Em dezembro de 2019, a cidade de Wuhan, na província de Hubei, China, virou o epicentro da mais nova ameaça global de saúde pública: o coronavírus 2019 (Covid-19). De lá pra cá, muito tem se falado sobre a nova epidemia.
Coronavírus
No último dia 28 de fevereiro, foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM), o artigo Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 in China. O estudo incluiu 1.099 pacientes com diagnóstico laboratorial confirmado de infecção pelo Covid-19, provenientes de 552 hospitais de 30 províncias chinesas, no período de dezembro de 2019 a janeiro de 2020, a maior casuística publicada desde o início do surto.
Vale ressaltar que esses pacientes foram selecionados através de critérios de inclusão pré-estabelecidos a partir de um universo de 7.736 pacientes que haviam recebido o diagnóstico até 29 de janeiro.
Para você entender…
A denominação do vírus responsável pelo surto é SARS-CoV-2 (Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2). A doença causada pelo vírus foi nomeada Covid-19 (Coronavirus Disease 2019). |
Vamos então analisar o que está por trás do surto com base nas evidências!
Qual perfil de pacientes analisados?
- Idade: 47 anos;
- Sexo: feminino (41,9%);
- 483 pacientes (43,9%) eram residentes de Wuhan;
- Profissionais de saúde: 3,5%;
- 1 comorbidade ou mais: 23,7%;
- Tempo de internação hospitalar: 12 (10-14) dias.
Quais sintomas mais comuns?
- Período de incubação: 4 (2-7) dias;
- Sintoma mais comum: febre! Na admissão, 43,8%; durante a hospitalização, 88,7% apresentaram febre;
- Tosse (67,8%);
- Outros sintomas: fadiga (38,1%), escarro (33,7%), dispneia (18,7%);
- Náusea e vômito (5%) e diarreia (3,8%) – pouco comuns.
Quais principais achados dos exames de imagem?
1. Radiografia de tórax:
- Anormal em 59,1%;
- Achado mais comum: opacidades bilaterais (36,5%).
2. Tomografia de tórax:
- Anormal em 86,2%;
- Achado mais comum: vidro fosco (56,4%), opacidades bilaterais (51,8%);
Atenção! Apenas em 17,9% dos pacientes não graves e 2,9% dos pacientes graves, os exames de imagem (radiografia e tomografia) eram normais!
Quanto à gravidade:
- Casos não graves: 84,3%;
- Casos graves: 15,7% (os pacientes eram mais velhos e apresentavam maior número de comorbidades);
- Necessidade de oxigênio suplementar: 41,3%;
- Admissão na UTI: 5%;
- Ventilação mecânica: 2,3%;
- ECMO: 5 casos (0,5%).
Complicações:
- Choque séptico: 1,1%;
- SDRA: 3,4%;
- Insuficiência renal: 0,5%.
Taxa de mortalidade: 1,4%.
Além disso, o estudo evidencia um número básico de reprodução (R0) de 2,2, o que significa que em média cada pessoa infectada transmite para outras duas pessoas o vírus. Segundo os próprios autores, até que esse número caia para abaixo de 1,0, é possível que o surto continue a se propagar.
O que aprendemos com esses dados?
- A maior parte dos pacientes não é grave e a mortalidade é baixa (se levarmos em conta que muitos pacientes assintomáticos ou com poucos sintomas não procuraram assistência hospitalar, a mortalidade deve ser menor ainda);
- Febre é o sintoma mais comum, com período de incubação por volta de 4 dias;
- Complicações como necessidade de admissão à UTI, SDRA (Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo) e necessidade de ventilação mecânica foram pouco frequentes.
Veja mais sobre coronavírus:
- Coronavírus: como identificar possíveis casos no Brasil?
- Coronavírus: como abordar os casos graves?
- Quais as medidas de precaução para cada tipo de transmissão possível do coronavírus?
- Doação de sangue: atualização dos critérios após epidemia de coronavírus
- Coronavírus e neurologia: o que temos até agora?
O surto da Covid-19 nos faz repensar o desafio que temos em relação às doenças emergentes e reemergentes ano após ano, com instituição de medidas preventivas, pesquisa clínica contínua e desenvolvimento de contramedidas eficazes nessas situações.
Embora tenha baixa mortalidade documentada até o momento e até mesmo menor quando comparada à epidemia de Influenza H1N1 em 2009, não podemos reduzir a relevância do surto a nível global e todas medidas preventivas de forma racional devem ser adotadas.
Vale destacar que, cotidianamente, boas práticas de prevenção de doenças infectocontagiosas no âmbito extra e intra-hospitalar devem ser instituídas e reforçadas, não apenas em períodos de surto. A vigilância deve ser constante.
Referências bibliográficas:
- Guan WJ, et al. Clinical Characteristics of Coronavirus Disease 2019 in China. N Engl J Med. 2020 Feb 28. doi: 10.1056/NEJMoa2002032.
- Simonsen L, Spreeuwenberg P, the GLaMOR Collaborating Teams, et al. Global Mortality Estimates for the 2009 Influenza Pandemic from the GLaMOR Project: A Modeling Study. PLoS Med. 2013 Nov; 10(11): e1001558.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.