Uma apresentação aguardada no âmbito de leucemias mieloides agudas (LMA) foi o estudo do MD Anderson Cancer Center, intitulado “Phase 1b/2 study of Ivosidenib with venetoclax +- azacitidine in IDH1-mutated hematologic malignancies: a 2024 update”, que foi apresentado no dia 08/12/24 pela dra Jennifer Brown.
A relevância deste estudo reside no fato de que se trata de um subtipo genético comum de LMA, respondendo por 7-8% dos pacientes, e tal mutação pode ser encontrada ambém em casos de LMA associada a síndrome mielodisplásica (SMD) e síndromes mieloproliferativa (SMP) como Policitemia vera e mielofibrose.
Estudos prévios já haviam mostrado a eficácia do ivosidenibe associado a azacitidina, sendo o AGILE o estudo pivotal que mostrou que os pacientes que recebem a combinação apresentam mediana de sobrevida global de 29.3 meses, com taxa de resposta completa composta de 53%. (Montesinos et al. NEJM 2022). Ainda, o subgrupo de pacientes com IDH1 mutado presente no estudo VIALE-A, e que receberam portanto venetoclax + azacitidina, também apresentaram altas taxas de resposta completa composta, chegando a 67%, com mediana de sobrevida global de 10.2 meses (Dinardo, et al. NEJM 2022). O racional para a associação de ivosidenibe + venetoclax + azacitidina em um esquema triplo é contar com a profundidade de resposta obtida pelo venetoclax e a persistência desta resposta garantida pelo ivosidenibe, ambos em sinergismo com a azacitidina.
Vale lembrar que a associação azacitidina + ivosidenibe ou ivoidenibe sozinho já são aprovados para uso nos Estados Unidos, porém o ivosidenibe ainda não está disponível no Brasil.
Desenho do estudo |
Pacientes acima de 18 anos com LMA IDH1mut novos diagnósticos (desde que inelegíveis a tratamento intensivo), refratários e recaídos. |
Na fase 1 de escalonamento de dose, foram testadas doses diferentes de venetoclax (400 ou 800mg). Após a revisão de segurança, a fase 2, planejada para incluir 60 pacientes, utilizou o braço com venetoclax 400mg por 14 dias e azacitidina 75mg/m² por 7 dias e ivosidenibe diário na dose 500mg/d com início apenas no décimo quinta dia no C1 para evitar síndrome de diferenciação. |
Esquema final: Ivosidenibe contínuo 500mg/d (iniciado no C1D15) + Venetoclax 400mg/d por 14 dias + azacitidina 75mg/m² por 7 dias |
Métodos
Os desfechos primários envolviam avaliações de segurança e taxa de resposta global.
Até março de 2024, 56 dos 60 pacientes planejados já haviam sido incluídos e foram submetido a análise do resultados. Destes, 31 eram LMAs com diagnóstico novo, 13 eram rerfratárias/recaídas e 12 estavam associadas a SMD ou MPN. Os pacientes refratários/recaídos contribuíram com 50% daqueles que na fase 1b iniciaram com regime duplo (apenas venetoclax + azacitidina) e 16% dos que iniciaram com regime triplo (venetoclax + azacitidina + ivosidenibe). Após a definição da dose ideal e dos detalhes de segurança do esquema triplo, todos os pacientes passaram para este grupo na fase 2, mesmo aqueles que foram induzidos inicialmente com esquema duplo. 9% de toda a coorte apresentava também mutação do tp53, 14% apresentava K/NRAS e 27% NPM1.
A resposta global foi de 94%, sem diferença significativa entre os subgrupos de LMA de novo, associada a SMD ou SMP. A taxa de DRM negativa por imunofenotipagem foi de 78% no grupo R/R, 77% no grupo diagnóstico novo e 43% no grupo SMD/SMP. 22 pacientes, correspondendo a 39% do total, receberam transplante alogênico de medula.
Principais desfechos clínicos |
Taxa de resposta completa: 94%
Sobrevida global na mediana de follow up de 36 meses não atingida
Sobrevida global em três anos estimada em 71% Aqueles que receberam transplante alogênico de medula óssea apresentaram sobrevida global em 3 anos de 95% comparados a 58% dos que não transplantaram
Sobrevida livre de eventos 50,4 meses Duração da remissão (censurada naqueles que transplantaram): 43,4 meses |
Resultados
Nenhum paciente faleceu nos primeiros 30 dias do tratamento. Um paciente com TP53 mutado faleceu após 60 dias, refratário primário.
A maioria dos pacientes respondeu ao tratamento ao final de 2 ciclos, e ao final de 5 ciclos 93% seguiam em resposta completa.
Como se tratava de um estudo fase 1b/2, alguns pacientes da fase 1b foram inicialmente alocados no grupo que recebeu somente terapia dupla, migrando para a terapia tripla na fase 2. A autora comparou – apesar de não ser exatamente uma comparação correta de se realizar – como os pacientes do tratamento duplo se comportariam quando comparados aos que receberam terapia tripla desde o início. Apesar de não haver diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, é observada uma clara tendência de todos os desfechos melhores no grupo que recebe terapia tripla desde o início.
Mensagens práticas
Como se trata de um fase 1b/2, o número de eventos é limitado e nem sempre encontraremos desfechos estatisticamente diferentes, e por isso a apresentação dos desfechos clínicos se baseou em tendências.
A associação tripla de ivosidenibe com venetoclax e azacitidina combina a profundida de resposta induzida pelo venetoclax com a manutenção do resultado a longo prazo garantido pelo ivosidenibe, e o esquema apresentou excelentes taxas de resposta global, sobrevida global e livre de eventos, bem como duração da resposta.
A associação foi muito pouco tóxica, com apenas 11% de infecções e 7.1% de síndrome de diferenciação.
Com resultados a longo prazo confirmando estes efeitos clínicos relevante, muito provavelmente a associação tripla se tornará o standard of care para LMA IDH1mut.
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