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Cardiologia10 julho 2025

Poluição e risco de doença aterosclerótica 

Estudos indicam que a poluição atmosférica promove o desenvolvimento de placas ateroscleróticas por meio de múltiplas vias.
Por Ivson Braga

Apesar dos avanços no controle dos fatores de risco tradicionais das doenças cardiovasculares, poucos profissionais de saúde têm se atentado ao papel da poluição do ar na gênese e na progressão da aterosclerose. Estudos recentes têm demonstrado que a exposição a poluentes ambientais, principalmente o contato com partículas finas (PM2.5), está associada ao desenvolvimento e progressão da aterosclerose. O artigo de revisão recém-publicado na revista Atherosclerosis (Air pollution and atherosclerosis) traz dados epidemiológicos e experimentais sobre como a exposição crônica à poluição pode acelerar o desenvolvimento de placas ateroscleróticas e aumentar o risco de doença aterosclerótica. 

Evidências epidemiológicas 

Estudos populacionais de diferentes regiões do mundo demonstram associações consistentes entre níveis mais altos de poluição do ar e indicadores morfológicos de aterosclerose. A maioria dessas evidências envolve a exposição a PM2.5 e seu impacto sobre a espessura da camada média íntimal das carótidas, a calcificação da artéria coronária e a calcificação da aorta. O estudo de Kunzli et al. (2005) demonstrou que um aumento de 10 μg/m³ em PM2.5 se associava a um acréscimo de 5,9% na espessura da camada média intimal carotídea. Meta-análises subsequentes estimaram aumentos de até 16,89 μm na espessura da camada médio intimal por incremento de 10 μg/m³ em PM2.5. 

Associações significativas também foram observadas entre exposição ao tráfego e medidas de calcificação arterial, além de estudos com jovens e adolescentes que sugerem que a exposição precoce já contribui para alterações vasculares subclínicas. 

Ainda que alguns estudos não tenham encontrado significância estatística, a maioria mostra uma tendência positiva, especialmente nos desfechos relacionados à espessura da parede arterial. Revisões sistemáticas apontam que aproximadamente 60% dos estudos avaliados encontram associações positivas entre poluição e aterosclerose. 

Evidências mecanicistas 

Estudos experimentais em modelos animais e celulares demonstram os mecanismos pelos quais a poluição do ar pode acelerar a aterosclerose: 

  • Estresse oxidativo: partículas ultrafinas e gases poluentes promovem a geração de radicais livres que oxidam LDL e reduzem a disponibilidade de óxido nítrico, favorecendo a disfunção endotelial. 
  • Inflamação sistêmica: exposição a PM2.5 aumenta citocinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-6, MCP-1) e reduz IL-10, favorecendo infiltração monocitária e formação de células espumosas. 
  • Ativação endotelial: aumento na expressão de moléculas de adesão (ICAM-1, VCAM-1), facilitando a migração de monócitos para a íntima arterial. 
  • Disfunção do HDL: alterações na função antioxidante e anti-inflamatória do HDL reduzem sua capacidade de remover colesterol dos macrófagos. 
  • Instabilização da placa: a exposição prolongada leva ao aumento da expressão de metaloproteinases (como MMP-9), promovendo a degradação da capa fibrosa, além de elevação de marcadores trombogênicos e formação de núcleos necróticos instáveis. 

Os autores destacam que, embora as evidências epidemiológicas e mecanísticas sejam robustas, os efeitos cardiovasculares da poluição ainda são subestimados em políticas públicas e na prática médica. Reforçam que a variabilidade nos resultados se deve, em grande parte, a limitações metodológicas como imprecisões na estimativa de exposição, variabilidade individual e dificuldades na medição de pequenas alterações morfológicas. Também argumentam que é necessário o desenvolvimento de métodos de imagem mais sensíveis e padronizados para detecção precoce de aterosclerose. 

Entre novas abordagens e direções futuras de pesquisas sobre poluição do ar e aterosclerose, é colocado a criação de sensores pessoais de exposição e uso de inteligência artificial para análise de grandes bases de dados. Também é destacada a importância da identificação de poluentes específicos e de populações mais suscetíveis para o direcionamento de intervenções, além da necessidade urgente de estudos que avaliem o impacto de medidas de mitigação (zonas de baixa emissão, uso de máscaras ou purificadores) sobre marcadores de aterosclerose. 

A revisão traz dados importantes que colocam a poluição do ar como um potencial fator de risco para a aterosclerose e para eventos cardiovasculares maiores. Esse risco ao que parece, contribui para progressão de todas as fases da doença aterosclerótica, desde a disfunção endotelial até a ruptura da placa. Diante desse panorama, cabe a reflexão: você tem incluído a exposição à poluição do ar na estratificação de risco cardiovascular dos seus pacientes?

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