A síndrome do olho seco (SOS) é uma patologia que pode causar impacto significativo na função visual e, consequentemente, na qualidade de vida dos indivíduos afetados. A fisiopatologia da SOS envolve prejuízo do filme lacrimal, de etiologia multifatorial. A prevalência da doença varia mundialmente, podendo atingir até 50% dos indivíduos em determinadas regiões, como a Ásia.
Embora seja mais comum em adultos, a SOS pode ocorrer em crianças e ser influenciada por diversos fatores. Devido à escassez de dados na literatura, um grupo de pesquisadores de países como China, Itália e Estados Unidos conduziu um estudo com o objetivo de descrever de forma mais ampla a doença na faixa etária pediátrica.
Metodologia
Os pesquisadores conduziram uma revisão sistemática com meta-análise, a partir de buscas em bancos de dados chineses, bem como em plataformas como PubMed e Cochrane, visando identificar artigos publicados entre janeiro de 2001 e abril de 2024. Foram selecionados estudos relevantes para o tema, os quais foram avaliados na íntegra por dois revisores.
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Resultados
Um total de 4.398 artigos teve seus resumos analisados, e 85 estudos foram avaliados integralmente. Por fim, os pesquisadores selecionaram 42 artigos para inclusão nesta revisão sistemática. Todos se tratavam de estudos transversais, conduzidos entre os anos de 2008 e 2023.
Considerando os artigos selecionados, foram identificados 48.479 participantes recrutados em 14 países, sendo 83% provenientes de países asiáticos — destes, 58% da China. A maior parte dessas pesquisas foi realizada em ambiente escolar ou na comunidade (59%) e apresentou uma distribuição semelhante entre meninas e meninos.
A partir desses dados, os pesquisadores identificaram uma prevalência combinada de SOS de 23% (intervalo de confiança [IC] de 95%: 18,5–28,9%). Essa prevalência foi de 42% (IC de 95%: 27,0–58,1%) nos poucos estudos que focaram em crianças usuárias de lentes de contato. Embora tenha havido algum grau de heterogeneidade entre os dados dos diferentes estudos analisados, esta não foi estatisticamente significativa.
Mesmo após agrupar os estudos por local de realização, tipo de critério diagnóstico utilizado, área geográfica, zona climática, nível de renda do país e efeitos relacionados à COVID-19, os pesquisadores não encontraram diferenças estatisticamente significativas nos resultados.
Discussão e Conclusões
A SOS é uma entidade que, mundialmente, não é muito associada à faixa etária pediátrica. No entanto, após esta revisão sistemática e meta-análise, nota-se que a doença pode acometer crianças com frequência quase semelhante à observada em adultos.
Um dado interessante, que requer mais estudos, é que a prevalência da doença variou de acordo com a forma de diagnóstico (sinais clínicos vs. questionários de avaliação). Essas diferenças podem estar relacionadas a uma maior percepção de desconforto ou menor tolerância à dor por parte das crianças, ou ainda ao uso de exames clínicos desenvolvidos para adultos sendo aplicados na avaliação pediátrica. Além disso, o questionário padronizado para o diagnóstico da doença inclui questões que podem ser de difícil resposta para crianças, como perguntas sobre dificuldade para dirigir à noite ou sobre o uso de computador e caixas eletrônicos.
Os pesquisadores também destacam que o uso de lentes de contato é um fator de risco conhecido para SOS em adultos e, embora o mesmo pareça ocorrer na população pediátrica, o baixo número de estudos e a heterogeneidade entre eles impedem uma compreensão mais aprofundada do tema — o que reforça a necessidade de mais investigações para sua adequada caracterização.
Para a interpretação acurada dos resultados, é essencial considerar as limitações desta pesquisa, sendo uma das principais o fato de que a análise se restringiu a estudos publicados por apenas 14 países, em sua maioria asiáticos.
O estudo conclui que é preciso priorizar urgentemente a saúde ocular pediátrica, especialmente considerando os desafios únicos relacionados a esse tipo de avaliação, como a falta de padronização diagnóstica — fator que contribui para a dificuldade em estimar a verdadeira prevalência da SOS em crianças. Nesse sentido, são cruciais a criação de adaptações dos questionários utilizados para a aplicação em crianças e o desenvolvimento de testes clínicos apropriados para avaliação pediátrica.
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