AHA 2024: Colchicina tem benefício em pacientes com infarto?
Sabemos que a inflamação tem papel importante na aterosclerose e suas manifestações, tanto agudas quanto crônicas. Apesar de os estudos mostrarem benefício de medicações anti-inflamatórias em pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM), sua utilização parece aumentar a ocorrência de infecções, como visto com o canakinumabe, um inibidor de interleucina-1beta (IL-1b).
A colchicina atua inibindo a ação de neutrófilos e liberação de citocinas inflamatórias, incluindo a IL-1b e a interleucina-6 (IL-6). Dois estudos mais recentes mostraram benefício da colchicina em pacientes com IAM recente e no contexto de doença coronária estável.
No intuito de confirmar seus efeitos benéficos no contexto do IAM, foi feito o estudo CLEAR, apresentado no segundo dia do congresso da American Heart Association.
Métodos do estudo e população envolvida
Foi estudo com desenho fatorial 2×2, internacional, multicêntrico, prospectivo, randomizado e placebo controlado, que testou colchicina e espironolactona em pacientes com IAM. Aqui estão os dados sobre a colchicina.
Os critérios de inclusão eram pacientes com IAM com supradesnivelamento do segmento ST (IAM SST) submetidos a angioplastia e pacientes com IAM sem supradesnivelamento do segmento ST (IAM SSST) extenso submetidos a angioplastia e que tivessem pelo menos mais um dos seguintes: fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≤ 45%, diabetes, doença coronária multiarterial, IAM prévio ou idade > 60 anos.
Os pacientes eram randomizados em 4 grupos para receber colchinha e espironolactona, colchicina e placebo, espironolactona e placebo ou placebo apenas. A dose de colchicina era 0,5mg 1x ao dia e de espironolactona 25mg 1x ao dia.
O desfecho primário de eficácia era composto por morte por causas cardiovasculares, IAM recorrente, acidente vascular encefálico (AVE) ou revascularização guiada por isquemia não planejada.
Resultados
Foram incluídos 7062 pacientes de 14 países, sendo 3528 para o grupo colchicina e 3534 para o grupo placebo. As características de base dos pacientes eram semelhantes, com idade média de 61 anos e 20,4% do sexo feminino. Do total, 9% tinham IAM prévio, 10% tinham angioplastia prévia, 18,5% tinham diabetes e 95,1% tiveram IAM SST.
O seguimento médio foi de 3 anos e o desfecho primário ocorreu em 322 pacientes (9,1%) do grupo colchicina e 327 (9,3%) do grupo placebo, sem diferença estatística. Não houve efeito da espironolactona nos resultados.
Também não houve diferença na análise de desfechos secundários e de eventos adversos graves entre os grupos. Diarreia foi mais frequente no grupo colchicina (10,2% x 6,6%) e não houve diferença na ocorrência de infecções graves.
Comentários e conclusão
Nos pacientes com IAM, o uso do anti-inflamatório colchicina não reduziu a ocorrência de eventos do desfecho primário no seguimento de 3 anos comparado ao placebo. Como esperado, houve aumento da ocorrência de diarreia e redução dos valores da proteína C reativa (PCR) em relação ao grupo placebo, porém não houve aumento de infecção no grupo colchicina.
Esses resultados são diferentes dos encontrados previamente e não há uma causa clara para esses resultados discrepantes. Algumas limitações são que 25% dos pacientes de cada grupo suspenderam a medicação ao longo do estudo, quantidade maior que a esperada, a aderência foi avaliada apenas pelo relato do paciente e a dose da colchicina foi utilizada 1x ao dia, sendo que a dose de 2x ao dia poderia mostrar resultados diferentes.
Assim, mais estudos são necessários para avaliar o real papel da colchicina na doença coronária, apesar de as principais diretrizes já sugerirem seu uso em pacientes com doença coronária aterosclerótica.
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