A violência contra as mulheres continua sendo uma das crises de direitos humanos mais persistentes e negligenciadas do mundo. Um relatório, divulgado na última semana pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e parceiros da ONU, mostrou que pouco progresso foi feito nas últimas duas décadas para prevenir essa violência. Segundo a pesquisa, uma das formas mais comuns de agressão contra mulheres no mundo é a violência praticada por um marido ou parceiro atual ou anterior, seja física, sexual ou psicológica. Outra forma comum é a violência sexual cometida por alguém que seja um parente do sexo masculino, amigo, conhecido, autoridade ou desconhecido.
Nesse contexto, o relatório traz um dado preocupante que pouco mudou desde 2000: cerca de 1 em cada 3 mulheres — estimadas em 840 milhões globalmente — já passaram por episódios de violência vinda cometida por um parceiro ou violência sexual ao longo da vida. Nos últimos 12 meses, 316 milhões de mulheres foram vítimas de violência física ou sexual por um parceiro.
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Financiamento para o combate à violência contra a mulher
O novo relatório representa o estudo mais abrangente já realizado sobre a prevalência dessa forma de violência. A análise utiliza dados de 2000 a 2023 de 168 países, para revelar uma crise profundamente negligenciada e uma resposta criticamente subfinanciada.
Apesar das crescentes evidências sobre estratégias eficazes para prevenir a violência contra as mulheres, a pesquisa alerta que o financiamento para tais iniciativas está diminuindo. Em 2022, por exemplo, apenas 0,2% da ajuda ao desenvolvimento global foi destinada a programas focados na prevenção da violência contra mulheres e o financiamento caiu ainda mais em 2025.
Consequências ao longo da vida
Mulheres vítimas de violência enfrentam consequências duradouras que afetam toda a vida, como gestações não planejadas, maior risco de contrair infecções sexualmente transmissíveis e de desenvolver depressão. Os serviços de saúde sexual e reprodutiva são fundamentais para auxiliar as sobreviventes na retomada de suas vidas e na luta contra o trauma.
O relatório também mostra que a violência contra a mulher começa cedo. Apenas nos últimos 12 meses, 12,5 milhões de adolescentes meninas entre 15 e 19 anos sofreram violência física e/ou sexual por um parceiro íntimo.
Embora existam casos desse tipo de violência em todo o mundo, as mulheres em contextos sociais menos desenvolvidos têm maior probabilidade de serem afetadas. Um exemplo é a Oceania (excluindo Austrália e Nova Zelândia) que registrou prevalência de 38% de violência por parceiro íntimo no último ano, mais de três vezes a média global de 11%.

Panorama Brasileiro da violência contra as mulheres
No Brasil, os números não são muito diferentes. Uma pesquisa recente feita pelo DataSenado revelou que 3,7 milhões de brasileiras sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar em 2025.
Além disso, os resultados acendem um alerta: a maioria das agressões ocorreu na presença de outras pessoas. Das vítimas de violência no último ano, 71% relataram que crianças estavam presentes no momento da agressão, em grande parte seus filhos e filhas.
Os dados mostram ainda que a violência costuma ser recorrente. Quase 6 em cada 10 mulheres relatam que as agressões ocorrem há menos de seis meses, enquanto 21% afirmam conviver com episódios há mais de um ano.
Medidas para prevenção
Cada vez mais países estão buscando embasar políticas de prevenção contra a violência, porém, lacunas significativas permanecem, especialmente sobre violência sexual cometida por não parceiros, sobre grupos marginalizados, como mulheres indígenas, migrantes e mulheres com deficiência, além de dados de contextos frágeis e humanitários.
Países como Equador, Libéria e Uganda desenvolveram planos de ação nacionais. Medidas legislativas e de advocacy nesses países contribuíram para algum financiamento doméstico para essa pauta, sinalizando maior compromisso político.
No Brasil, em 2023, o Governo Federal lançou o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios. O programa tem como objetivo prevenir todas as formas de discriminação, misoginia e violência de gênero contra mulheres e meninas, por meio da implementação de ações governamentais intersetoriais, com a perspectiva de gênero e suas interseccionalidades.
Embora ações estejam sendo feitas para acelerar o progresso global e promover mudanças reais na vida das mulheres afetadas, o relatório pede ações governamentais decisivas e financiamento para ampliar programas de prevenção, fortalecer serviços de saúde centrados nas sobreviventes, aplicar políticas de empoderamento e mais.
*Este artigo foi revisado pela equipe médica do Portal Afya.
Autoria

Redação Afya
Produção realizada por jornalistas da Afya, em colaboração com a equipe de editores médicos.
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