Cirurgiões que realizam artroplastia total de joelho (ATJ), provavelmente já se viram diante do dilema: usar ou não isquemia? A prática é comum, mas longe de ser unanimidade. Defensores alegam que o a isquemia utilizando torniquete reduz sangramento, melhora a qualidade da cimentação aumentando a sobrevida do implante. Por outro lado, acumulam-se evidências de que ele pode atrasar a recuperação funcional, aumentar o risco de trombose, dor, hematomas e outras complicações.
Com tantas variáveis, o que realmente importa na hora de decidir? Um estudo recente publicado no “Archives of Orthopaedic and Trauma Surgery: tentou responder essa pergunta focando no que mais interessa: os desfechos de longo prazo. E a conclusão é surpreendente.
Métodos
Foram analisados quase 4 mil pacientes submetidos à ATJ cimentada, com ou sem uso de torniquete durante toda a cirurgia. O seguimento médio foi de 14,7 anos — um dado de peso, considerando que muitas complicações, como a soltura asséptica, só aparecem depois de cinco ou até dez anos da cirurgia.
Discussão e Resultados
O grupo com torniquete teve uma taxa de reoperação de 2,9%, contra 5,2% no grupo sem torniquete. A princípio, parece uma vantagem clara. Mas ao ajustar os dados para idade, IMC, comorbidades e, especialmente, o cirurgião, o uso de isquemia deixou de ser um fator significativo para reoperação ou soltura asséptica.
O que chamou atenção foi outro ponto: a idade. Pacientes mais jovens tiveram maior risco de reoperação, tanto por causas infecciosas quanto assépticas. A explicação pode estar no nível de atividade física desses pacientes, que tende a ser mais alto e, com isso, impõe mais estresse ao implante.
Além disso, muitos desses casos envolvem artrose pós-traumática, frequentemente precedida por múltiplas cirurgias — um fator conhecido de risco para infecção.
O estudo também lança luz sobre uma tendência crescente: o uso limitado do torniquete apenas no momento da cimentação. Essa estratégia parece equilibrar os benefícios mecânicos com uma menor taxa de complicações, algo que merece mais investigação em estudos futuros.
Por fim, os autores reforçam que, apesar de um grande volume de estudos randomizados sobre o tema, poucos realmente acompanham os pacientes por tempo suficiente para avaliar soltura ou falha do implante. Ou seja, decisões sobre o uso do torniquete não devem se basear apenas no “sangramento na sala” ou em modismos, mas sim em dados consistentes de longo prazo.
O que podemos levar para casa?
Em resumo: usar ou não isquemia parece ser secundário sendo o mais importante ainda a técnica cirúrgica bem executada e o acompanhamento atento, principalmente dos pacientes mais jovens. E que bom ter mais um dado robusto para embasar essa escolha.
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