Uma das lesões mais temidas de enfrentar, principalmente nos primeiros anos de carreira médica, são lesões de laringe, especialmente as penetrantes, causadas por arma de fogo e arma branca. Felizmente essas lesões são raras e representam cerca de 0,1% de todos os pacientes atendidos em centros de traumas.
A avaliação do trauma é o primeiro quesito nas diretrizes do atendimento ao politraumatizado. Garantir a via aérea é primordial. Entretanto, em lesões de laringe, ainda há muito o que fazer, dependendo da gravidade, após o estabelecimento das vias aéreas e estabilização do paciente.
Um estudo retrospectivo publicado em um centro de trauma americano, avaliou e comparou intervenções em traumatismos penetrantes de laringe. O estudo foi publicado em 2025 e auxilia no entendimento de condutas em casos de lesões de laringe.

Métodos
Estudo retrospectivo realizado em hospital de trauma americano, avaliou condutas e resultados de pacientes vítimas de trauma penetrante de laringe atendidos entre 2012 e 2022.
O desfecho primário foi a decanulação da traqueostomia, que foi definida como ausência de traqueostomia na última consulta de acompanhamento. Os desfechos secundários englobaram o tempo de remoção de stents laríngeos, período até a decanulação da traqueostomia, tempo até a retirada de sonda para dieta enteral, funcionalidade vocal (registrada como presença ou ausência de afonia ou disfonia na última consulta de acompanhamento) e período de internação hospitalar.
Os autores compararam intervenções clássicas, como a redução aberta com fixação interna com procedimentos endoscópicos ou outros tipos de intervenção.
Resultados
Foram incluídos no estudo 32 pacientes, com idade média de 35 anos, dentre os quais 31 (97%) eram homens. A maioria (81%) tiveram lesões por arma de fogo e, 19%, por arma branca. 44% tiveram lesões em várias partes da laringe, 38% na tireoide. A maior parte dos pacientes (69%) apresentaram lesões graves, representados, de acordo com a classificação de Schaefer-Fuhrman por grau 3, 4 ou 5. 31% dos pacientes apresentaram lesões Schaefer-Fuhrman grau 1 e 2, que são lesões não tão graves.
Dentre os 10 pacientes (31%) com lesões grau 1 e 2, seis foram intubados, mas não precisaram de traqueostomia. Dentre esses, 1 foi submetido a laringoscopia para avaliação da lesão, sem outras intervenções, e 1 foi submetido a reconstrução da tireoide com retalho muscular. 4 pacientes foram submetidos a traqueostomia e todos foram, posteriormente, decanulados, com média de 16 a 114 dias após o procedimento. Apensas 2 desses 10 pacientes com lesões grau 1 e 2 precisaram de sonda para dieta enteral com retirada posterior em ambos.
Em relação aos pacientes com lesões graves, 22 (69%) apresentaram lesões grau 3, 4 ou 5 (18 por arma de fogo e 4 por arma branca). Dentre os pacientes com lesões graves, 81% necessitaram de traqueostomia e, desses, 17 (94%) precisaram de intervenções adicionais como laringoscopia (39%), stent laríngeo (17%), redução aberta com fixação interna (11%), procedimentos combinados como stents e fixação interna, ou reconstrução com retalho muscular.
Em relação aos desfechos nos pacientes graves, em 91% dos casos foi possível a decanulação da traqueostomia e retomo da alimentação oral. Todos os pacientes obtiveram voz funcional na última consulta de acompanhamento, exceto dois pacientes que não conseguiam falar por razões neurológicas.
Discussão
A classificação de Schaefer-Fuhrman foi introduzida entre 1980 e 1990, inicialmente para traumas fechados e, posteriormente adaptada para traumas abertos. Varia entre grau 1 a 5, sendo 3 ou mais considerados lesões graves.
Classicamente, lesões graves são tratadas com redução aberta e fixação interna. No entanto, os autores do presente estudo conduziram a maior parte dos casos de lesões graves sem tal abordagem, mostrando resultados semelhantes em abordagens mais conservadoras. Lesões grau 5, que cursam com rotura completa da traqueia, requerem, obrigatoriamente, algum tipo de intervenção cirúrgica.
O que podemos levar para casa?
O manejo de lesões penetrantes da laringe é complexo e envolve várias abordagens como traqueostomia, laringoscopia, passagem de sonda nasoentérica, redução aberta com fixação interna e rotação de retalhos para reconstrução da cartilagem lesada. Intervenções endoscópicas ou outros procedimentos menos invasivos podem ter resultados semelhantes à redução aberta com fixação interna.
É importante lembrar que o primordial nesses casos é o atendimento inicial com estabelecimento da via aérea e estabilização do paciente. Todo o tratamento posterior, apesar de relevante, depende de uma abordagem inicial correta e bem conduzida.
Autoria

Jader Ricco
Graduado pela UFMG ⦁ Membro do corpo clínico do Oncoclínicas Cancer Center ⦁ Cirurgião Oncológico no Instituto de Oncologia da Santa Casa ⦁ Cirurgião Oncológico e preceptor de cirurgia Geral na Santa Casa de Belo Horizonte e Hospital Vila da Serra.
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