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Saúde19 novembro 2020

Vírus chikungunya pode afetar sistema nervoso central?

Segundo o estudo recente, o vírus chikungunya pode infectar também o sistema nervoso central e comprometer as principais funções motoras.

Por Úrsula Neves

A infecção pelo vírus chikungunya pode infectar também o sistema nervoso central e comprometer as principais funções motoras, revela um estudo coordenado por uma equipe internacional de pesquisadores, incluindo brasileiros. Os resultados foram publicados na revista Clinical Infectious Diseases.

A pesquisa foi conduzida no âmbito do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus (CADDE) com a participação de 38 pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), da Universidade de São Paulo (USP), do Ministério da Saúde, do Imperial College London e da Universidade de Oxford.

“Além da possibilidade do vírus infectar o sistema nervoso central, identificamos também que a letalidade da enfermidade é maior em adultos jovens e não em crianças ou idosos, como se costuma prever em surtos da doença. A investigação mostra ainda que pacientes com diabetes vêm a óbito com frequência sete vezes maior durante as fase aguda e subaguda da doença que indivíduos sem a comorbidade”, diz William Marciel de Souza, pesquisador da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e coautor do artigo, em entrevista à Agência FAPESP.

Maior surto nas Américas aconteceu no Ceará

O trabalho teve como base dados clínicos, epidemiológicos e amostras laboratoriais de pacientes que vieram a óbito durante o maior surto da enfermidade nas Américas, ocorrido no Ceará, em 2017. Na época, foram registrados 105 mil casos suspeitos e 68 óbitos.

A partir dos dados coletados pelo Serviço de Verificação de Óbitos da Secretaria de Saúde do Ceará, os pesquisadores puderam avançar nas investigações, realizando um estudo muito completo sobre o surto.

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Amostras de sangue e líquor dos infectados foram submetidas a métodos de análises genômicas, além da realização de análises de imuno-histoquímica (para avaliar amostras de tecidos) e exames para detectar a presença de anticorpos contra o vírus chikungunya.

Ainda foram analisados os prontuários médicos, sendo que uma informação em especial chamou a atenção dos pesquisadores: a grande maioria dos infectados que veio a óbito apresentou síndrome neurológica. Das 36 amostras de tecido cerebral de indivíduos que vieram a óbito, quatro (ou 11%) continham o microrganismo.

“A presença do vírus dentro do cérebro de infectados significa uma caracterização bem clara de que ele consegue ultrapassar a barreira hematoencefálica (que protege o sistema nervoso central) e tem capacidade de causar uma infecção no cérebro e na medula espinhal”, explica o pesquisador.

Padrões inesperados

Além das novas características da infecção, os pesquisadores identificaram também que o risco de óbito nas fases agudas e subagudas era sete vezes maior em pacientes com diabetes. Os pesquisadores realizaram uma análise patológica e os resultados indicam, nos casos de morte, a infecção por chikungunya em distúrbios na circulação sanguínea e no equilíbrio hídrico no cérebro, coração, pulmão, rim, baço e fígado.

A partir do estudo, os pesquisadores revelaram padrões inesperados para epidemias de arboviroses, como, por exemplo, o fato de idosos e crianças não representarem os grupos etários com maior risco de vir a óbito. Pelo contrário, entre os mortos no surto de 2017, a maioria era formada por adultos.

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A descoberta aconteceu a partir da análise de 100 casos de morte por suspeita de arbovirose (entre 2016 e 2017) no Ceará. A partir de análise de RT-PCR, os pesquisadores conseguiram identificar a presença do vírus chikungunya e confirmar a causa do óbito desses indivíduos.

“Normalmente, relacionamos esse vírus a hospitalizações e óbito de pacientes mais idosos ou crianças. Porém, foi observado que mais de 60% das pessoas infectadas pelo chikungunya que apresentou infecção no sistema nervoso central e foi a óbito era adulta”, relata William Souza.

De acordo com o pesquisador, o achado reforça que, em um surto como o ocorrido no Ceará, não necessariamente o grupo de maior risco está nas pessoas com o sistema imunológico suprimido, ou deficiente.

“Eram adultos jovens e saudáveis e não havia comorbidade relacionada na maioria dos casos. Isso adiciona mais uma camada à enfermidade e pode ser uma informação de extrema importância para a prática clínica, que deve dispensar atenção redobrada a esse grupo etário, pois a probabilidade de evoluir para óbito é maior”, esclarece William Souza.

*Esse artigo foi revisado pela equipe médica da PEBMED

Referências bibliográficas:

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