Mesmo com a chegada de uma nova tecnologia, não significa que as tecnologias antigas ficarão sobressalentes ou desnecessárias. Até hoje utilizamos rotineiramente na medicina radiografias simples e estetoscópios, talvez estes os dois principais símbolos da atividade médica.
A plataforma robótica auxilia em diversos aspectos, porém não em todos, e o uso da plataforma robótica está associada a maiores custos e tempo operatório. Devemos saber medir onde os benefícios da robótica se encaixam melhor, e isto nem sempre é simples. Apenas o relato do cirurgião achando que é melhor operar por robótica não é suficiente. O trabalho publicado na JAMA Surgery, busca justamente retirar ao máximo algum viés que possa atrapalhar a interpretação dos benefícios da cirurgia robótica.
Métodos
Estudo que visou avaliar a superioridade da cirurgia robótica, com a laparoscópica, em um ensaio randomizado não cego, na proporção de 1:1 entre cirurgia robótica e cirurgia laparoscópica. Como critério de inclusão tumores de reto médio e reto baixo, em pacientes entre 18 e 80 anos. Também foi determinado que só seriam incluídos tumores sem invasão local (ou seja, T3 ou menos) e sem metástase. As cirurgias foram realizadas de forma padronizada por cirurgiões com grande experiência e envolvia a excisão mesorretal.
Foi determinado como desfecho primário, a recorrência loco regional em 3 anos. Também foram avaliadas a sobrevida total e livre de doença, e disfunções orgânicas incluindo disfunções sexuais.
Resultados
Foram coletados dados para o estudo pacientes operados entre julho de 2016 e dezembro de 2020, perfazendo 620 pacientes em cada grupo, porém para análise 586 no grupo robótico e 585 no grupo laparoscópico com idade média de 59,1 anos e 60,7 anos respectivamente. O tempo de observação média foi semelhante entre os dois grupos, 43 meses. A distribuição entre reto médio e reto baixo foi semelhante entre os dois grupos.
Em relação ao desfecho primário, 9 (1,5%) do grupo robótico e 23(3,9%) do grupo laparoscópico apresentaram recidiva locoregional, que representa uma razão de risco de 0,45 (IC 0,22-0,92; p=0,03) em favor da robótica. O baixo número de eventos em ambos os grupos, pode diminuir o poder estatístico desta análise. Na análise de subgrupos envolvendo critérios como IMC, localização tumoral e até o cirurgião que realizou, não houve diferença significativa, o que deixa mais consistente o benefício da plataforma robótica em diferentes cenários.
Na análise de tempo livre de doença, os pacientes com tumores de reto baixo apresentaram em 3 anos de análise 86,2% sem doença na plataforma robótica, enquanto na cirurgia laparoscópica 77,6% estavam livres de doença, o que representa um risco relativo 0,55 (IC 0,38-0,81), em favor da robótica. Esta mesma análise nos pacientes com tumores de reto médio não apresentou nenhuma diferença estatística. Interessante também notar que os pacientes do grupo robótico apresentaram melhores taxas de disfunção urinária e sexual, tanto em pacientes do sexo masculino quanto feminino.
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Discussão
Este estudo analisou a taxa de recorrência local em tumores reto baixo e médio após cirurgia robótica x laparoscópica e estabeleceu melhores resultados após a cirurgia robótica, e além disto o tempo de sobrevida livre de doença, especialmente nos tumores baixos, foi melhor com o auxílio da plataforma robótica.
Este é um dos primeiros ensaios clínicos randomizados, que analisam especificamente os benefícios da cirurgia robótica em relação a laparoscópica para tumores de reto baixo e médio. Outras metanálises determinaram uma melhor sobrevida global em relação ao uso da plataforma robótica, porém não determinavam o motivo da melhora da sobrevida. Este estudo demonstrou que pacientes, operados com auxílio da plataforma robótica, apresentaram melhores taxas de recidiva local e também maior intervalo livre de doença.
Em conclusão, a utilização da plataforma robótica oferece um melhor controle da doença a longo prazo, tanto por melhora da recidiva local, como pelo intervalo livre de doença
Para levar para casa
São estudos assim que auxiliam na determinação da prática médica. Fornecer o que é mais apropriado ao seu paciente é fundamental e vai muito além de uma opinião pessoal. A randomização nos auxilia a diminuir o viés de seleção. Vale a pena ressaltar que talvez para tumores de reto mais alto o resultado pode ser distinto desse estudo.
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