Vitamina D é uma das mais amadas das vitaminas, sendo alvo de diversos estudos e um dos temas mais acessados do nosso Portal PEBMED. Esta vitamina e seus metabólitos têm um papel clínico importante devido à sua inter-relação com a homeostase do cálcio e o metabolismo ósseo, sendo também citada como agente capaz de trazer resultados positivos em condições relacionadas a imunidade e infecções de vias respiratórias.
Durante a pandemia, pesquisadores se questionaram se haveria alguma relação entre a gravidade da Covid-19 e os níveis séricos de vitamina D (25OHD) em pacientes hospitalizados. O estudo foi publicado no The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism (JCEM) e traremos os principais pontos nesta publicação.
Vitamina D e Covid-19
Trata-se de um estudo caso-controle retrospectivo com 413 pacientes (216 pacientes com Covid-19 e 197 controles populacionais). Foram medidos os níveis séricos de 25OHD e avaliada a gravidade de Covid-19 em cada participante.
Resultados e reflexões sobre o estudo
No grupo de pacientes com Covid-19, os níveis médios de 25OHD foram de 13,8 ± 7,2 ng/mL, em comparação com 20,9 ± 7,4 ng/mL nos controles (p <0,0001). A deficiência de vitamina D foi encontrada em 82,2% dos casos de infecção pelo SARS-CoV-2 e 47,2% de controles de base populacional (p <0,0001).
Pacientes com deficiência de vitamina D e Covid-19 tiveram uma maior prevalência de hipertensão e doenças cardiovasculares, níveis séricos elevados de ferritina e troponina, bem como um tempo de internação mais longo do que aqueles com níveis séricos de 25OHD ≥ 20 ng/mL. Nenhuma relação causal foi encontrada entre a deficiência de vitamina D e a gravidade Covid-19.
Cabe ressaltar que esses dados devem ser avaliados com cautela, já que o comportamento da vitamina D em estados inflamatórios costuma levantar algumas polêmicas: alguns defendem a hipótese de que a inflamação reduz a concentração de 25 (OH) D, enquanto outros acreditam que o aumento do nível de vitamina D reduz a inflamação.
Neste estudo, vimos que os pacientes com Covid-19, tiveram uma alta prevalência de deficiência de vitamina D, negativamente correlacionados com ferritina e dímero-D (que aumentam em estados inflamatórios). Porém, não fica clara a relação real da deficiência da vitamina D com a questão inflamatória, até porque a coleta dos níveis séricos de vitamina D foi feita na admissão, quando o paciente já estava em pleno estado inflamatório, não tendo sido disponibilizada a vitamina D basal.
Curiosamente, as concentrações de 25OHD em pacientes com Covid-19 que estavam suplementando vitamina D quando entraram no estudo foi menor do que o esperado, apoiando seu comportamento como um reagente de fase aguda negativo. Porém, o número de pacientes com Covid-19 que tomavam suplementos orais de vitamina D, dezenove no total, é muito pequeno para tirar conclusões sólidas sobre seu papel nos resultados clínicos da doença.
O estudo tem outras limitações, a começar pelas inerentes a um estudo observacional que não permite estabelecer se a vitamina D é simplesmente um biomarcador de exposição ou um biomarcador de efeito sobre a doença. Além disso, a pesquisa foi realizada em um único centro de saúde espanhol e os dados não podem ser generalizados.
Outras evidências entre hipovitaminose D e infecções respiratórias
Já discutimos aqui no portal, no início da pandemia aqui no Brasil, sobre a relação entre vitamina D e infecções respiratórias. Na época, citamos uma revisão sistemática e meta-análise de estudos clínicos randomizados sobre o assunto: suplementação de vitamina D e prevenção de infecções respiratórias agudas.
Nesta, concluiu-se que pacientes com níveis de vitamina D abaixo de 25 nmol/L (ou 10 ng/mL) deveriam receber suplementação na dose necessária para atingir valores acima de 25 nmol/L (ou 10 ng/mL). Para saber mais sobre o estudo, confira o texto aqui no Portal.
Mensagem prática:
- Os níveis de 25OHD são mais baixos em pacientes com Covid-19 hospitalizados em comparação com controles populacionais e esses pacientes apresentaram maior prevalência de deficiência.
- O estudo não encontrou nenhuma relação entre a concentração vitamina D e a gravidade da doença.
- Na prática, não é possível concluir necessidade de mudanças na abordagem da Covid-19 ou suplementação de vitaminas com base neste estudo, já que não se estabelece relação causal entre hipovitaminose D e risco/gravidade de infecção.
Referências bibliográficas:
- José L Hernández, Daniel Nan, Marta Fernandez-Ayala, Mayte García-Unzueta, Miguel A Hernández-Hernández, Marcos López-Hoyos, Pedro Muñoz Cacho, José M Olmos, Manuel Gutiérrez-Cuadra, Juan J Ruiz-Cubillán, Javier Crespo, Víctor M Martínez-Taboada, Vitamin D Status in Hospitalized Patients With SARS-CoV-2 Infection, The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, , dgaa733, https://doi.org/10.1210/clinem/dgaa733
- Waldron JL, Ashby HL, Cornes MP, et al. Vitamin D: a negative acute phase reactant. J Clin Pathol. 2013;66(7):620‐622.
- Cannell JJ, Grant WB, Holick MF. Vitamin D and inflammation. Dermatoendocrinol. 2015;6(1):e983401. Published 2015 Jan 29. doi:10.4161/19381980.2014.983401
- Martineau AR, Jolliffe DA, Hooper RL, et al. Vitamin D supplementation to prevent acute respiratory tract infections: systematic review and meta-analysis of individual participant data. BMJ. 2017;356:i6583. Published 2017 Feb 15. doi:10.1136/bmj.i6583
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