A gastroparesia é a complicação com maior impacto no prolongamento da internação hospitalar após cirurgias pancreáticas. Sabemos que as causas são multifatoriais e isto dificulta ainda mais a interpretação.
Um trabalho publicado pela Annals of Surgery busca através de uma metanálise tentar encontrar respostas sobre causas e/ou soluções para a gastroparesia após uma pancreatectomia.
Métodos
Revisão sistemática, que inclui diversos artigos sobre pancreatectomias, definiu-se como desfecho primário a presença de gastroparesia, e como desfecho secundários estratégias para tratar e/ou mitigar esta condição.
Resultados
Ao total foram incluídos 152 ensaios clínicos randomizados que perfizeram um total de 22.260 pacientes. A taxa de gastroparesia variou entre os estudos de 1,2% a 60,5% com uma média de 17,2%. Houve uma grande variação entre o tipo de pancreatectomia, sendo que as pancreatectomias distais apresentavam uma taxa de 4,2% enquanto as duodenopancreatectomias 12,8%. Uma análise interessante foi que os estudos que tinham a gastroparesia como desfecho primário, apresentavam uma maior taxa (14,6% x 10,8%; p<0,005).
Uma análise do perfil dos pacientes demonstrou que pacientes mais idosos, com maior IMC e bilirrubina elevada, apresentavam uma maior chance de gastroparesia. Além disso, achados cirúrgicos como ductos pancreáticos menores que 5 mm e o tipo de anastomose gastro também poderiam influenciar. Assim 7 critérios preencheram dados que puderam ser comparados:
Pancreatojejunal x pancreatogastroanastomose
Esses dois tipos de anastomose não demonstraram diferença estatística em relação a gastroparesia 1,13 RC (CI 95% 0,74–1,70), P= 0,58)
Preservação pilórica ou sem preservação
Ao total 4 ensaios clínicos possuíam este dado para ser comparado, e ao final não apresentou diferença dos dados. RC 0,74 [CI: 95% 0,34–1,61], P= 0,45)
Retrocólica x Anticólica
A passagem da alça pelo mesocólon não demonstrou diferença de incidência de gastroparesia . 1,23 (CI 95%0,83–1,84), P= 0,31
Reconstrução com Y-de-roux ou Billroth
Não houve diferença estatística nos artigos apresentados RC 1.83 [CI 95% 0.76–4.42], P= 0,18
Cirurgia minimamente x convencional
Somente três ensaios clínicos preencheram critérios para a análise e foi possível demonstrar um benefício da técnica minimamente invasiva para pancreatectomias distais quando comprada a pancreatectomias distais abertas. RC 0,32 (CI 95% 0,12–0,88), P= 0,03].
Utilização do protocolo ERAS
Nos dois ensaios que foram possíveis fazer esta análise não foi possível identificar dados estatísticos que favorecessem um dos lados. RC 1,00 (CI 95% 0,40–2,48), P= 0,99.
Discussão
Essa metana-análise verificou diversos fatores que poderiam estar alterando o desfecho de gastroparesia após pancreatectomias, uma comorbidade frequente tanto em duodenopancreatectomias quanto nas pancreatectomias distais. Diversas foram as estratégias para tentar mitigar o efeito da gastroparesia, tanto referente a técnica como ações não relacionados à cirurgia diretamente. O único fator que demonstrou um real benefício foi o uso da pancreatectomia distal realizada por cirurgia minimamente invasiva.
A gastroparesia não é apenas uma complicação relacionada a custos e aumento do tempo de internação. Um paciente com gastroparesia pode ter sua terapia adjuvante atrasada por conta da internação prolongada e/ou não possuir um estado nutricional adequado que permita a realização da quimioterapia.
Novos estudos têm demonstrado uma tendência da dosagem do GLP-1 como um biomarcador de gastroparesia, que em pacientes com estas condições está baixo no período pós prandial.
A gastroparesia é multifatorial e apesar de diversas teorias aventadas e possíveis mecanismos de diminuir a incidência, continua com uma alta prevalência e com difícil manejo.
Para levar para casa
Ainda estamos longe de definir a causa real da gastroparesia após cirurgias do pâncreas. Vimos neste trabalho que diversos “truques” e alteração da técnica não apresentaram o resultado esperado, demonstrando a complexidade do assunto. Porém mais uma vez se demonstrou o benefício da técnica minimamente invasiva.
Autoria

Felipe Victer
Editor Médico de Cirurgia Geral da Afya ⦁ Residência em Cirugia Geral pelo Hospital Universitário Clementino fraga filho (UFRJ) ⦁ Felllow do American College of Surgeons ⦁ Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões ⦁ Membro da Sociedade Americana de Cirurgia Gastrointestinal e Endoscópica (Sages) ⦁ Ex-editor adjunto da Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (2016 a 2019) ⦁ Graduação em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
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