Placas vulneráveis foram são as lesões ateroscleróticas que podem evoluir para trombose e levar a desfechos clínicos adversos. Placas vulneráveis de alto risco são frequentemente caracterizadas por fibroateromas de capa fina (TCFA), alto conteúdo lipídico, grande carga de placa e pequena área luminal, resultando em instabilidade da placa e alto risco de ruptura.
Placas vulneráveis angiograficamente leves e não limitantes de fluxo colocam os pacientes em risco de eventos cardiovasculares futuros, mesmo quando tratados com o tratamento médico otimizado. As placas vulneráveis podem ser identificadas por modalidades intravasculares e não invasivas, apresentando diferentes características, e estão fortemente associadas a desfechos clínicos adversos. Uma meta-análise recente indicou que placas de alto risco avaliadas tanto por tomografia computadorizada coronariana (CCTA) ou por tecnologias de imagem intravascular (IVI) foram fatores de risco para MACE.
Durante a angiografia, para pacientes com estenose angiograficamente intermediária, é recomendado o uso da reserva fracionária de fluxo (FFR) ou da razão instantânea livre de onda (iFR) para guiar a decisão sobre intervenção coronária percutânea (ICP). No entanto, há escassez de dados sobre o papel da ICP preventiva em placas vulneráveis que não limitam o fluxo e são angiograficamente leves.
Atualmente, nenhuma diretriz recomenda a adoção de ICP em placas de alto risco.
Evidências
Existem estudos observacionais que sugeriram que scaffolds vasculares metálicos ou bioabsorvíveis (BVS) poderiam prevenir a progressão da placa ao aumentar funcionalmente a espessura da íntima da artéria coronária, indicando um possível papel terapêutico da ICP em placas de alto risco. Além disso, vários ensaios clínicos randomizados apoiaram os benefícios da ICP em placas vulneráveis. Notavelmente, o grande ensaio PREVENT sobre ICP mais terapia médica otimizada (TMO) para placas vulneráveis não limitantes de fluxo mostrou redução dos desfechos clínicos em comparação com TMO isolada. Entretanto, o uso de ICP em placas vulneráveis tem sido limitado devido a preocupações de que a implantação de stent ou scaffold possa teoricamente aumentar o risco de infarto do miocárdio periprocedimento, possivelmente causado por embolização distal de placa rica em lipídios, além de risco de restenose tardia ou trombose do stent.
Os estudos que investigaram a revascularização preventiva para placas de alto risco variaram quanto à inclusão de participantes, duração do acompanhamento e desfechos clínicos relatados. Para abordar essas inconsistências, foi publicada recentemente uma meta-análise de ensaios clínicos randomizados para avaliar a eficácia e segurança da ICP mais TMO em placas vulneráveis angiograficamente leves e FFR negativas em comparação com TMO isolada.
Foram incluídos 4 estudos na análise final, todos ensaios clínicos randomizados. Nos estudos incluídos, os pacientes foram tratados com angiografia coronária invasiva (ICA) e possível ICP de acordo com as diretrizes atuais para as lesões culpadas. Para lesões não culpadas não tratadas, a estenose e a significância fisiológica foram avaliadas por angiografia e FFR. Placas não limitantes de fluxo foram analisadas adicionalmente usando múltiplas modalidades de imagem para rastrear características de placa vulnerável.
Um total de 1.843 pacientes foi incluído nesta meta-análise, sendo 925 no grupo ICP mais TMO e 918 no grupo TMO. Pacientes em ambos os grupos receberam terapia antiplaquetária e tratamento para redução de lipídios pré e pós-procedimento de acordo com as diretrizes. A idade média dos pacientes variou de 62 a 70 anos, com predomínio do sexo masculino (74% vs. 26%). A maioria dos pacientes apresentava doença coronária estável (74%).
Resultados
Foram incluídos e avaliados nesta meta-análise quatro ensaios clínicos randomizados com 1.843 participantes, avaliando o desfecho clínico cardiovascular de placas vulneráveis tratadas com ICP em conjunto com TMO, em comparação com TMO isolada. Não houve diferenças na incidência de MACE entre os grupos ICP mais TMO e TMO. De forma semelhante, não houve diferenças nas incidências de óbito por qualquer causa e infarto do miocárdio entre os grupos. Entretanto, em comparação com o grupo TMO, o grupo ICP mais TMO apresentou redução da revascularização clinicamente indicada e da hospitalização por angina instável ou progressiva.
