A nova série do Portal Afya, “Dissecando Temas Cirúrgicos”, traz os assuntos mais debatidos e polêmicos da prática cirúrgica, com foco nos temas que frequentemente aparecem nas provas de residência e no Revalida. Confira a série completa e fique por dentro das principais discussões em cirurgia!
Em mais uma postagem da série, Jader Ricco, cirurgião oncológico e conteudista do Portal Afya, destaca as atualizações no manejo de tumores desmoides.
Tumores desmoides são neoplasias raras, localmente agressivas, com crescimento infiltrativo, mas sem potencial metastático, que correspondem a proliferação monoclonal de fibroblastos. Representam menos de 3% de todos os tumores de partes moles e têm incidência anual estimada em 2 a 4 casos por milhão.
Acomete a população mais jovem, com predominância no sexo feminino e pode ocorrer em qualquer parte do corpo. Apesar de a maioria dos casos surgir ao acaso, os tumores desmoides também podem estar relacionados com síndromes com pré-disposição ao câncer, como a polipose adenomatosa familiar (PAF) e a síndrome de Gardner.
O tratamento vem mudando com os avanços da medicina. No passado, a cirurgia era o tratamento primordial. Nos últimos 20 anos novas modalidades vêm sendo aplicadas como técnicas radioablativas, radioterapia e terapia sistêmica.
Cirurgia
No passado o tratamento primordial dos tumores desmoides era a cirurgia. Entretanto, atualmente, as indicações cirúrgicas são direcionadas e associadas a vários fatores como tamanho, localização e sintomas.
Um dos fatores responsáveis por mudar tal prática era a frequência de margens positivas, que chegavam até a 40% mesmo em centros especializados. O Desmoid Tumor Working Group (DTWG) publicou em 2015 diretrizes no tratamento de tumores desmoides que incluíam também tratamentos expectantes. Essas diretrizes foram atualizadas em 2020 e 2024. O DTWG divide os tumores desmoides de acordo com a localização em 5 grupos: parede abdominal, intra-abdominal/retroperitoneal, extremidade/cintura/parede torácica, intratorácica e cabeça/pescoço.
Para tumores de parede abdominal, as indicações podem ser cirurgia, terapias ablativas e sistêmicas. Pode ser necessário cirurgias agressivas e mutilantes, com reconstruções complexas e, por isso, outras terapias devem ser avaliadas antes de se indicar a cirurgia como primeira conduta.
O DTWG recomenda cautela nos tumores intra-abdominais e retroperitoneais devido à alta morbidade da cirurgia nesses casos. As indicações cirúrgicas são, basicamente, para tumores associados a PAF.
Nos tumores de extremidades, cinturas ou parede torácica, dor neuropática e comprometimento da função motora pode estar associado. Nesses casos, o tratamento recomendado é terapia medicamentosa e terapias ablativas locais, sendo a cirurgia uma opção secundária para o tratamento.
Para tumores de cabeça e pescoço as evidências são limitadas e a conduta expectante é uma alternativa e, quando necessário, terapia medicamentosa pode ser usada. A cirurgia nesses casos só está indicada após falha dessas modalidades.
Tratamentos não cirúrgicos
A radioterapia ainda tem papel incerto e pode ser considerada para lesões próximas a órgãos críticos (medula espinhal, rim) e tumores refratários a outras intervenções, como terapia sistêmica.
Os tratamentos realizados por radiologia intervencionista vêm ganhando espaço devido a vantagens como menor morbidade, recuperação mais rápida e eficácia semelhante à ressecção cirúrgica em muitos locais. As técnicas mais usadas são ablação térmica, embolização transarterial e ultrassom de alta frequência. Dentre esses, a crioablação percutânea é o mais usado, com eficácia tanto no controle local da doença quanto no tratamento dos sintomas como dor neuropática.
No que se refere às terapias sistêmicas, podem ser utilizados tratamentos hormonais, anti-inflamatórios não esteroidais e quimioterápicos. No entanto, os estudos são poucos e não existe um consenso já uniformemente estabelecido. Por outro lado, estudos com inibidores da tirosina quinase estão vendo potenciais benefícios no controle e regressão da doença. Existem também tratamentos como o Nirogacestat que, apesar de já aprovado nos Estados Unidos e com potenciais resultados, ainda não foi aprovado pela Anvisa no Brasil.
Mensagem prática
O tratamento dos tumores desmoides é complexo e a decisão envolve equipe multidisciplinar. Em um direcionamento de conduta, o manejo adequado se iniciaria pelo diagnóstico preciso da doença.
Atualmente a conduta expectante é a abordagem preferida para tumores assintomáticos ou com sintomas mínimos e localização não crítica.
Para lesões sintomáticas, com crescimento potencial ou risco de danos significativos, alguma modalidade de tratamento ativo deve ser introduzida e, nesses casos a terapia sistêmica é preferível. Em casos selecionados, controle local pode ser indicado, devendo ser priorizado abordagens menos invasivas, como radiologia intervencionista e radioterapia. A cirurgia também pode ser indicada, mas vale ressaltar que, atualmente, essa modalidade deve ser preterida quando outros tratamentos forem possíveis.
Autoria

Jader Ricco
Graduado pela UFMG ⦁ Membro do corpo clínico do Oncoclínicas Cancer Center ⦁ Cirurgião Oncológico no Instituto de Oncologia da Santa Casa ⦁ Cirurgião Oncológico e preceptor de cirurgia Geral na Santa Casa de Belo Horizonte e Hospital Vila da Serra.
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