O conceito de prevenção quaternária (P4) ainda não é familiar para boa parte dos médicos e profissionais de saúde. No entanto, seu entendimento é muito importante para direcionar as práticas clínicas para melhores resultados em saúde, bem como para tornar mais eficientes os sistemas de saúde. No Sistema Único de Saúde muito se tem a caminhar para a implementação e consolidação dos preceitos da P4 na atuação do dia a dia, mas, sem dúvida, o âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS) é aquele no qual mais houve avanços nesse sentido.
Para avaliar as contribuições que a P4 vem trazendo para a APS até o momento, um estudo da Universidade Federal da Bahia realizou uma revisão integrativa sobre o tema, avaliando 22 artigos a partir dos descritores “prevenção quaternária” e “atenção primária” em diversas bases de dados, em inglês e português. Após a análise, foram sistematizadas as seguintes contribuições, técnicas e socioculturais:
Contribuições da prevenção quaternária
- Incluir na educação médica o ensino teórico e prático acerca da prevenção quaternária;
- Construir protocolos interpares e documentos de orientação gerencial que norteiem a verificação e desencorajem o uso médico excessivo, aplicando o cuidado em saúde baseado em evidências;
- Utilizar modelos explicativos dinâmicos na socialização com os usuários para elucidação do quadro clínico e condutas médicas;
- Fomentar pesquisas, visando ampliar as evidências científicas sobre sobremedicalização e outras práticas médicas excessivas;
- Realizar um cuidado em saúde centrado na pessoa;
- Centrar o cuidado na atenção primária à saúde, com longitudinalidade, aplicando a “demora permitida” e conduzindo a investigação diagnóstica de forma gradual, com foco na anamnese e no exame físico;
- Construir relações de trabalho em saúde pautadas na interprofissionalidade e na prática colaborativa;
- Incluir o paciente na construção dos projetos terapêuticos, através da comunicação dialógica;
- Considerar, durante a prática clínica, a experiência profissional, clínica do paciente, preferência do paciente e familiares, norteado pelo questionamento ético e reflexivo;
- Promover campanhas sobre sobremedicalização e intervenções médicas excessivas para comunidades e profissionais;
- Envolver diferentes profissionais de saúde na discussão e no processo de definição de causas e soluções do uso médico excessivo;
- Incentivar práticas de desmedicalização sociocultural em relação à dor, incapacidade, desconforto, envelhecimento, nascimento e morte;
- Motivar mudanças na percepção profissional e comunitária sobre o fenômeno do adoecimento e concepção da saúde.
Concluindo
O estudo conclui percebendo a ausência de normativas e diretrizes para guiar a prática clínica, através da P4 e de estudos em nível nacional para avaliar de maneira mais ampla as realidades vivenciadas pelos profissionais nesse sentido, bem como as medidas tomadas para efetivação dessas propostas. Entendendo a sensibilização dos profissionais e dos gestores como essencial para a implementação de práticas de P4 na realidade brasileira, surge como necessária a ampliação do debate através de mudanças nas orientações normativas concernentes à APS, visando a garantia de seus atributos, especialmente a integralidade.
Por fim, para a efetiva consolidação da influência da prevenção quaternária no contexto da APS, o estudo elenca as recomendações de: reformulação curricular de cursos de saúde ampliando o enfoque nessa temática; inclusão da P4 nas políticas de saúde brasileiras; desenvolvimento de eventos científicos sobre o tema; e maior engajamento da comunidade e dos próprios pacientes na elaboração das políticas públicas de saúde, de maneira a atenuar a sobremedicalização e as intervenções médicas excessivas e potencialmente danosas.
Referência bibliográfica:
- Maciel FBM, Santos HLPC, Prado NMBL. Contribuições técnicas e socioculturais da prevenção quaternária para a atenção primária à saúde: caminhos e desafios. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2020;15(42):2571. https://doi.org/10.5712/rbmfc15(42)2571
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