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Cirurgia13 setembro 2025

Risco de câncer de tireoide em sobreviventes de outros cânceres

Estudo com dados SEER mostra maior incidência de câncer de tireoide em pacientes com histórico de neoplasia prévia.

Câncer de tireoide (CT) é um dos cânceres mais comuns e sua incidência tem aumentado nos últimos anos. Esse aumento de incidência tem sido observado em pacientes sobreviventes de outros cânceres não relacionados à tireoide. 

Há evidências de que essa associação positiva possa ter um componente genético em comum para alguns casos. Um estudo com grande coorte de pacientes identificou aumento da incidência de CT em pacientes com câncer de mama e vice-versa. Outro estudo nessa população específica identificou, na presença de mutação de CHEK2, o risco-relativo de CT aumenta para 3 a 9 vezes. 

A hipótese de que o próprio tratamento oncológico possa estar relacionado ao CT já foi explorado por diferentes estudos. Radioterapia para tratamento de outros tumores na infância já é reconhecido como um fator de risco para CT e estudos sugerem que quimioterapia também possa estar associado a CT apesar de outros não encontrarem a mesma associação. 

O objetivo do estudo publicado em 2024 na Scientific Reports, umas das revistas científicas mais citadas nos últimos anos, realizado por Yuan et al foi analisar o impacto de cânceres prévios e de seus tratamentos na incidência e prognóstico do câncer de tireoide, utilizando os registros populacionais do Programa SEER dos Estados Unidos. 

Veja também: Qual o exame mais acurado para avaliação de metástase no câncer papilar de tireoide?

cancer de tireoide

Materiais e Métodos 

Estudo de coorte retrospectiva sendo utilizados dados do software SEER*STAT, com informações coletada no período de 1975 a 2019, representando aproximadamente 8,3% da população dos Estados Unidos.  

Os pacientes foram incluídos em dois grupos distintos: um com pacientes com câncer de tireoide primários e sem histórico de outras neoplasias e outro grupo com pacientes com de câncer de tireoide como segundo tumor primário (CTSP). 

Foram excluídos pacientes com intervalo inferior a 6 meses entre os dois diagnósticos de neoplasia, ausência de registro sobre quimioterapia e radioterapia ou falta de informações sobre sobrevida e tempo de seguimento.  

Foram analisados no grupo CTSP os sítios dos cânceres primários, o tempo desde o diagnóstico do tumor primário e o diagnóstico de CT, idade ao diagnóstico da neoplasia inicial e do CT, os tratamentos iniciais para o tumor primário e posteriormente analisado a sobrevida em relação ao tumor primário de tiroide. 

As características demográficas e clínico-patológicas foram analisadas em ambos os grupos e comparadas. O tempo de sobrevida do câncer de tireoide específica foi calculada da data de diagnóstico do mesmo até óbito. 

Foram calculados as Razões de Incidências Padronizadas (SIRs) dividindo o número de casos observados pelo número esperado com base na população de referência. As taxas foram expressas por 100.000 pessoas e ajustadas por idade segundo a população padrão dos Estados Unidos no ano 2000. Um SIR >1,0 indica ocorrência de eventos observado em número superior ao esperado. 

Resultados e discussão 

De 1975 a 2019, foram registrados 83.113 pacientes com CT primário. O score de propensão na população natural foi de 0,94/10.000, com prevalência de 1,36/10.000 mulheres, 0,5/10.000 em homens, 0,37/10.000 antes dos 35 anos de idade e 1,49/10.000 após 35 anos de idade. 

No grupo CTSP foram incluídos 7009 pacientes. O SIR de câncer de tireoide secundário no paciente com tumor prévio foi de 1,51/10.000, estatisticamente maior que a população natural (P<0,05). 

Os cânceres mais prevalentes antes do diagnóstico de CT no grupo CTSP foram câncer de mama, melanoma e câncer de próstata. O sítio primário também influenciou o risco de CTSP, maior risco foi identificado para pacientes com quadros prévios de leucemia linfocítica aguda (3,49/10.000), linfoma de Hodgkin (3,29/10.000), tumor de glândulas salivares (3,23/10.000) e câncer de rim e pelve renal (3,05/10.000).  

