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Endocrinologia10 janeiro 2025

Empagliflozina reduz risco de progressão da retinopatia diabética?

Estudo avaliou comparativamente a incidência da retinopatia diabética não proliferativa e a progressão da RD entre pacientes que iniciaram o uso da empagliflozina

A retinopatia diabética (RD) é uma das clássicas complicações microvasculares do diabetes (DM), representando a principal causa de cegueira adquirida em adultos em idade produtiva. A progressão dessa complicação ocorre de forma gradual, evoluindo de estágios iniciais de retinopatia diabética não proliferativa (RDNP) para formas mais graves, como a retinopatia proliferativa (RD proliferativa), se não tratada. Dentro do cuidado de indivíduos com DM, é fundamental realizar o rastreio de retinopatia e adotar medidas para prevenir a progressão ou o surgimento dessa condição, dado o impacto significativo na qualidade de vida e nos custos para o sistema de saúde.

Ademais, com o advento de novas terapias para o DM, como os inibidores de SGLT-2, ficou claro que é possível endereçar tanto o controle glicêmico como a prevenção de complicações, uma vez que tanto iSGLT-2 como agonistas de GLP-1 podem trazer benefícios em termos de risco cardiovascular e nefroproteção (no caso dos GLP-1, com a semaglutida especificamente).

Nesse contexto, é interessante avaliar o impacto que novas terapias podem trazer diretamente no surgimento e progressão da retinopatia diabética. Enquanto os agonistas de GLP-1 são “persona non grata” nesse assunto, visto o aumento do risco de piora da retinopatia aventado no estudo SUSTAIN-6 (semaglutida), é importante avaliar o impacto que outras terapias podem ter no controle da retinopatia.

Para isso, foi elaborada uma coorte retrospectiva, publicada recentemente no JAMA, que buscou avaliar comparativamente a incidência da retinopatia diabética não proliferativa (RDNP) e a progressão da RD entre pacientes que iniciaram o uso da empagliflozina ou inibidores da DPP-4 (iDPP4).

Leia mais: Retinopatia diabética: qual é o melhor tratamento para regressão?

O estudo

O estudo foi uma coorte retrospectiva (um estudo observacional), que analisou dados de três grandes bancos de dados de seguros de saúde dos EUA, incluindo o Medicare e outros dois comerciais, no período entre agosto de 2014 e setembro de 2019. A população incluiu pacientes adultos com diabetes tipo 2, sem histórico de retinopatia avançada ou tratamento prévio para complicações oculares mais graves. Para os desfechos, foram considerados dois grupos principais de pacientes:

  • Incidência de RDNP: Incluiu indivíduos sem histórico de retinopatia diabética (n = 34.239 pares).
  • Progressão da RD: Avaliou pacientes com NPDR pré-existente (n = 7.831 pares).

Os grupos foram comparados quanto ao início de empagliflozina e inibidores da DPP-4, utilizando pareamento por escore de propensão, em razão 1:1. Essa abordagem foi fundamental para ajustar diferenças basais entre os dois grupos, como idade, sexo, etnia, uso de insulina, comorbidades (como nefropatia e neuropatia) e outras variáveis relevantes.

Os desfechos primários foram definidos como:

  • Incidência de RDNP: Surgimento de RDNP leve, moderada ou grave
  • Progressão para RD proliferativa: Surgimento de hemorragia vítrea ou necessidade de tratamentos específicos, como injeção de agentes anti-VEGF ou fotocoagulação panretiniana em indivíduos com RDNP prévia.

Para a análise estatística, os modelos Cox de riscos proporcionais foram utilizados para estimar os hazard ratios (HRs), enquanto as diferenças absolutas de taxas (RD) entre os grupos foram calculadas para quantificar o impacto clínico das intervenções.

Quanto à população do estudo, a coorte 1 (para avaliação de incidência de RDNP) apresentou média de idade de 65 anos, sendo 52% homens, 75% brancos, 14% com nefropatia diabética e 22% com neuropatia, com 34% em uso de insulina. Já a coorte 2 (avaliação de progressão da RD) teve média de idade de 67 anos, também composta em 52% por uma população masculina, 67% brancos, 20% com nefropatia diabética e 31% com neuropatia, com 69% em uso de insulina (evidenciando um grupo com DM mais avançado).

Ao final, o tempo médio de seguimento dos pacientes foi de cerca de 8 meses.

A empagliflozina não reduziu a incidência de retinopatia em comparação aos inibidores de DPP-4 

A empagliflozina não reduziu a incidência de retinopatia em comparação aos inibidores de DPP-4. A taxa de incidência foi de 31,14 eventos por 1.000 pessoas/ano no grupo da empagliflozina, comparada a 29,84 eventos por 1.000 pessoas/ano no grupo iDPP4 (HR 1,04; IC 95%: 0,94–1,15).

No entanto, a empagliflozina reduziu o risco de progressão da retinopatia

No entanto, para os pacientes com retinopatia diabética não proliferativa pré-existente (RDNP), os resultados foram mais significativos. O grupo de empagliflozina apresentou um risco significativamente menor de progressão para RD proliferativa em comparação aos iDPP4. O hazard ratio foi 0,78 (IC 95%; 0,63–0,96), com uma redução absoluta da taxa de progressão de -9,44 eventos por 1.000 pessoas/ano (IC 95%; -16,90 a -1,98). Essa diferença se tornou evidente já no primeiro mês de acompanhamento, sugerindo um efeito precoce da empagliflozina na estabilização da progressão da retinopatia diabética​.

Tais achados foram consistentes em múltiplos subgrupos (estratificação por idade, sexo, etnia, comorbidades ou uso concomitante de insulina). As análises de sensibilidade, como a exclusão de usuários de agonistas do GLP-1 ou a limitação do seguimento a 365 dias, reforçaram a robustez dos resultados​.

Veja também: Empagliflozina + Linagliptina: benefícios na prática clínica do diabetes tipo 2

Perspectivas 

Os achados deste estudo fornecem importantes insights sobre o papel da empagliflozina na prevenção da progressão da retinopatia diabética em pacientes com RDNP pré-existente. Enquanto a empagliflozina não demonstrou impacto significativo na incidência da condição, sua associação com uma redução significativa na progressão para RD avançada sugere potenciais benefícios além do controle glicêmico.

Os autores do estudo discutem que um possível mecanismo para esse efeito protetor pode estar relacionado à ação pleiotrópica dos iSGLT2, incluindo a melhoria do ambiente metabólico e hemodinâmico na microvasculatura retiniana, a redução do estresse oxidativo e a preservação da função dos pericitos retinianos, células críticas para a integridade dos capilares​.

Contudo, devemos lembrar que tratou-se de um estudo observacional, onde há risco de viés de confusão residual, apesar do controle realizado através do escore de propensão. Além disso, a duração média do seguimento de 8 meses pode não capturar totalmente os benefícios de longo prazo, sobretudo no quesito incidência de uma nova retinopatia. Ensaios clínicos randomizados serão necessários para confirmar esses achados e esclarecer os mecanismos fisiopatológicos subjacentes.

De toda forma, o estudo traz novas evidências a respeito da empagliflozina como uma opção terapêutica promissora para pacientes com DM2 e retinopatia não proliferativa, especialmente em cenários onde a estabilização da doença ocular é crítica para prevenir complicações mais graves.

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Referências bibliográficas

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