A cada dia cresce o número de médicos que usam as redes sociais para compartilhar dicas confiáveis de estilo de vida e saúde, com o objetivo de fortalecer sua autoridade profissional e educar o público. No entanto, uma nova ameaça vem sendo observada: médicos falsos criados por inteligência artificial (IA). Os “deepfake doctors”, médicos criados por IA, colocam em xeque a credibilidade dos médicos reais.
O “deepfake” é um tipo de manipulação digital capaz de alterar ou criar vídeos, áudios e imagens de forma realista, são simulações produzidas com ferramentas de IA que permitem a utilização de imagens de pessoas reais ou a criação de imagens do zero para qualquer fim.
Médicos da deepfake — vídeos de médicos criados pela IA se passando por profissionais de saúde — têm aparecido cada vez mais nas redes sociais. Esses perfis falsos são usados para promover golpes, nos quais os ‘médicos’ prometem remédios duvidosos como óleos milagrosos para tratar queda de cabelo, suplementos que curam distúrbios endocrinológicos, entre outros.
O crescimento dos deepfake médicos
Ronaldo Gismondi, médico cardiologista e editor-chefe do Portal Afya, comenta que o maior problema são os médicos, falsos ou não, que prometem curas milagrosas e soluções “únicas”. Segundo o especialista, “Notícias falsas geralmente são formuladas de maneira simples, com linguagem acessível e tom alarmista ou esperançoso — prometendo curas milagrosas, culpando inimigos invisíveis ou oferecendo explicações fáceis para problemas complexos. O medo, a raiva e a esperança são emoções poderosas que favorecem o compartilhamento impulsivo, antes mesmo da checagem dos fatos.”
Ainda segundo Ronaldo, o problema das fakes news não é algo novo: elas já vinham sendo observadas em redes sociais há cerca de 10 anos, com destaque para a política e a pandemia da covid-19. O médico ainda alerta que, na época, os depoimentos em vídeo com pessoa reais eram uma forma de diferenciar o verdadeiro do falso, entretanto, com a deepfake há uma chance enorme das fake news voltarem a se espalhar, e pode dificultar o trabalho das agências de checagem.
Recentemente, a organização sem fins lucrativos Media Matters denunciou oito contas do TikTok por compartilharem vídeos suspeitos de médicos de deepfake. No ano passado, uma investigação do periódico britânico The BMJ descobriu que deepfakes de três médicos famosos no Reino Unido estavam sendo usados para promover produtos falsos.
Entre os motivos da ascensão dos vídeos de deepfake está o avanço da tecnologia e a facilidade do acesso à ferramentas de inteligência artificial. Segundo uma pesquisa feita pelo Ipsos e o Google, o Brasil ficou acima da média global no uso de inteligência artificial (IA), com 54% dos brasileiros relatando que utilizaram IA generativa enquanto a média global ficou em 48%.
Muitas vezes, o objetivo por trás desses golpes é propagar desinformação médica, podendo buscar apenas a geração de confusão e medo na população, mas o ganho financeiro também é um dos objetivos por trás da promoção e venda de “curas milagrosas”. Usar médicos criados por IA ou vídeos falsos de médicos famosos traz credibilidade e faz com que o paciente acredite mais facilmente na informação passada
Grupos vulneráveis e riscos à saúde
Com o avanço da tecnologia, os vídeos de deepfake têm ficado cada vez mais parecidos com reais, o que faz com que as pessoas acreditem com mais facilidade, principalmente grupos mais vulneráveis. “Idosos, portadores de doenças crônicas e aqueles com menor letramento digital são certamente as principais vítimas. Em grupos on-line, pessoas com experiências semelhantes — como doenças crônicas ou efeitos adversos — formam comunidades de apoio. Dentro desses espaços, ideias falsas podem se reforçar mutuamente, ganhando aparência de verdade por repetição e aprovação coletiva.”, afirma o Dr. Ronaldo.
Os golpistas que criam os médicos com IA compartilham fake news sobre tratamentos falsos e medicamentos milagrosos que não existem. Nesse cenário, o paciente pode ser lesado financeiramente, mas também pode trazer riscos à própria saúde ao adotar tratamento duvidosos sem o acompanhamento de um médico real.
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Como evitar a desinformação
Existem diversos meios de identificar os médicos falsos e se proteger das fake news. Você pode identificar um deepfake se a pessoa no vídeo tiver dedos demais, mãos ou olhos embaçados, ou um rosto excessivamente simétrico.
Verificar a fonte de vídeos e áudios e usar ferramentas de verificação como o Deepware Scanner também pode ajudar a identificar vídeos gerados por IA. Além disso, pesquisar a fundo a identidade do médico que aparece no vídeo é fundamental para não acreditar em sugestões duvidosas.
“Os principais sinais de alerta são a promessa de curas ou milagres, indo “contra a corrente”, e os interesses comerciais por trás. O melhor “remédio” é estar sempre atento aos canais oficiais – conselho federal de medicina, sociedades médicas oficiais e as universidades públicas do país.”, finaliza Ronaldo.
A IA pode ser usada de maneira positiva
Apesar do uso da IA para golpes, a ferramenta pode ser usada de forma positiva para fins educativos e na rotina dos médicos. Muitos profissionais de saúde já usam avatares de IA em vídeos informativos sobre saúde.
“Uma IA bem usada pelo médico o empodera nas decisões: o estudo e a atualização estão mais rápidos, assertivos e completos. A IA é capaz de avaliar, em conjunto com o médico, as melhores decisões e fornecer uma “segunda opinião” muitas vezes valiosa. Ela consegue ainda facilitar a comunicação médico paciente, adaptando a linguagem e os meios.”, reitera Ronaldo Gismondi. Ainda segundo o especialista, a IA não deve substituir o médico, mas potencializar sua capacidade de orientar e acolher, além de amplia o alcance da informação de qualidade e fortalece o vínculo entre ciência e sociedade.
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*Este artigo foi revisado pela equipe médica do Portal Afya.
Autoria
Gabriela Costa
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