A infecção pelo vírus SARS-CoV-2 se iniciou em dezembro de 2019 e infectou mais de 100 milhões de pessoas no mundo. A OMS declarou pandemia poucos meses depois. Para restringir e prevenir a piora do quadro, medidas públicas foram instituídas incluindo o uso obrigatório de máscaras, o isolamento social, a implementação de homeschool e restrições de viagem. Durante a pandemia as crianças passaram mais tempo em casa por causa da suspensão das aulas presenciais, aumentando o tempo das atividades de perto e diminuindo as atividades outdoor. Por esse motivo seria esperado um aumento da progressão da miopia durante a pandemia por causa do lockdown.
Estudos longitudinais recentes demonstraram esse aumento. A prevalência da miopia é particularmente alta na Ásia do leste (China, Taiwan, Singapura e Hong Kong) e é estimada que seja em torno de 50% no mundo em 2050. Indivíduos com miopia, principalmente os com alta miopia, tem maior chance de ter alterações oculares relacionadas a baixa visão como as degenerações de retina. Um artigo publicado esse ano na JAMA Ophthalmology avaliou a associação do lockdown com a progressão da miopia e a performance das lentes DIMS para controle da miopia durante o período de lockdown.
Métodos
Foram utilizados dois estudos: no primeiro o uso das lentes oftálmicas foi prescrito para crianças acompanhadas anualmente por dois anos e no segundo o estudo clínico tinha um grupo controle usando lentes de visão simples. Ambos foram feitos com crianças de 7 a 13 anos em Hong Kong. No total foram 115 participantes, 58 no grupo DIMS e 56 no grupo de visão simples.
Resultados
Diferenças foram observadas no baseline entre os dois estudos para idade e refração com participantes do grupo visão simples aproximadamente meio ano mais velhos (10.3x 10.8 anos) e com miopia menor do que no grupo DIMS (-2.99x -4.02). Na população total, a alteração no comprimento axial em 12 meses foi 0.21 no grupo DIMS e 0.26 no grupo visão simples. A alteração na refração foi de −0.34 D no grupo DIMS e −0.50 no grupo visão simples. O tipo de tratamento (DIMS 0.19mm x VS 0.30mm) e a severidade do lockdown (pouco tempo 0.20mm x muito tempo 0.29mm) foram significativamente associados com alterações no comprimento axial. Em relação ao equivalente esférico, houve associação com o tipo de tratamento (DS -0,31 x VS -0,57) e a severidade do lockdown (menos tempo -0,34x mais tempo −0.54 D. Na comparação entre estudos, o tratamento com lentes DIMS foi significativamente associado a menor progressão em 12 meses do comprimento axial e da refração de 34% e 46% na população geral. Na subpopulação que ficou menor tempo em lockdown o tratamento com lentes DIMS foi significativamente associado a menor progressão em 12 meses de 37% e 52% respectivamente.
Considerações
Para evitar a rápida progressão, diferentes estratégias são usadas no controle da miopia. Uma dessas estratégias é o uso do defocus miópico, que ocorre com o uso de lentes com poder positivo, formando a imagem num plano focal em frente a retina. As lentes oftálmicas DIMS (defocused incorporated multiple segments [DIMS]) incorporam múltiplas microlentes de 3.50 D na periferia da lente. Estudos já demonstraram efeito protetor significativo na progressão da miopia usando essas lentes, mas não se sabia o quanto seriam efetivas nos casos de alto risco (em crianças em uso excessivo da visão de perto e pouco tempo de atividade outdoor).
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Conclusões e mensagem prática
Esse é o primeiro artigo que analisou o uso de medidas ópticas de controle da miopia durante o lockdown da pandemia, fase em que comprovadamente houve progressão mais rápida de muitos casos de miopia. Apesar da tendência a grandes progressões nesse momento, o tratamento com lentes DIMS se manteve eficaz no controle da progressão da miopia.
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