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Endocrinologia27 junho 2025

CARDIAL-MS: proposta brasileira amplia o olhar sobre a síndrome metabólica

CARDIAL-MS é a proposta de um novo conceito que propõe uma reformulação do conceito de síndrome metabólica.
Por Erik Trovão

Em 2023, a American Heart Association já havia proposto o conceito da síndrome cardiovascular-renal-metabólica para descrever a interrelação entre obesidade, diabetes mellitus tipo 2 e síndrome metabólica e o risco de evolução para desfechos cardiovasculares e renais. No entanto, embora a doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD) tenha sido reconhecida como fato de risco, o fígado e sua participação nesta complexa fisiopatologia foi deixado de lado.  

Métodos

Neste contexto, autores brasileiros publicaram recentemente, na Diabetology & Metabolic Syndrome, a proposta de um novo conceito: a CARDIAL-MS (CArdio-Renal-DIAbetes-Liver-Metabolic Syndrome), que propõe uma reformulação do conceito de síndrome metabólica a partir de um modelo integrado e progressivo de acometimento multissistêmico. A proposta CARDIAL-MS abrange as interações entre tecido adiposo disfuncional, deposição ectópica de gordura, sinalização alterada de adipocinas/hepatocinas e suas repercussões em doenças metabólicas, cardiovasculares, renais e hepáticas.  

Resultados

No primeiro estágio do modelo, o ganho de peso leva à adiposopatia — expansão patológica do tecido adiposo — que compromete a capacidade de armazenamento lipídico, favorecendo o acúmulo ectópico de gordura, especialmente visceral. A distribuição da gordura, mais do que seu volume total, é um fator chave para o risco cardiometabólico, com o tecido adiposo gluteofemoral exercendo papel protetor, enquanto o tecido visceral é diretamente relacionado à resistência à insulina (RI), diabetes tipo 2 (DM2) e doenças cardiovasculares (DCV). Estudos genéticos e de imagem confirmam essa associação, reforçando o papel etiológico da adiposopatia na cascata disfuncional subsequente. 

A deposição ectópica de gordura nos órgãos, como fígado (MASLD), pâncreas (esteatose pancreática), coração (esteatose miocárdica) e rins (tecidos perirrenal e do seio renal), gera um quadro de inflamação crônica, disfunção endotelial, estresse oxidativo e fibrose. A MASLD, em especial, é apresentada como um elo central, sendo reconhecida não apenas como marcador, mas como possível causadora de DM2 e DCV. Evidências de estudos observacionais e de randomização mendeliana apontam para um papel causal do acúmulo hepático de gordura na gênese de doença arterial coronariana, reforçando a necessidade de seu reconhecimento clínico precoce. 

O eixo fígado-tecido adiposo-intestino também é explorado no modelo CARDIAL-MS, destacando a relevância da microbiota intestinal e seus metabólitos na modulação da resistência à insulina e inflamação sistêmica. A secreção hepática de hepatocinas — como fetuina-A, DPP4, FGF-21 e ANGPTL3 — participa da mediação de disfunção metabólica, inflamação e comprometimento da função β-pancreática. Tais proteínas podem atuar como biomarcadores e possíveis alvos terapêuticos, embora ainda haja controvérsias quanto à causalidade dessas associações. 

A disfunção renal, tradicionalmente associada a hipertensão e DM2, é também correlacionada à adiposopatia e MASLD, de forma parcialmente independente desses fatores. A gordura perirrenal e do seio renal exerce efeitos mecânicos e inflamatórios, podendo levar à progressão de doença renal crônica (DRC). O modelo propõe o conceito de “tamponamento renal”, em que a expansão de gordura em compartimentos não distensíveis compromete a perfusão renal e ativa o sistema renina-angiotensina, exacerbando lesões glomerulares. 

 Conclusão e mensagem prática

Em síntese, o modelo CARDIAL-MS representa uma evolução do conceito clássico de síndrome metabólica, propondo uma visão sistêmica e contínua da disfunção metabólica, desde alterações subclínicas até a falência multiorgânica. Ao reconhecer a MASLD como eixo central e incluir mecanismos moleculares e genéticos, esse modelo visa facilitar a estratificação de risco e o direcionamento de estratégias preventivas e terapêuticas mais precoces e personalizadas. 

 

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