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Endocrinologia17 abril 2025

Impacto de idade e gênero no tratamento do diabetes tipo 2

Estudo avaliou se a eficácia dos iSGLT2 e dos aGLP-1 no controle glicêmico e na redução do risco cardiovascular apresenta diferenças entre gêneros e faixas etárias

A heterogeneidade na resposta terapêutica ao tratamento do diabetes tipo 2 (DM2) é um tema de crescente interesse clínico e científico, especialmente em relação às diferenças de eficácia das intervenções farmacológicas entre grupos populacionais distintos. Tais diferenças em respostas e também em eventos adversos podem auxiliar na elaboração de diretrizes cada vez mais personalizadas, visando maximizar o aproveitamento das medicações de acordo com o grupo que a utilize. 

Os inibidores de SGLT2 e os agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1 (aGLP-1) são amplamente utilizados devido aos seus benefícios não apenas no controle glicêmico, mas também na redução do risco de eventos cardiovasculares adversos maiores (MACE) e de desfechos renais em pacientes com diabetes. No entanto, não é sabido se existe alguma variação de eficácia dessas medicações conforme a idade e o sexo dos pacientes. 

Nesse contexto, foi publicado recentemente um estudo cujo objetivo foi avaliar se a eficácia dos iSGLT2 e dos aGLP-1 no controle glicêmico e na redução do risco cardiovascular apresenta diferenças significativas entre diferentes faixas etárias e entre homens e mulheres. Para isso, foi conduzida uma revisão com metanálise, que incluiu ensaios clínicos randomizados comparando essas classes terapêuticas com placebo ou outros agentes antidiabéticos. O estudo foi publicado recentemente no JAMA. 

Métodos 

O estudo foi uma revisão com metanálise de ensaios clínicos randomizados que analisaram o impacto dos iSGLT2, aGLP-1 e inibidores da dipeptidil peptidase-4 (iDPP4) no controle glicêmico e na incidência de eventos cardiovasculares, considerando a estratificação por idade e sexo, em indivíduos com diabetes tipo 2 (DM2). Os dados foram extraídos de bancos como MEDLINE, Embase e registros clínicos nos Estados Unidos e na China, abrangendo estudos publicados até novembro de 2022, com uma atualização realizada em agosto de 2024 para incluir novos ensaios. Foram incluídos apenas estudos que compararam essas classes de fármacos com placebo ou com outro antidiabético. Foram incluídos impressionantes 601 ensaios clínicos randomizados, dos quais 103 estudos possuíam dados individuais, compondo uma amostra total de 592 trials reportando HbA1c (309.503 participantes) e 23 trials (n = 168.489) reportando MACE.  

Os principais endpoints avaliados foram a variação na HbA1c e Incidência de MACE, incluindo morte cardiovascular, infarto do miocárdio não fatal e acidente vascular cerebral (AVC) não fatal. Para a análise estatística, foram utilizados modelos de meta-regressão multinível, considerando interações entre idade e tratamento, bem como sexo e tratamento. Além de análises de sensibilidade. 

A idade média dos participantes nos estudos que avaliaram HbA1c foi de 58,9 ± 10,8 anos, enquanto nos estudos que analisaram MACE, a idade média foi de 64,0 ± 8,6 anos. A amostra total foi composta por 42,3% de mulheres nos estudos de HbA1c e 35,3% nos estudos de MACE. 

Resultados 

Os principais achados do estudo demonstraram que a eficácia dos fármacos variou de maneira significativa conforme a idade dos participantes, enquanto não foram observadas diferenças substanciais entre os sexos.  

Com relação ao controle glicêmico, o uso de iSGLT2 foi associado a uma menor redução da HbA1c com o aumento da idade. Para cada incremento de 30 anos na idade, a redução absoluta da HbA1c foi 0,24% menor na monoterapia, 0,17% menor na terapia dupla e 0,25% menor na terapia tripla.  

Curiosamente, em contraste, os aGLP-1 demonstraram maior eficácia na redução da HbA1c em pacientes mais velhos, com uma redução adicional de 0,18% na monoterapia e 0,24% na terapia dupla para cada incremento de 30 anos na idade. 

Já com relação aos eventos cardiovasculares adversos maiores (MACE), os iSGLT2 conferiram maior proteção cardiovascular em pacientes mais velhos. Para cada aumento de 30 anos na idade, houve uma redução relativa de 24% no risco de MACE (HR: 0,76; IC 95%: 0,62–0,93).  

Já os agonistas de GLP-1, por outro lado, foram mais eficazes na redução de MACE em indivíduos mais jovens. Para cada incremento de 30 anos na idade, observou-se um aumento relativo de 47% no risco de MACE em usuários de GLP-1 RA (HR: 1,47; IC 95%: 1,07–2,02). Não houve diferença estatisticamente significativa entre os sexos em relação à proteção cardiovascular conferida pelos iSGLT2 e aGLP-1s. 

Considerações 

Os achados da metanálise mostram que a idade parece desempenhar um papel importante na modificação dos efeitos terapêuticos dessas classes de fármacos. Os autores da revisão discutem sobre os motivos. O menor efeito hipoglicemiante dos iSGLT2 em idosos pode estar relacionado à redução da função renal associada ao envelhecimento, uma vez que essa classe depende da taxa de filtração glomerular para exercer seu efeito. Em contrapartida, a maior eficácia dos GLP-1 RA no controle glicêmico em idosos pode ser explicada por alterações na sensibilidade à insulina e na resposta das células beta pancreáticas com o avanço da idade. 

A maior cardioproteção dos iSGLT2 em idosos, independentemente do controle glicêmico, reforça o papel pleiotrópico desses fármacos, que inclui benefícios na redução da pré-carga e pós-carga cardíaca, além da melhora da função endotelial. Já a menor eficácia dos aGLP-1 na prevenção de MACE em idosos sugere que os benefícios cardiovasculares dessa classe podem estar mais associados a efeitos metabólicos indiretos, como redução de peso e melhora da função endotelial em indivíduos metabolicamente mais ativos. 

Conclusão e mensagem prática 

Os achados desta metanálise pode trazer implicações diretas para a individualização do tratamento do DM2, especialmente na escolha entre iSGLT2 e aGLP-1 para diferentes perfis de pacientes. Em pacientes idosos, sobretudo de alto risco cardiovascular, os iSGLT2 podem ser a melhor escolha, pois conferem maior proteção cardiovascular, mesmo com menor redução da HbA1c, enquanto em indivíduos mais jovens, especialmente aqueles com obesidade e resistência insulínica, os aGLP-1 podem ser preferíveis, dada sua maior eficácia glicêmica e efeito cardioprotetor mais pronunciado neste grupo. 

No Brasil, onde a prevalência do DM2 está em ascensão e a população idosa cresce rapidamente, os dados reforçam a necessidade de políticas públicas para ampliar o acesso à ambas as classes e pode auxiliar no desenvolvimento de políticas direcionadas de acordo com a faixa etária e meta de tratamento.  

Contudo, vale destacar que a população idosa, sobretudo com mais de 70-80 anos costuma ser sub representada nos grandes trials e há a necessidade de mais ensaios clínicos incluindo tais populações, com o objetivo de se gerar recomendações terapêuticas cada vez mais personalizadas e baseadas em evidências robustas. 

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Referências bibliográficas

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