A atual diretriz da Sociedade Brasileira de Diabetes sobre monitorização do diabetes durante a gestação recomenda o uso de dispositivos de monitoramento contínuo de glicose (CGM) por gestantes com diabetes mellitus tipo 1 (DM1). O objetivo desse monitoramento é evitar hipoglicemia materna e neonatal, bebês grandes para a idade gestacional (GIG), internações em UTI neonatal e tempo prolongado de hospitalização após parto.
Quando se trata de gestantes com diabetes mellitus gestacional (DMG), a diretriz brasileira descreve que não existe evidência de benefício para evitar as complicações da hiperglicemia na gestação, não havendo recomendação formal para uso. O estudo suíço DipGluMo, publicado recentemente no The Lancet trouxe novas evidências sobre esse cenário. Trata-se de um ensaio clínico aberto, randomizado e controlado, com gestantes de idade entre 18 e 45 anos com diabetes gestacional, que foram aleatoriamente designadas (1:1) para o grupo de intervenção (monitoramento contínuo de glicose em tempo real – rtCGM) ou o grupo controle (glicemias capilares). O desfecho primário foi um composto de desfechos perinatais: grande para a idade gestacional, macrossomia, polidrâmnio, hipoglicemia neonatal e natimorto. Os principais desfechos secundários foram a preferência do paciente e o controle glicêmico materno.
Não foram encontradas diferenças clinicamente relevantes nos desfechos neonatais e perinatais. Notavelmente, a prevalência de neonatos grandes para a idade gestacional e hipoglicemia neonatal foi semelhante em ambos os grupos. O rtCGM não demonstrou benefícios glicêmicos em relação às glicemias capilares.
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Apesar da ausência de diferença em desfechos clínicos, o estudo revelou algumas informações importantes: o tempo na faixa-alvo (time in range) foi discretamente inferior no grupo rtCGM, e a necessidade de insulinização foi ligeiramente maior nesse grupo, embora sem diferença estatística. Por outro lado, as gestantes demonstraram clara preferência pelo rtCGM, considerando-o mais confortável e fácil de utilizar. Um ponto que chama atenção é que a população estudada tinha baixo risco metabólico (IMC médio de 25,8 kg/m² e HbA1c inicial em torno de 5,1%), o que pode ter limitado a capacidade de detectar diferenças entre os métodos.
Um comentário editorial publicado na mesma edição da revista ressalta algumas reflexões importantes para a prática clínica. Ele destaca que os resultados obtidos com glicemias capilares foram surpreendentemente bons nessa população de baixo risco, e levanta a hipótese de que o rtCGM possa mostrar mais benefícios em grupos com obesidade, diagnóstico precoce de diabetes gestacional ou dificuldade de adesão ao monitoramento capilar. Além disso, questiona se os alvos de controle glicêmico utilizados atualmente no rtCGM para diabetes gestacional são os mais adequados, já que foram extrapolados de estudos com diabetes tipo 1. Novos ensaios clínicos deverão responder a esses questionamentos.
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