A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) é um crescente problema de saúde pública, relacionado ao aumento do risco de cirrose hepática e carcinoma hepatocelular (CHC). A hepatocarcinogênese na DHGNA está associada a inflamação crônica. Existe um benefício em ascensão do uso da aspirina diária na prevenção de câncer, segundo dados anteriores relacionados a outras neoplasias, como a colorretal e ao próprio CHC por etiologia de hepatites virais B e C.
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Devido a essa hipótese, foi realizado um estudo de coorte populacional em Taiwan, a fim de avaliar a associação entre aspirina diária e o risco de CHC em pacientes com DHGNA, incluindo os de alto risco.
Métodos
Trata-se de um estudo retrospectivo do tipo coorte populacional, utilizando o banco de dados nacional de pesquisa de seguros de saúde em Taiwan, entre 1997 e 2011. Inicialmente, foram avaliados dados de 145.212 pacientes com DHGNA no período.
Após exclusão de fatores ambíguos, foram selecionados dois grupos de pacientes:
- Grupo 1 – tratados com aspirina diária por pelo menos 90 dias – 33.484 indivíduos;
- Grupo 2 – não tratados – 55.543 indivíduos.
A incidência cumulativa e a taxa de risco (HR) para a ocorrência de CHC foram analisadas após ajuste de fatores competitivos. Os pacientes de alto risco também foram avaliados.
A definição de paciente de alto risco incluiu:
- Idade ≥ 55 anos e alanina aminotransferase (ALT) aumentada.
Resultados
No grupo tratado com aspirina, a mediana de idade foi de 63,5 anos, sendo 47,4% homens e 52,6% mulheres. A dose de aspirina foi ≤ 100 mg/dia na grande maioria (98,4%) e a duração média do tratamento foi de 8,4 anos (IQR: 5,0–11,5 anos). 8,7 % dos pacientes apresentavam elevação sérica de ALT. As covariáveis basais foram equilibradas entre os dois grupos, com uma diferença média padronizada < 0,1.
O grupo tratado com aspirina foi significativamente associado a:
- Menor incidência cumulativa de CHC em 10 anos na população geral — grupo 1 (0,25% [95% CI, 0,19–0,32%] vs. grupo 2 0,67% [95% CI, 0,54–0,81%]; P < 0,001), com risco reduzido de CHC (HR ajustada 0,48 [95% CI, 0,37–0,63]; P < 0,001).
- Menor incidência cumulativa de CHC em 10 anos na população de risco — grupo 1 (3,59% [95% CI, 2,99–4,19%] vs. grupo 2 6,54% [IC 95%, 5,65–7,42%]; P < 0,001), com risco reduzido de CHC nessa subpopulação (aHR 0,63 [IC 95%, 0,53–0,76]; P < 0,001).
Em relação ao tempo de tratamento, o risco de CHC foi significativamente menor com o uso de aspirina por três anos ou mais (aHR 0,64 [95% CI, 0,44-0,91]; P = 0,013), quando comparado com o uso de curto prazo (até um ano).
Conclusão
A crescente incidência de DHGNA é um desafio para a saúde, sendo o CHC uma grande preocupação nesses pacientes. Dessa forma, identificar os pacientes de alto risco e traçar estratégias preventivas vêm ganhando relevância.
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Esse estudo demonstrou, pela primeira vez, associação de baixa dose de aspirina a um risco reduzido de CHC em pacientes com DHGNA, sendo estímulo para mais estudos futuros, tornando a terapia com aspirina uma consideração importante do ponto de vista de saúde pública, levando em conta riscos e benefícios de forma individual.
Mensagem prática
Todavia, trata-se de estudo de coorte, retrospectivo, envolvendo apenas pacientes de Taiwan. Dessa forma, não pode ser utilizado como recomendação de tratamento, mas sim como encorajamento do desenvolvimento de ensaios clínicos, principalmente para pacientes com alto risco de CHC.
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