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Neurologia26 junho 2023

Cetamina ou ECT no tratamento de depressão não psicótica resistente ao tratamento?

A ECT e a cetamina são usadas para depressão resistente ao tratamento, mas a eficácia comparativa dos dois tratamentos permanece incerta.

Por Tayne Miranda

Eletroconsulsoterapia (ECT) é sabidamente uma das estratégias mais efetivas para tratamento de depressão resistente, a despeito das preocupações sobre comprometimento cognitivo. Nas últimas décadas o uso de cetamina intravenosa em doses subanestésicas tem mostrado um rápido efeito antidepressivo, sendo uma alternativa interessante por dispensar sedação e não comprometer a memória. Não obstante, há um risco de uso abusivo da substância e graças ao seu potencial dissociativo, costuma-se evitar o uso em pacientes com sintomas psicóticos.  

A depressão é uma das maiores causas de incapacidade no mundo e o tratamento antidepressivo não é suficientemente eficaz em até um terço dos pacientes. Falamos de depressão resistente ao tratamento quando dois ou mais antidepressivos foram utilizados em tempo e dose adequados sem que houvesse resposta.   

Saiba mais: Qual eficácia e segurança da cetamina como sedativo adjuvante de menores na UTI?

Cetamina ou ECT no tratamento de depressão não psicótica resistente ao tratamento?

Cetamina ou ECT no tratamento de depressão não psicótica resistente ao tratamento?

Méotdos 

Anand e colaboradores1 conduziram um ensaio clínico aberto, randomizado, de não inferioridade entre ECT e cetamina venosa para tratamento de depressão resistente. Durante as três semanas iniciais de tratamento os pacientes fizeram ECT três vezes na semana e receberam cetamina na dose de 0,5 mg/kg duas vezes por semana. O desfecho primário foi resposta ao tratamento (redução em ≥ 50% na pontuação do 16-item Quick Inventory of Depressive Symptomatology–Self-Report (QIDS-SR-16). Os desfechos secundários foram escores em testes de memória e qualidade de vida. Os pacientes que responderam ao tratamento inicial foram seguidos por 6 meses, durante os quais estavam recebendo o tratamento recomendado pelos seus médicos assistentes.   

Pacientes que possuíam entre 21 e 75 anos, encaminhados por seus médicos para realização de ECT, com critérios diagnósticos para depressão resistente moderada a grave sem características psicóticas foram recrutados para o estudo. 

Ao todo, 403 pacientes foram randomizados, sendo que 38 saíram do estudo antes de começar o tratamento, resultando em 195 pacientes no grupo cetamina e 170 pacientes no grupo ECT. Entre os 403 pacientes, a média de idade foi de 46 anos, 51,1% eram mulheres e 88,1% brancos. A maioria eram pacientes ambulatoriais (89,1%). A duração média do episódio depressivo atual foi dois anos. Trinta e nove porcento dos pacientes tinham tentativas de suicídio prévias.  

Resultados 

Cento e oito dos 195 pacientes (55,4%) responderam a cetamina e 70 dos 170 pacientes (41,2%) responderam ao ECT de acordo com o QIDS-SR-16. Usando MADRS, 99 dos 195 (50,8%) responderam a cetamina e 70 dos 169 (41,1%) responderam ao ECT. 63 de 195 (32,3%) pacientes obtiveram remissão com cetamina e 34 de 170 (205) ao ECT, usando o QIDS-SR-16. De acordo com o MADRS, ocorreu remissão em 74 dos 195 (37,9%) dos pacientes usando cetamina e 37 de 170 (21,8%) dos pacientes do grupo ECT. 

Esses dados evidenciam a não inferioridade da cetamina ao ECT no que diz respeito a resposta ao tratamento.  

O número de sessões não diferiu substancialmente entre os pacientes que responderam e aqueles que não responderam.  

Durante o seguimento, houve recaída no 1º mês de 19% dos pacientes do grupo cetamina e 35,4% do grupo ECT, no 3º mês de 25% e 50,9%, respectivamente e no 6º mês de 34,5% e 56,3%, respectivamente.  

Houve um declínio maior em testes de memória nos pacientes do grupo ECT no final do tratamento, mas ao término do primeiro mês de seguimento o desempenho foi igual em ambos os grupos. Houve melhora da qualidade de vida imediatamente após o tratamento de fase aguda, melhora que foi mantida durante o seguimento. 

Conclusão 

Os resultados deste estudo diferem dos achados de um ensaio clínico europeu (KetECT)2 e de uma revisão sistemática com metanálise também publicada no ano passado3. Além disso, a porcentagem de pacientes que tiveram remissão com o uso de ECT foi menor que em outros trabalhos. Uma hipótese para tal achado é o fato do ECT ter sido inicialmente administrado de forma unilateral – o esquema foi alterado para bilateral no curso do estudo em 39% dos casos e o número de sessões administradas (6-9 sessões). A despeito de não haver um número padrão de sessões para o ECT, a literatura de modo geral sugere 6-12 sessões para o tratamento de fase aguda.  

Leia também: Aumento de antidepressivo ou troca em depressão resistente em idosos?

Mensagem prática 

Esse estudo evidenciou a não inferioridade da cetamina ao ECT no que diz respeito a resposta ao tratamento, o que difere de achados de outros trabalhos recentemente publicados abordando a mesma temática. 

O comprometimento de memória atrelado à realização do ECT tende a melhorar no curso do seguimento. 

A melhora da qualidade de vida com ambos os tratamentos parece se sustentar ao longo do seguimento.  

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Referências bibliográficas

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