Diretrizes e consensos sobre o tratamento de placas vulneráveis enfatizam principalmente o tratamento conservador, como terapia redutora de lipídios, em vez de revascularização. Isso reforça a importância das farmacoterapias sistêmicas como base para estabilizar placas ateroscleróticas. Diversos estudos demonstraram a eficácia clínica de drogas redutoras de lipoproteínas, incluindo estatinas, ezetimibe e inibidores de PCSK-9, na estabilização e reversão da progressão da placa. O estudo PACMAN-AMI demonstrou que a adição de alirocumabe à terapia com estatina de alta intensidade em pacientes com IAM esteve associada à redução do volume percentual de ateroma e do índice de carga lipídica máxima em 4 mm e aumento da espessura mínima da capa fibrosa, em comparação com placebo. Outras terapias, como modificação do estilo de vida, controle da pressão arterial, controle glicêmico e anti-inflamação, também foram implementadas para estabilizar placas vulneráveis. No entanto, a escala e o poder estatístico desses estudos eram relativamente limitados para tirar conclusões definitivas.
Por outro lado, nos últimos anos, uma quantidade considerável de dados clínicos emergiu sobre o tratamento ideal de placas vulneráveis, destacando a importância crescente da revascularização preventiva na redução de eventos cardiovasculares associados a essas placas. Estudos anteriores indicaram que o ICP de placas vulneráveis cria um ambiente hemodinâmico promotor de neointima, que desencadeia proliferação neointimal cobrindo TCFA e focos calcificados. Essa proliferação neointimal resulta em hiperplasia neointimal, espessando efetivamente a capa fibrosa e normalizando o estresse na parede.
A meta-análise atual mostrou que ICP mais TMO e TMO apresentaram incidência semelhante de MACE, enquanto o grupo ICP mais TMO teve menor incidência de revascularização clinicamente indicada e hospitalização por angina instável ou progressiva, consistente com estudos anteriores.
Diversos ensaios em andamento estão avaliando rigorosamente a eficácia do ICP preventivo no tratamento de placas vulneráveis, incluindo os ensaios COMBINE-INTERVENE e VULNERABLE. Além da implantação de stents metálicos ou BVS, o ensaio DEBuT-LRP avalia a segurança e eficácia de balões farmacológicos para tratamento de placas vulneráveis. Esses estudos fornecerão novos insights sobre o manejo de placas vulneráveis e poderão influenciar futuras diretrizes de tratamento. Além disso, nossa meta-análise estudou principalmente BVS, atualmente raramente utilizados devido a preocupações de segurança, mas o estudo PREVENT encontrou resultados semelhantes para BVS e stents de CoCr-EES. Pesquisas futuras são necessárias para preencher essas lacunas de evidência.
Limitações
Esta meta-análise apresenta várias limitações. Primeiramente, devido ao pequeno número de estudos incluídos e tamanho da amostra, as estimativas de risco do desfecho primário e dos eventos cardiovasculares individuais podem estar subdimensionadas. Metade dos estudos incluídos recrutou menos de 40 pacientes, resultando em heterogeneidade significativa no peso atribuído a cada estudo.
Em segundo lugar, os ensaios incluídos predominantemente recrutaram pacientes com doença coronária estável, e os achados podem não ser generalizáveis para outras populações. Terceiro, as definições de MACE variaram entre os estudos. Quarto, a definição de “placa vulnerável” variou amplamente entre os estudos, desde fibroateromas de capa fina na OCT até avaliação da carga aterosclerótica via IVUS ou multimodalidade.
Quinto, a inclusão do PECTUS — um ensaio pequeno (n=34) com metodologia distinta — introduziu heterogeneidade clínica e estatística notável. Sexto, os ensaios incluídos avaliaram predominantemente BVS, tecnologia amplamente retirada da prática clínica devido a maiores taxas de trombose de scaffold e falha da lesão-alvo em comparação com stents metálicos contemporâneos.
Conclusões
Entre pacientes com placas vulneráveis, ICP preventivo em conjunto com tratamento médico apresentou incidência semelhante de MACE, óbito por qualquer causa e infarto do miocárdio em comparação com o grupo TMO, mas reduziu a incidência de revascularização clinicamente indicada e hospitalização por angina instável ou progressiva. Essa metanálise tem várias limitações e ensaios futuros devem definir indicações ótimas de ICP guiadas por multimodalidade de imagem e estratégias personalizadas adaptadas a perfis específicos de placa e paciente. Por ora, não temos indicação, em diretriz, de intervenção percutânea nessas placas.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.