A Food and Drug Administration (FDA) aprovou o Forzinity (elamipretida) em setembro de 2025, tornando-se o primeiro órgão regulador a autorizar uma terapia específica para a síndrome de Barth. A decisão inaugura uma nova etapa no enfrentamento de uma doença mitocondrial ultrarrara, que até então contava apenas com cuidados de suporte.
Contexto clínico
A síndrome de Barth é um distúrbio hereditário ligado ao cromossomo X que afeta quase exclusivamente indivíduos do sexo masculino. Manifesta-se por cardiomiopatia dilatada, hipotonia, neutropenia e atraso no crescimento, com risco elevado de insuficiência cardíaca já no período neonatal. Infecções recorrentes, fadiga profunda e baixa tolerância ao exercício persistem nos sobreviventes. O tratamento tradicional limita-se ao manejo de sintomas cardiovasculares, antibióticos e suporte nutricional, sem terapias capazes de corrigir a disfunção mitocondrial subjacente.
Mecanismo de ação e indicação
A elamipretida é um peptídeo catiônico que se liga à cardiolipina da membrana mitocondrial interna. Essa interação estabiliza a estrutura da membrana, reduz o estresse oxidativo e favorece a geração de adenosina trifosfato. O medicamento é indicado para melhorar a força muscular em pacientes com síndrome de Barth que pesem trinta quilogramas ou mais. O esquema aprovado consiste em administração subcutânea diária na parede abdominal ou no braço.
Fundamentação da aprovação acelerada
A FDA utilizou o mecanismo de aprovação acelerada devido à ausência de alternativas terapêuticas e ao prognóstico grave da doença. O desfecho utilizado foi o aumento da força do músculo extensor do joelho, mensurado por dinamometria, considerado um marcador razoavelmente preditivo de benefício funcional. Ensaios iniciais mostraram ganho significativo de força, embora não tenham demonstrado melhora clara na capacidade de caminhada nem impacto sobre a sobrevida. A agência determinou a realização de um estudo confirmatório, duplo-cego e controlado por placebo, para verificar se a melhora observada se traduz em benefício clínico significativo.
Evidência clínica disponível
No estudo-chave, vinte e oito pacientes foram randomizados para elamipretida ou placebo durante vinte semanas. Aqueles que receberam elamipretida apresentaram aumento estatisticamente significativo da força do músculo extensor do joelho quando comparados ao grupo placebo. Não houve diferenças importantes em relação à distância percorrida em testes de caminhada nem no consumo máximo de oxigênio. Esses achados sustentaram a autorização condicional, cuja manutenção dependerá dos resultados do estudo confirmatório exigido pela FDA.
Reações adversas e precauções
As reações adversas mais comuns foram dor, eritema e prurido no local da injeção. Também foram relatados cefaleia, náusea e fadiga. Eventos sistêmicos graves foram raros, mas justificam a monitorização clínica e laboratorial periódica. O medicamento é contraindicado em pacientes com hipersensibilidade conhecida à elamipretida. A segurança durante gestação ou lactação não está estabelecida.
Implicações para a prática clínica
A aprovação do Forzinity modifica o cenário terapêutico da síndrome de Barth e exige avaliação criteriosa da elegibilidade dos pacientes, incluindo confirmação molecular do diagnóstico e peso mínimo de trinta quilogramas. É importante esclarecer que a aprovação se baseia exclusivamente em ganho de força muscular, sem evidência de redução de mortalidade ou de melhora global da capacidade funcional. A aplicação subcutânea deve ser orientada de forma adequada e efeitos adversos devem ser monitorados. O manejo continua dependente de abordagem multidisciplinar, integrando cardiologia, genética, nutrição e fisioterapia.
Perspectivas futuras
Algumas questões permanecem sem resposta, como a duração sustentada do efeito da elamipretida e sua eficácia em crianças com peso inferior a trinta quilogramas. Estudos em andamento avaliarão a possibilidade de benefícios clínicos mais amplos, como redução de hospitalizações e impacto na sobrevida. Caso os novos dados demonstrem segurança e eficácia aceitáveis, a empresa pretende solicitar ampliação da faixa etária indicada.
Conclusão
A elamipretida representa um avanço importante ao direcionar-se ao defeito bioenergético central da síndrome de Barth. Apesar do potencial promissor, ainda não existe comprovação de benefício clínico amplo. A vigilância pós-comercialização e a conclusão dos estudos confirmatórios serão essenciais para definir o papel definitivo da elamipretida no tratamento dessa doença rara.
Autoria
Bruno Anello Mottini Horlle
Possui graduação em Medicina pela Universidade Estácio de Sá (2019). Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Medicina de Emergência, e Clinica Médica.
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