ACC 2024: Angioplastia preventiva de placas coronarianas vulneráveis é benéfico?
A imagem intravascular define quais são as placas/lesões coronarianas que estão vulneráveis a rotura e, consequentemente, tem maior risco de resultar em uma síndrome coronariana aguda (SCA).
O tratamento clínico caracterizado pela terapia medicamentosa otimizada (TMO) em máximas doses toleradas preconizadas em diretrizes é o tratamento padrão para a estabilização de placas vulneráveis.
O estudo PREVENT pretendeu avaliar se a intervenção coronariana percutânea (ICP) de placas vulneráveis (PV) focais funcionalmente não obstrutivas melhora desfechos clínicos em relação a TMO.
Metodologia
Pacientes com síndromes coronarianas agudas ou crônicas que realizaram cateterismo cardíaco foram avaliados quanto à elegibilidade. Lesões com FFR ≤ 0,8 ou aquelas responsáveis por SCA foram tratadas com ICP e Stent farmacológico antes da randomização. Posteriormente, foi realizada avaliação de outras lesões não tratadas e não culpadas com imagem intravascular: ultrassom intravascular
(IVUS) em escala cinza, IVUS e radiofrequência (RF-IVUS), combinação de
IVUS em escala cinza e espectroscopia de infravermelho próximo (near-infrared spectroscopy ou NIRS) ou tomografia de coerência óptica (OCT).
Foram incluídos os pacientes com lesões classificadas como PV funcionalmente não obstrutivas definidas pelos seguintes critérios: estenose coronariana > 50% com FFR negativa (> 0,8) E 2 das seguintes características definidoras de PV:
- Área luminal mínima (MLA) ≤ 4 mm2 definida por OCT ou IVUS,
- Estenose > 70% definida por IVUS,
- Capa fibrótica de ateroma fina (thin-cap fibroatheroma ou TCFA) definida por OCT ou RF-IVUS,
- Máximo conteúdo lipídico da placa em 4 mm (maximum lipid core burden index in 4 mm ou maxLCBI4mm) > 315 definido por NIRS.
Os critérios maiores de exclusão foram revascularização miocárdica cirúrgica prévia, lesões-alvo já com stents, paciente com três ou mais lesões-alvo ou duas lesões-alvo na mesma artéria, lesões muito calcificadas ou anguladas, lesões em bifurcação que requerendo duas técnicas de angioplastia.
Pacientes com até dois lesões-alvo foram randomizados para cada grupo, TMO + ICP preventiva vs TMO, totalizando 803 em cada braço. A randomização foi estratificada pela presença ou não de diabetes e pela presença ou não de outra ICP concomitante fora do estudo. O desfecho primário foi insuficiência do vaso alvo em dois anos definida por: um composto de morte por causa cardíaca, IAM do vaso-alvo, revascularização causada por isquemia do vaso-alvo ou hospitalização por angina instável ou progressiva.
As características dos grupos foram semelhantes sendo a média de idade 64 anos, ~73% homens, 30% diabéticos, 66% hipertensos, 89% dislipidêmicos, 17% tabagistas ativos, 1% com insuficiência cardíaca, 1% com doença renal crônica, 41% uniarteriais, 38% biarteriais e 22% triarteriais, 83% com doença coronária estável e 1% pós IAM com supra ST. Quanto as lesões: 97% tiveram MLA < 4 mm, 97% estenose > 70% pelo IVUS, 27% maxLCBI4mm > 315, 7% TCFA, a estenose média da coronária foi de 56,6% no grupo ICP e 52,6% no grupo clínico, 49% foram na artéria descendente anterior e 18% na circunflexa. Cada paciente tratou uma lesão-alvo.
Desfechos
O desfecho primário foi em favor da ICP preventiva em dois anos [HR 0.11 (95% CI, 0.03-0.36), p=0, 0003]. Os pacientes foram seguidos por sete anos e o resultado foi similar [HR 0.54 (95% CI, 0.33-0.87), p=0,0097].
Foi também analisado como desfecho secundário o desfecho baseado no paciente e não no vaso com um composto de morte por todas as causas, IAM, revascularização em dois e em sete anos e, o resultado foi em benefício da ICP preventiva [HR 0.69 (95% CI, 0.50-0.95), p=0,022].
O estudo em questão é interessante e seleciona muito bem lesões coronarianas mais suscetíveis a rotura que provavelmente se beneficiariam de tratamento intervencionista, as chamadas placas vulneráveis, reafirmando para nós cardiologistas que não é qualquer placa aterosclerótica que deve passar por uma angioplastia.
Destaca-se alguns vieses deste trial:
- Não foi caracterizado no estudo o que foi a TMO da população estudada (quais as medicações e sua taxa de uso em cada braço do estudo),
- Não foi citado o motivo pelo qual os pacientes com doença estável tiveram uma coronariografia indicada. Seriam eles pacientes sintomáticos e já com indicação de alguma revascularização?
- 9% dos pacientes do grupo intervenção não fizeram ICP preventiva e sim tratamento já preconizado em diretrizes (ICP de lesões residuais pós SCA).
Conclusão
Concluimos que o PREVENT é um estudo que reafirma a indicação da ICP para casos selecionados e com maior risco de um evento coronariano agudo. Assim como o FAME 2 e outros estudos, mostra que a ICP guiada por métodos funcionais e de imagem intravascular seleciona melhor quais são as placas ateroscleróticas que realmente devem ser tratadas e por isso reduz desfechos negativos. Ainda assim, seria necessário avaliar se a TMO do estudo era realmente terapia médica otimizada.
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