em meio a tantas. Mas, para quem está do outro lado, é o começo de uma nova realidade – muitas vezes assustadora, cheia de incertezas.
Por isso, coloque-se no lugar do seu paciente. Dê a notícia da forma como você gostaria de recebê-la se estivesse naquela cadeira. Com clareza, mas também com cuidado, respeito e compaixão.
E se você já tem anos de estrada, não deixe que a rotina endureça o olhar. Lembre-se: o que para você é familiar, para o paciente é inédito. Você pode fazer toda a diferença naquele instante. Ser apenas o mensageiro, ou ser um apoio. A escolha é sua – e ela importa.
Autoria

Ester Ribeiro
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