No ASH 2025, a dra Roberta Azevedo (MD Anderson) apresentou o seguimento de três anos do estudo fase II avaliando a combinação tripla azacitidina (AZA), venetoclax (VEN) e gilteritinibe (GILT) em pacientes com LMA recém-diagnosticada FLT3-mutada inelegíveis a quimioterapia intensiva. Ela iniciou sua apresentação justificando o racional biológico dessa associação, que se baseia na forte sinergia pré-clínica entre VEN e inibidores de FLT3, com bloqueio convergente de vias antiapoptóticas, e o próprio MD Anderson já havia mostrado previamente que a combinação tripla alcançava taxas de MRD- negatividade próximas de 90%, muito superiores às de AZA+VEN isoladamente.
A população avaliada foi pequena. Abaixo, vocês veem como o regime foi administrado:
Basicamente, os pacientes receberam:
- Indução
- AZA 75 mg/m² D1–7
- VEN 400 mg D1–28
- GILT 80 mg D1–28
- Avaliação de medula óssea no D14:
Se aplasia ou blastos <5%, VEN e GILT eram suspensos imediatamente até recuperação.
- Consolidação (ciclos 2–24)
- AZA D1–5
- VEN apenas 7 dias por ciclo (padrão institucional)
- GILT contínuo
- Manutenção após ciclo 24
- Gilteritinibe em monoterapia
População
Entre 2020 e 2022, 30 pacientes foram incluídos (mediana 71 anos; 30% ≥75 anos). Deles:
- FLT3-ITD: 73%
- FLT3-TKD: 27%
- Mutação em via RAS: 23%
Eficácia
A taxa de resposta foi excepcional:
- CR/CRi: 100% (nenhuma mortalidade na indução!!!)
- Quando à DRM negativa, tivemos uma taxa de 93% — reforçando profundidade de resposta sem precedentes em LMA FLT3-mutada inelegível
(consistente com dados prévios do MD Anderson mostrando DRM– em ~90% dos pacientes)
Transplante e desfechos pós-resposta
Entre os 30 pacientes que responderam:
- 14 (47%) foram encaminhados ao transplante alogênico
- 5 morreram em CR
- 3 recaíram
- 8 recaíram globalmente no estudo e continuam em seguimento
Entre os pacientes que recaíram:
- Mediana de duração de resposta: 19,9 meses
- 67% perderam a mutação FLT3 na recaída (mostrando escape biológico)
- 75% apresentaram evolução clonal
Sobrevidas
Com seguimento mediano de 41,5 meses:
- RFS (mediana): 23,4 meses
- OS (mediana): 29,7 meses
- RFS e OS superiores em FLT3-TKD vs ITD
- ITD: RFS 17 meses; OS 21,8 meses
- TKD: RFS 38,5 meses; OS não alcançada
- A idade não afetou prognóstico (≥75 anos vs <75)
- Mutação em via RAS mostrou tendência a pior prognóstico, porém sem significância estatística
Notavelmente, transplante alogênico não melhorou a sobrevida, provavelmente influenciado pela alta mortalidade relacionada ao TMO (5/14 transplantados morreram em CR).
Padrão de resposta baseado em FLT3-TKD vs ITD
RFS por subtipo FLT3
| FLT3 subtype | N | Median RFS | 1-year RFS | 2-year RFS | 3-year RFS |
| ITD | 22 | 17.0 months | 64% | 41% | 32% |
| TKD | 8 | 38.5 months | 100% | 75% | 75% |
OS por subtipo FLT3
| FLT3 subtype | N | Median OS | 1-year OS | 2-year OS | 3-year OS |
| ITD | 22 | 21.8 months | 77% | 50% | 36% |
| TKD | 8 | Undefined | 100% | 75% | 75% |
Padrão da recaída
A apresentadora mostrou que 67% das recaídas já não esboçaram FLT3 mutado, e 75% apresentavam sinais citogenéticos e moleculares de evolução clonal, conforme tabela abaixo:
| Patient | FLT3 type | Co-mutations at diagnosis | Co-mutations at relapse |
| #1 | ITD | RUNX1, KRAS | RUNX1, GATA2 |
| #2 | TKD | TET2, NRAS, SF3B1, SMC1A, STAG2, BCORL1 | DNMT3A, NRAS, ZRSR2, GATA2 |
| #3 | ITD | DNMT3A, PTPN11, U2AF1, TET2 | BCOR, DNMT3A, PTPN11, U2AF1, TET2 |
| #4 | TKD | DNMT3A, RUNX1 | DNMT3A, RUNX1, IKZF1 |
| #5 | TKD | BCOR, DNMT3A, SH2B3, U2AF1 | BCOR, DNMT3A, EZH2, NRAS |
| #6 | ITD | DNMT3A, WT1 | FLT3-TKD (VAF 5%) |
| #7 | TKD | — | — |
Toxicidade e manejo
O regime mostrou toxicidade moderada e manejável:
- Infecções durante indução: 27%
- Infecções na consolidação: 48%
- Neutropenia febril ≥G3: 40%
- Sepse ≥G3: 17%
A medicação com maior necessidade de ajuste foi venetoclax (48%), seguida de:
- Azacitidina: 44%
- Gilteritinibe: 28%
A principal causa de descontinuação precoce foi o encaminhamento para transplante.
Os pacientes receberam mediana de 3 ciclos, embora alguns tenham completado até 36 ciclos.
Pontos adicionais relevantes
- O estudo não teve tamanho amostral suficiente para avaliar o papel prognóstico da MRD de forma definitiva.
- Quando questionada sobre o uso de venetoclax por 7 dias, a investigadora destacou que este é o padrão institucional do MD Anderson para consolidação em tripla combinação, provavelmente pois esse esquema triplo é reconhecidamente muito mielotóxico.
- Os resultados reforçam que a sinergia VEN + GILT parece ser um dos motores da profundidade de resposta, permitindo DRM negativa muito elevada e respostas prolongadas.
Autoria

Luiza Lapolla Perruso
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