O menor intervalo de tempo entre o diagnóstico do tumor primário e o de câncer de tireoide foi para câncer de pulmão e brônquios, com 54,95% dos pacientes sendo diagnosticados com câncer de tireoide no primeiro ano após o diagnóstico de câncer de pulmão e brônquios. No outro extremo o intervalo médio entre o diagnóstico de linfoma Hodgkin e câncer de tireoide foi 16 anos. 

Características epidemiológicas, clínico-patológicas e tratamento com quimioterapia ou radioterapia isoladamente não tiveram efeito significativo na incidência de CTSP de forma geral. Apenas a idade do diagnóstico da neoplasia primária menor que 25 anos teve impacto em maior incidência de CTSP (3,14/10.000). 

A incidência de CT foi significativamente maior para pacientes que receberam radioterapia ou quimioterapia associado a idade de diagnóstico da neoplasia primária antes dos 35 anos de idade, mas esse efeito não foi observado em idades superiores. Entre esses pacientes com menos de 35 anos de idade as neoplasias mais frequentes foram linfoma Hodgkin, melanoma cutâneo, câncer de mama, câncer cerebral e câncer de testículo. 

Para os pacientes do grupo CTSP a média de idade ao diagnóstico do tumor primário foi de 54,02 anos e a média de intervalo entre este e o CT foi de 92,37 meses. 

A idade de diagnóstico do CTSP foi maior em comparação aos diagnósticos de CT primários (64,01 vs. 49,55 anos, p<0,001), assim como a proporção homens e mulheres (33,80% vs 24,75%, p<0,001).  O grupo CTSP também apresentou maior incidência de tumores histológicos grau 3/4 (23,14% vs 15,19%, p<0,001) e a proporção de estágios T4 e M1 também foi ligeiramente maior. Em relação ao tratamento também mostrou mais casos de doença avançada onde não realizou cirurgia com ressecção completa (11,88% vs 5,44%, p<0,001). 

O média de tempo de seguimento foi de 110 meses para todos os cânceres de tireoide e as taxas de mortalidade específica para câncer de tireoide de 10 e 20 anos foi de 4,59% e 6,18%, respectivamente.  

Pela análise de Kaplan-Meier o grupo de CTSP foi de pior prognóstico (p<0,001). Quando ajustado para fatores críticos de confusão o trabalho encontrou desfechos de sobrevida semelhantes entre os dois grupos (p=0,584).  

A comparação de sobrevida global entre os dois grupos não foi feita devido a magnitude de impacto negativo da neoplasia primária na sobrevida do grupo CTSP, não sendo, portanto, sobrevida comparáveis. 

Mensagem prática 

O elegante estudo realizado indicou que os pacientes que sobreviveram a um primeiro tumor apresentam maior risco de desenvolver câncer de tireoide em comparação à população em geral, dado já demonstrado em outros estudos sobre o tema.  

O achado de associação de radioterapia e quimioterapia em idade menor que 35 anos e aumento de risco de câncer de tireoide também encontra respaldo em outros trabalhos que encontraram a mesma associação, sendo descritos aumento de risco quando do uso de radioterapia de até 15-53 vezes em comparação à população geral. 

A evidências desse estudo servem de base para os serviços oncológicos organizarem um seguimento clínico mais abrangente aos pacientes com histórico de neoplasia prévia, notadamente câncer de mama, melanoma cutâneo, próstata, linfoma Hodgkin e leucemia linfocítica aguda.  

A comparação de sobrevida global entre os dois grupos não foi feita devido à magnitude de impacto negativo da neoplasia primária na sobrevida do grupo CTSP e ao ótimo prognóstico do câncer de tireoide primário, não sendo conceitualmente comparáveis.  

A análise da sobrevida câncer de tireoide especifica não apresentou diferença estatisticamente significante entre os dois grupos, sugerindo que subtratamento e supertratamento não devem ser realizados, cabendo a individualização de cada caso. 

Os mecanismos desse aumento de risco ainda são não completamente conhecidos criando perspectivas de novos estudos para responder essas questões, apesar de avanços em estudos sobre susceptibilidade genética, hormônios e exposição à radiação. 

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Referências bibliográficas

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