A formação em medicina exige inúmeras horas de trabalho árduo, dedicação e intensos estudos. No entanto, no momento de concretizar todo esse esforço e transformá-lo em potencial para ajudar os pacientes, percebemos que temos um outro grande problema: como me aproximar do paciente, conseguir que ele fale as informações que necessito e confie nas condutas que proponho?
Conduzir uma boa entrevista e coletar adequadamente as informações necessárias para a elucidação diagnóstica e proposição terapêutica quase nunca é uma tarefa fácil. O médico precisa conseguir demonstrar ao paciente seu interesse genuíno por entender o que está ocorrendo, conectar-se com o sofrimento que ele está passando e simultaneamente refletir racionalmente sobre a situação.
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Para que essas etapas sejam bem sucedidas um processo de comunicação eficiente precisa se estabelecer e é tarefa do médico assegurar as condições para essa comunicação. E não, esta não é uma habilidade reservada para alguns seres dotados de especial habilidade social. Com um bom domínio das técnicas de vínculo todos podem conduzir entrevistas e relações bem sucedidas com os pacientes.
Primeiramente, vamos definir o que é vínculo – é o ambiente de comunicação, criado pelo médico e paciente ao longo da entrevista. Este ambiente define o “clima” e a força da ligação (rapport) entre entrevistador e paciente. Há 5 tipos básicos de vínculo, de autenticidade, de empatia, de conhecimento, da aliança terapêutica e de liderança. Para usá-los o médico deverá se adequar a linguagem verbal e não verbal do paciente. Saber o momento correto de usá-los tornará seus contatos com os pacientes mais fluidos e espontâneos.
O vínculo de autenticidade é normalmente utilizado para estabelecer a aproximação inicial entre médico e paciente, quebrar o gelo dos primeiros momentos de contato e transmitir a mensagem que o médico é uma pessoa normal, como o paciente. Formas de estabelecer o vínculo de autenticidade é iniciar uma conversa informal, puxar um assunto não relacionado à doença, falar de coisas que você e o paciente têm em comum, falar de si mesmo ou usar o humor.
O vínculo de empatia mostra que o médico entende e se sensibiliza pelo sofrimento do paciente e é útil para fazer o paciente se aprofundar em questões mais dolorosas. Formas de mostrar empatia ao paciente é fazer qualificações como “você foi muito corajoso nessa situação”, nomear as emoções do paciente “você me parece preocupado / com medo com essa situação”, demonstrar compaixão “eu sinto muito que isso tenha acontecido com você, é uma situação horrível” e fazer revelações pessoais sobre seu sentimento em uma situação parecida. Normalmente o uso de técnicas de empatia aprofundam o rapport com os pacientes. No entanto, pacientes mais defensivos e retraídos podem se sentir desconfortáveis com a vivência dos sentimentos provocado por esse tipo de vínculo. Nesses casos, é melhor evitar o uso dessas técnicas.
O vínculo de conhecimento é provavelmente o mais empregado pelos médicos. É através dele que sinalizamos estar interessados nos sintomas a partir de uma visão médica e que temos familiaridade com as apresentações das patologias. Para conseguirmos fazer esse tipo de vínculo focamos nos sinais e sintomas, usamos uma linguagem mais técnica, investigativa e objetiva, e assumimos uma postura informativa e didática. Este vínculo serve para transmitirmos confiança ao paciente quanto a nossa capacidade profissional.
Imaginemos então o seguinte: você está conduzindo sua entrevista e empregou bem até o momento os três tipos de vínculos explicados. Há um bom rapport entre você e o paciente, mas aí, de repente, vocês começam a discordar quanto a causa do adoecimento, ou sobre a melhor forma de conduzir a investigação diagnóstica ou mesmo sobre qual a melhor terapêutica do caso. Nesses momentos, lançamos mão da aliança terapêutica: sinalizamos ao paciente que aceitamos sua visão do problema e que somos um aliado para resolvê-lo.
Usando da visão subjetiva do paciente estabelecemos objetivos comuns, como por exemplo: você pode explicar ao paciente que aquele remédio vai resolver um determinado sintoma secundário que o preocupa muito, ainda que você o tenha escolhido aquela medicação por inúmeras outras razões mais urgentes. Assim você garante a adesão e mostra aceitação das crenças do paciente. Em situações que o paciente se mostra ambivalente, devemos fazer aliança com a “parte sadia”, reforçando as razões trazidas para o engajamento no tratamento.
Por fim, mas permeando toda a condução da entrevista, temos o vínculo de liderança – embora nosso objetivo é que tudo pareça natural e espontâneo, durante todo o atendimento precisamos exercer um controle sutil da cena clínica. Este controle é realizado mediante o vínculo de liderança: com ele direcionamos o paciente para os objetivos e tarefas necessárias e sinalizamos sabemos qual é o caminho a percorrer para resolver aquele problema. Para tal, precisamos assumir as iniciativas e ter uma postura assertiva.
Conhecer as técnicas e os momentos de usá-las nos dá maior flexibilidade e maior capacidade de se adequar aos pacientes e aos desafios surgidos ao longo da entrevista, dando um maior equilíbrio entre os papéis desempenhados nos diferentes tipos de vínculo e evita que invistamos todas as nossas energias somente no vínculo de conhecimento.
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