A microbiota intestinal participa de processos biológicos importantes, como resposta imune e interações no metabolismo. Dessa forma, a sua alteração (disbiose) está relacionada a diversas enfermidades, como obesidade, doenças mentais e, inclusive, doenças reumatológicas inflamatórias. A disbiose gera um desequilíbrio das respostas pró e anti-inflamatórias e dessa forma podem participar da etiopatogenia de doenças como artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Sjögren, esclerose sistêmica, espondilite anquilosante e até mesmo osteoartrite.
A microbiota intestinal é um alvo de interesse na prevenção e tratamento dessas doenças, porém os estudos ainda são inconsistentes. Recentemente, foi publicado no Jama, uma revisão sistemática de estudos que avaliam a interação da microbiota com doenças reumatológicas.
Métodos
Seleção de artigos das bases PubMed, Embase e Cochrane Library até 11 de março de 2022 por dois pesquisadores, utilizando os seguintes critérios de inclusão: estudo observacional; análise da microbiota intestinal com dados disponíveis sobre medidas de diversidade ou abundância e incluindo participantes com doença reumática. Os desfechos primários foram avaliação da composição da microbiota intestinal (diversidade α e diversidade β) e achados taxonômicos em nível de filo, família e gênero. As informações extraídas dos estudos foram revisadas por quatro pesquisadores, incluindo dados demográficos e de metodologia. Para avaliação da qualidade dos estudos foi aplicada a escala NOS que avalia qualidade para estudos observacionais com base na seleção, comparabilidade e resultado dos artigos.
A partir de dados disponíveis em pelo menos dez estudos, foi realizada metanálise sobre as diferenças na diversidade α entre pacientes com doença reumática e controles, calculando a diferença média padronizada agrupada e seu intervalo de confiança de 95%. Através dos dados obtidos, os estudos foram estratificados em três subgrupos: tipo específico de doença reumática, distribuição regional das populações do estudo (ocidental x oriental) e administração de medicamentos antirreumáticos (em tratamento x naïve).
As diferenças na diversidade β entre pacientes com doenças reumáticas e controles foram resumidas de forma qualitativa. Para confirmar alterações da microbiota específicas da doença, primeiro observou-se concordância dos microorganismos em pelo menos dois estudos, sendo então categorizados como aumentados, reduzidos ou “não consistentes” em pacientes com doença reumática em comparação com o grupo controle.
Resultados
Foram incluídos 92 estudos com 14 doenças reumatológicas distintas, sendo artrite reumatoide a mais pesquisada, seguida por lúpus eritematoso sistêmico, espondilite anquilosante, esclerose sistêmica, osteoartrite e síndrome de Sjögren.
57,6% dos estudos foram realizados em países orientais. A maioria dos estudos não especificou o uso concomitante de medicações, sendo 27% virgens de tratamento, em torno de 10% em tratamento definido e o restante não relatado.
Em relação a qualidade dos estudos segundo a pontuação total da NOS, 31 foram classificados como de baixa qualidade, 54 como de qualidade moderada e 7 como de alta qualidade.
Existe uma redução geral da população α da microbiota, contudo ao se avaliar doenças específicas essa redução ocorreu na artrite reumatoide, LES, gota e fibromialgia. Na esclerose sistêmica houve um aumento dessa diversidade.
Espondilite anquilosante e doença do IgG4 apresentam diferenças estatisticamente significativas na população β da microbiota. foram consistentemente relatadas em espondilite anquilosante e doenças relacionadas a IgG4.
Depleção de Faecalibacterium (produtor de butirato) e o aumento de bactérias pró-inflamatórias como Streptococcus spp. foram observados na artrite reumatóide, síndrome de Sjögren e lúpus eritematoso sistêmico.
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Mensagens práticas
O papel do microbioma nas doenças inflamatórias é tema conhecido, todavia diante a grande diversidade da nossa microbiota e pouca padronização dos estudos clínicos, o papel prático na terapêutica ainda vem sendo definido. O estudo em questão é uma revisão sistemática da microbiota nas doenças reumatológicas, sendo importante pois compreender a fisiopatologia é a base necessária para futuros estudos de intervenção.
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