Logotipo Afya
Anúncio
Dermatologia6 agosto 2024

Afecções dermatológicas na infância: Urticária

Saiba qual deve ser o manejo correto da urticária neste artigo da série especial de afecções dermatológicas na infância, assinado pela pediatra e alergista Bárbara Reis.

A urticária pode ser manifestação clínica de muitas doenças com investigações e tratamentos distintos, o que naturalmente gera muitas dúvidas e confusões, especialmente para os não especialistas. 

Quando acometem crianças, as urticárias tendem a causar profunda preocupação nos cuidadores, o que pode levar à realização de exames e tratamentos desnecessários ou até mesmo prejudiciais. 

Por isso, é imprescindível o conhecimento básico sobre o assunto e o entendimento das possíveis doenças relacionadas e sinais que indicam a necessidade de investigação mais aprofundada, geralmente realizada pelo alergista.  

Afecções dermatológicas na infância

Etiologia 

Alergias, doenças infecciosas, autoinflamação ou autoimunidade são todas possíveis causas de urticária, cada uma com suas nuances a nível de conduta. Dividir as etiologias a partir de determinados critérios auxilia no raciocínio clínico e no manejo das crianças com urticária. 

Duração 

A primeira subdivisão geralmente se baseia na duração do quadro. Quando as lesões estão presentes na maior parte dos dias por um período superior a seis semanas, trata-se de urticária crônica. Caso contrário, o diagnóstico é de urticária aguda. 

As urticárias agudas são o tipo mais comum na pediatria e, na maioria das vezes, têm como gatilho infecções virais simples. São quadros autolimitados que duram alguns dias e não demandam investigação adicional. Além de infecções virais, outras causas comuns são alergias a alimentos, medicamentos ou veneno de insetos. 

No contexto das doenças alérgicas, a urticária é manifestação clínica de alergias mediadas por IgE, que por definição são reações imediatas, tendo início até duas horas após o contato com a substância culpada e se resolvendo em algumas horas sem recorrência, exceto no caso de nova exposição. Raras são as situações em que a urticária alérgica se apresenta de forma mais tardia ou retorna sem reexposição ao alérgeno. 

As urticárias crônicas geralmente não têm fisiopatologia clara e podem ser desencadeadas por gatilhos específicos (urticária crônica induzida) ou não (urticária crônica espontânea). Esta última faz parte de um grupo heterogêneo de doenças. 

Morfologia 

A morfologia das lesões e manifestações associadas devem ser avaliadas cuidadosamente. A urticária típica se caracteriza por placas eritematosas, pruriginosas, migratórias e que não deixam lesão residual. 

Crianças com lesões fixas (persistem por mais de 24 horas no mesmo local), que apresentam pouco prurido, relatam dor ou têm lesões residuais, hipercrômicas ou arroxeadas, devem ser avaliadas com um olhar mais criterioso. 

As urticas podem se associar a angioedema ou surgirem isoladamente. Este pode demorar mais tempo para regredir do que as urticas, podendo persistir por até 72 horas. 

Distribuição 

Episódios de urticária têm distribuição difusa e migratória, desaparecendo de uma região dentro de algumas horas e aparecendo em outras regiões em seguida. Nos casos de lesões localizadas, duas etiologias importantes são a urticária de contato e as urticárias crônicas induzidas. 

Quadros de urticária de etiologia infecciosa podem cursar com grandes placas urticariformes com acometimento cutâneo extenso, mas esta distribuição não se caracteriza por si só como sinal de gravidade. 

Manifestações Clínicas Associadas 

Além dos sintomas cutâneos, é essencial questionar o paciente sobre manifestações clínicas associadas que possam indicar a etiologia da urticária ou a necessidade de investigação adicional. 

Urticária típica associada a sintomas como coriza e tosse em uma criança pequena em bom estado geral sugere urticária aguda de etiologia viral. Por outro lado, urticária que deixa lesão residual arroxeada associada a artralgia, dor abdominal e/ou febre pode indicar urticária vasculite, necessitando investigação de doenças autoimunes. 

O início agudo de urticária associada a sintomas respiratórios, gastrointestinais e/ou cardiovasculares indica anafilaxia e uma provável causa alérgica. 

Crianças com episódios persistentes/recorrentes de urticária de forma precoce, especialmente com sintomas sistêmicos ou história familiar positiva, devem ser avaliadas por imunologista pediátrico para doenças autoinflamatórias. 

Investigação Diagnóstica 

As urticárias agudas geralmente não demandam investigação laboratorial, sendo esta desencorajada para evitar achados inespecíficos. 

A investigação de sensibilização alérgica deve ser considerada exclusivamente mediante história típica de reação mediada por IgE, para alérgenos suspeitos com os quais o paciente teve contato até duas horas antes do início dos sintomas de urticária. É importante ressaltar que aditivos alimentares são causas raras de urticárias. 

