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Reumatologia28 agosto 2020

Artrite reumatoide: Qual o impacto do MTX no desenvolvimento de doença intersticial pulmonar?

Doença intersticial pulmonar ligada à artrite reumatoide é relativamente frequente e o metotrexato costuma ser ligado à toxicidade pulmonar.

Por Gustavo Balbi

A doença intersticial pulmonar (PID) associada à artrite reumatoide (AR) (PID-AR) é relativamente frequente, podendo atingir de 2,2 a 30% dos pacientes, dependendo da série analisada. Além disso, é responsável por grande morbidade e letalidade, sendo responsável por 6,8 a 9,8% das mortes em pacientes com AR.

Leia também: Quais os tipos de pneumopatias na artrite reumatoide?

O metotrexato (MTX), atualmente recomendado como primeira linha de tratamento para todos os casos de AR, foi historicamente associado à ocorrência de toxicidade pulmonar. De fato, o MTX está associado ao desenvolvimento de pneumonite por hipersensibilidade aguda e subaguda em casos raros, mas a sua associação com doença pulmonar fibrosante vem sendo questionada por estudos mais recentes. Alguns apontam para a ausência de risco de piora da PID-AR, enquanto que outros sugerem, inclusive, um papel protetor do MTX.

De modo a responder essa questão, Juge et al. desenvolveram um estudo para avaliar o real impacto do MTX no desenvolvimento da PID-AR.

Estudo tenta verificar qual o impacto do metotrexato no desenvolvimento da doença intersticial pulmonar em pacientes com artrite reumatoide

Métodos

Trata-se de um estudo caso-controle multicêntrico, dividido em duas fases: uma de descoberta (conduzida na França) e uma de repetição internacional (realizada na Itália, Reino Unido, México, Brasil e Estados Unidos). Foram incluídos 410 pacientes com PID-AR fibrótica crônica e 673 pacientes com AR sem PID, os quais foram comparados com relação à exposição ao MTX.

Todos os pacientes do estudo preencheram os critérios classificatórios para AR (EULAR/ACR 2010 e/ou ACR 1987) e realizaram TC de tórax de alta resolução (TCAR). A data de inclusão no estudo foi considerada a data em que foi realizada a TCAR que confirmou ou excluiu a presença de PID-AR.

A exposição ao MTX foi avaliada desde o diagnóstico da AR até o momento da realização da TCAR, de modo a evitar o risco de viés pela suspensão do MTX após um potencial diagnóstico de PID-AR. A acurácia da obtenção de informações relacionadas à dose cumulativa de MTX foi considerada baixa pelos autores, então sua interpretação foi meramente descritiva.

Pacientes com diagnóstico provável de pneumonia por hipersensibilidade foram excluídos da análise.

Saiba mais: Como identificar a doença intersticial pulmonar associada à esclerose sistêmica?

Resultados

No total, foram incluídos 1.083 pacientes (410 com PID-AR e 673 AR sem PID, sendo 100 PID-AR e 165 AR sem PID na fase de descoberta e 310 PID-AR e 508 AR sem PID na fase de repetição internacional).

Os pacientes com PID-AR foram mais frequentemente do sexo masculino, mais velhos, com início mais tardio da AR, tabagistas e com um menor tempo de exposição ao MTX. A DLCO foi o principal parâmetro da prova de função pulmonar alterado, com mediana de 56% (43-69%); a mediana da CVF foi de 78% (62-93%).

Após ajuste para as demais variáveis, o uso do metotrexato em algum momento da doença se correlacionou de maneira inversa com a chance de desenvolver PID-AR. O OR encontrado foi de 0,43 (95%IC 0,26-0,69, p = 0,0006).

Além disso, o tempo para detecção de PID-AR em pacientes que fizeram uso de MTX foi maior do que naqueles que não utilizaram a medicação (11,4±10,4 vs. 4,0±7,4, p < 0,001), o que sugere que o uso de MTX pode ter retardado o desenvolvimento da PID-AR.

Esses achados foram consistentes nas diferentes populações, após análise de sensibilidade e nos diferentes padrões tomográficos (pneumonia intersticial usual e outros padrões tomográficos).

Comentários

Esse estudo traz alguns dados relevantes para a prática clínica, principalmente por nos tranquilizar com relação ao risco de toxicidade pulmonar do MTX. Ainda que seja possível, esse risco parece pequeno e está mais relacionado à pneumonia por hipersensibilidade aguda e subaguda, não à PID-AR fibrosante. Além do mais, o uso dessa medicação pode estar associado, inclusive, a um efeito protetor para o desenvolvimento da PID-AR, por propiciar um melhor controle do processo inflamatório sistêmico característico da AR, que precisa ser melhor estudado (vide comentário nas limitações).

Algumas limitações merecem destaque, como: o desenho retrospectivo (próprio dos estudos de caso-controle); o fato de não ter sido possível avaliar os motivos que levaram a não prescrição do MTX (que poderiam introduzir vieses de seleção dos pacientes e, desse forma, limitar a interpretação com relação ao efeito protetor do MTX); a impossibilidade de avaliação de drogas utilizadas concomitantemente ao MTX; a dificuldade de se avaliar a dose cumulativa de MTX para cada paciente; e a falta de representatividade de pacientes com PID-AR avançada (maioria dos pacientes apresentavam valores de CVF de 78% ou mais do predito).

Dessa maneira, os autores do estudo concluem que o MTX não parece se associar com um risco aumentado de PID-AR e que foi observado que a PID-AR foi detectada mais tardiamente em pacientes que fizeram uso de MTX.

Referências bibliográficas:

  • Juge P-A, Lee JS, Lau J, et al. Methotrexate and rheumatoid arthritis associated intersticial lung disease. Eur Respir J. 2020. doi:10.1183/13993003.00337-2020.
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