Ainda sobre o primeiro dia do 30º Congresso da Sociedade Europeia de Hematologia (EHA) congresso, tivemos uma a sessão inteiramente dedicada aos inibidores de menin na leucemia mieloide aguda (LMA) com o Dr. Harry Erba, da Universidade de Duke, para apresentar os resultados do estudo KOMET-007.
O KOMET-007 é um estudo fase 1a/b, ainda em andamento, que incluiu pacientes adultos com LMA recém-diagnosticada e NPM1-m ou KMT2A-r. Todos os participantes receberam a dose recomendada para fase 2 (RP2D) de ziftomenibe — 600 mg por via oral, uma vez ao dia — em combinação com 7+3 (citarabina + daunorrubicina).
O ziftomenibe foi iniciado no 8º dia de indução e mantido de forma contínua durante consolidação e pós-consolidação (incluindo transplante, quando indicado). Os desfechos principais foram segurança e taxa de remissão completa (CR); secundários incluíram taxa de remissão composta (CRc), duração de resposta e sobrevida global (OS).
Esquema de tratamento resumido
Indução com 7 + 3 e início do ziftomenibe 600mg/d no D8.
Se remissão, prosseguiram para consolidação com até 4 ciclos de citarabina em altas doses e ziftomenibe contínuo.
O ziftomenibe seria mantido como terapia de manutenção e os pacientes poderiam ser submetidos ao transplante alogênico de medula óssea se clinicamente indicado.
Só para refrescar nossa memória em relação aos inibidores de menin:
A menin é uma proteína essencial para a manutenção da leucemia em pacientes com mutação do NPM1 (NPM1-m) ou rearranjos de KMT2A (KMT2A-r). Ela funciona como um cofator epigenético, ajudando na ativação de genes pró-leucêmicos, especialmente os da família HOX (como HOXA9) e MEIS1, que promovem a proliferação e bloqueiam a diferenciação celular.
A importância epidemiológica de desenvolver inibidores de menin é imensa, já que mutações envolvendo NPM1 e KMT2A podem ocorrer em cerca de 40% dos pacientes com LMA. A inibição da menin mostrou respostas promissoras em estudos anteriores com monoterapia ou em combinação. Com base nisso, o estudo KOMET-007 avaliou o menin-inibidor ziftomenibe em combinação com a quimioterapia intensiva padrão (7+3) como terapia de primeira linha em pacientes adultos com LMA e essas alterações genéticas.
O que o estudo mostrou até agora?
Com 51 pacientes tratados até janeiro de 2025 (35 NPM1-m e 16 KMT2A-r), os dados de seguimento são promissores:
- Taxas de CR foram elevadas: 88% nos NPM1-m e 83% nos KMT2A-r. Quando considerada a resposta composta (CRc), os números aumentam para 94% e 83%, respectivamente.
- A tolerabilidade foi boa, mesmo com quimioterapia intensiva. Eventos adversos grau ≥3 mais comuns incluíram neutropenia febril (47%) e plaquetopenia (31%), mas o mais notável foi que apenas 1 paciente desenvolveu síndrome de diferenciação grau 3, que é uma preocupação relevante no uso de inibidores de menin. Vale lembrar que, no estudo AUGMENT-101, que avaliou outro inibidor de menin – o revumenibe, em monoterapia, a taxa de síndrome de diferenciação grau 3 girou em torno de 13% – 14 dos 93 pacientes do estudo. O próprio ziftomenibe em monoterapia, cuja ação foi explorada no estudo KOMET-001, não levou nenhum paciente à síndrome de diferenciação grau 3 ou mais.
- A recuperação hematológica foi preservada, com mediana de 31 dias para neutrófilos e 28 dias para plaquetas — ou seja, sem impacto adicional relevante na mielotoxicidade. Ainda, o autor deixou claro que é muito provável que a toxicidade medular não seja atribuída somente ao ziftomenibe, mas também à quimioterapia convencional acrescida ao esquema (naturalmente).
- Até o corte de dados, a maioria dos pacientes seguia em tratamento ativo, com mediana de 18,4 semanas em NPM1-m e 15,5 semanas em KMT2A-r. 1 dos pacientes faz uso de ziftomenibe de manutenção pós transplante alogênico e 15 em manutenção independente de transplante.
- Os dados de sobrevida e duração de resposta ainda não estão maduros, mas os índices de OS foram de 97% e 83% em 35 e 30 semanas, respectivamente.
Vale deixar alguns comentários sobre as características basais das populações do estudo:
- Na parte 1a do estudo, todos os pacientes pertenciam ao grupo de alto risco (ou seja, KMT2ar, ou aqueles que eram NPM1 mutados mas também com cariótipo de alto risco). Já na parte 1b, qualquer paciente com mutação do NPM1 ou rearranjo do KMT2a era incluído, independentemente de outros fatores prognósticos.
Como isso impacta na nossa prática?
- Por enquanto, ainda levaremos um tempo para sequer pensar em levar o ziftomenibe para nossa prática. A própria FDA ainda não aprovou a droga, apesar de ter concedido a ela o status de terapia inovadora (breakthrough therapy) em abril de 2024, e um pedido de registro do ziftomenibe tem promessa de submissão para muito em breve.
- No contexto brasileiro, sobretudo no SUS, ainda estamos bem atrasados no que se refere a este tipo de inovação, já que temos que superar barreiras de estratificação molecular adequada dos nossos pacientes com LMA. Por incrível que pareça, não é incomum centros públicos não disporem sequer de um método padronizado para detectar rearranjos do KMT2A.
- Mas essa não será a última vez que você ouvirá falar dos inibidores de menin, ok? Os últimos meses têm sido marcados por uma corrida fervorosa das indústrias farmacêuticas a fim de lançar seu próprio inibidor de menin e dominar esse mercado que envolve 40% das LMA. Fique de olho!
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