Crianças com manifestações clínicas de urticária atípica, associadas a sinais e sintomas de doença autoimune/autoinflamatória ou com diagnóstico de urticária crônica devem ser encaminhadas para investigação com especialista. 

Tratamento 

Anti-histamínicos 

Não há indicação de uso de anti-histamínicos de primeira geração (difenidramina, hidroxizine, dexclorferinamina e etc) no tratamento da urticária, pois estes atravessam a barreira hematoencefálica, estando associados a efeitos adversos.  

Os anti-histamínicos de segunda geração (Tabela 1) são mais modernos, eficazes e bem tolerados, sendo a escolha para o tratamento das urticárias. Devem ser usados inicialmente em dose habitual, podendo ser quadruplicada se necessário, para controle dos sintomas. 

Mesmo em emergências, a urticária deve ser preferencialmente manejada com medicamentos por via oral, uma vez que não há antialérgicos de segunda geração para uso parenteral. 

É importante ressaltar que nos quadros de urticária aguda desencadeada por doença viral é comum que as lesões migrem por alguns dias, o que pode gerar preocupação nos familiares sobre a eficácia do tratamento. Deve estar claro que a doença é benigna e autolimitada e o objetivo do tratamento é dar conforto para a criança, mas que não necessariamente as lesões vão cessar com o uso do medicamento. 

 

Tabela 1 – Antialérgicos de segunda geração 

Nome Posologia 
Levocetirizina Adultos e crianças > 12 anos = 5 mg/dia  

Crianças 6 a 11 anos = 2,5 mg/dia  

Loratadina Adultos e crianças > 6 anos = 10 mg/dia  

Crianças de 2 a 5 anos = 5 mg/dia  

Desloratadina Adultos e crianças > 12 anos = 5 mg/dia  

Crianças de 6 a 11 anos = 2,5 mg/dia
Crianças de 1 a 5 anos = 1,25 mg/dia
Crianças de 6 meses a 1 ano = 1 mg/dia  

Fexofenadina Adultos e crianças > 12 anos = 180 mg/dia  

Crianças 2 a 11 anos = 30 mg 2x/dia
Crianças de 6 meses a 2 anos = 15 mg 2x/dia  

Ebastina Adultos e crianças > 12 anos = 10 mg/dia  
Bilastina Adultos e crianças > 12 anos = 20 mg/dia  

Crianças 6 a 11 anos (peso > 20 kg) = 10 mg/dia  

Fonte: Adaptado de Alcântara e colaboradores, 2022 

 

Corticosteroides  

O uso de corticosteroides deve ser ponderado com cuidado. Na urticária aguda de etiologia infecciosa, não são recomendados rotineiramente, exceto em casos de angioedema importante, sempre por curto período de tempo, na dose de 0,5-1 mg/kg/dia. 

Adrenalina 

A adrenalina é um medicamento indicado exclusivamente nos quadros de anafilaxia, cuja definição diagnóstica inclui sintomas envolvendo pelo menos dois órgãos/sistemas. Desta forma, não se recomenda seu uso para tratamento de urticária sem outros sintomas associados (ex.: dor abdominal, vômitos, sibilância, desconforto respiratório, hipotensão e etc).  

Caso seja identificado quadro anafilático, a adrenalina é a droga de escolha e deve ser a primeira a ser administrada, sem qualquer diluição, na dose de 0,01 ml/kg (máximo de 0,3 ml para crianças e 0,5 ml para adultos), sempre por via intramuscular no músculo vasto lateral da coxa. Esta dose pode ser repetida a cada 5-15 minutos.  

Imunossupressores e Imunobiológicos 

Os imunossupressores, como a ciclosporina, eram as drogas de escolha nos quadros de urticária crônica em que não havia controle adequado da doença com o uso de antialérgicos de segunda geração. 

Felizmente, medicamentos imunobiológicos estão cada vez mais disponíveis, inclusive para o tratamento de urticária crônica. A grande eficácia e excelente perfil de segurança fizeram com que o omalizumabe fosse incluído no fluxograma de tratamento da doença, inclusive para adolescentes a partir dos 12 anos de idade. 

Conclusão 

Urticária é uma apresentação comum a várias patologias diferentes e uma queixa relativamente frequente dentro da pediatria, sendo o médico pediatra muitas vezes o primeiro a avaliar o paciente. Dessa forma, é imprescindível que haja clareza sobre as principais causas de urticária, a necessidade ou não de investigação laboratorial e o tratamento mais adequado para cada caso. 

 

Anúncio

Assine nossa newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Ao assinar a newsletter, você está de acordo com a Política de Privacidade.

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Referências bibliográficas

Compartilhar artigo