A obesidade é uma condição crônica que sabidamente aumenta o risco de outras doenças metabólicas, como diabetes e dislipidemia. Ainda, é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares. Como tratado em alguns outros textos do portal, seu tratamento vem evoluindo significativamente com novas medicações, sobretudo com os agonistas de GLP-1. No entanto, é bem evidente que o mecanismo de ação de todas as drogas antiobesidade se dá pela inibição do apetite, por diferentes vias, o que significa dizer que o intuito do uso das medicações no tratamento da obesidade é permitir que a ingesta calórica diária fique dentro dos limites esperados para induzir a perda de peso.
Portanto, é fundamental no tratamento da obesidade traçar um plano alimentar. Dentre as propostas, uma delas vem ganhando destaque tanto na mídia leiga como no meio científico, o jejum intermitente (JJI). E por ser um tema relativamente novo, mas que já conta com algumas publicações a respeito, foi publicada uma revisão narrativa a respeito na conceituada revista Nature Endocrine Reviews. O estudo separou os efeitos do JJI na obesidade e composição corporal e também em fatores de risco cardiometabólicos. Por fins didáticos, separamos os assuntos em dois tópicos.
Objetivo do jejum intermitente e tipos
O objetivo avaliado nesta revisão foi o sucesso na perda de peso que tenha significado clínico, ou seja, uma perda ponderal ≥ 5% do peso inicial (existem outros estudos e revisões na literatura a respeito de mecanismos propostos, vias antioxidantes, melhora de sobrevida global e redução do risco de câncer, que não foram escopo desta revisão) e o impacto em fatores de risco cardiovasculares associados.
Importante destacar que existem três tipos de jejum intermitente preconizados:
- Tempo de restrição alimentar (TRA), onde o indivíduo permanece em jejum pelo menos 12h (tipicamente 16h) por dia. No restante do tempo, não há restrição na quantidade de calorias*
*Esta foi a forma avaliada nos estudos incluídos na revisão. É importante destacar que na prática muitas vezes existe a recomendação de se restringir não somente o tempo de ingesta mas também a quantidade de calorias consumidas no período de alimentação.
- Jejum em dias alternados, sendo um dia sem restrições e um dia de jejum (limite de 500 kcal durante o dia de “jejum”, com estímulo à ingesta hídrica)
- Jejum 5:2, onde dentro de uma semana, cinco dias são de alimentação comum, sem restrições, e dois dias de jejum (limite de 500-1000 kcal).
As duas últimas formas foram agrupadas por fazer parte de modelos muito parecidos de jejum e resultados similares em estudos.
Os efeitos no peso
Os ensaios clínicos randomizados (RCTs) envolvendo os modelos 2 e 3 na sua maioria tiveram duração entre 8 e 12 semanas. O resultado? Em geral, ambos produzem efeitos parecidos na perda de peso, levando a redução de cerca de 4-8% do peso corporal inicial. Estudos com 24-52 semanas não observaram diferenças quando comparados a um seguimento mais curto, de até 12 semanas, o que pode sugerir que a perda máxima de peso nessa estratégia acontece por volta dos três meses de dieta.
Quando comparado a dietas baseadas em restrição calórica, não houve diferença no percentual de redução de peso corporal.
Já os estudos envolvendo o TRA mostraram uma taxa de sucesso menor, sendo que nenhum RCT mostrou uma perda maior que 5%, atingindo uma média de 3-4%. Parece desapontador, mas vale lembrar que não havia orientação sobre restrição calórica no período de alimentação nos estudos selecionados para esta revisão.
Ainda não existe nenhum RCT head-to-head entre as modalidades de jejum intermitente.
Composição corporal
Os efeitos na composição corporal mostraram que cerca de 75% da perda de peso induzida no JJI foi em massa gorda, idêntico ao que é induzido pela restrição calórica.
Outro estudo destacado salientou que o JJI quando associado a atividade física resistida foi capaz de manter a massa muscular (algo que não se consegue apenas com dieta) e também reduziu de forma significativa a gordura subcutânea.
Ouça agora: Risco de obesidade e disbiose [podcast]
Jejum intermitente é superior a outras formas de dieta?
Na luz das evidências atuais, não existe uma forma superior de dieta para a perda de peso. Inclusive, a perda de peso nas formas de JJI que atingiram resultado significativo nos estudos provavelmente são secundárias à indução de um déficit calórico. A melhor dieta é aquela que se adequa ao paciente e é capaz de ser mantida a longo prazo, uma vez que a obesidade é uma doença crônica (assim como diabetes, hipertensão, DPOC, etc.) e requer tratamento contínuo com mudança no estilo de vida.
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