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Cirurgia19 junho 2025

Bisturi harmônico versus ligadura convencional em tireoidectomias

Avanços na hemostasia cirúrgica transformam a tireoidectomia, com impactos na segurança e recuperação do paciente.

A hemostasia rigorosa durantes a tireoidectomia possibilita a adequada visualização do campo cirúrgico, evitando lesões inadvertidas do nervo laríngeo, paratireóides e demais estruturas anatômicas locais. Outra finalidade do rigor hemostático é a prevenção de hematomas cervicais pós-operatórios e suas complicações ameaçadoras à vida. 

Esse preceito de controle hemostático advém do final do século XIX quando Albert Theodor Billroth padronizou a tireoidectomia e Emil Theodor Kocher propôs dois tempos cirúrgicos fundamentais distintos envolvendo inicialmente a ligadura das artérias tireoideanas e então a ressecção da glândula, com o emprego de clampeamento de vasos, corte e ligadura dos cotos por fios (CL).  

A introdução de dispositivos de energia sem sutura (DESS), uma evolução técnica do CL, ocorreu mais recentemente e combina pressão e energia aplicada às paredes dos vasos de médio calibre e subsequente secção deles. Os DESS diminuem o tempo total do procedimento e a propagação de energia térmica às estruturas adjacentes, permitindo melhora do desfecho dos pacientes, menor tempo de recuperação pós-operatória e provaram ser custo-efetivo para os serviços que os utilizam. 

A proposta do autor desse estudo foi a realização de uma metanálise e revisão sistemática incluindo apenas estudos clínicos randomizados (RCT) para avaliar a segurança e eficácia de DESS de segunda geração, bisturi harmônico FOCUS (DESS-FOCUS) em comparação à CL. 

Gastro

Materiais e Métodos 

Estudo analisou RCTs, envolvendo pacientes submetidos à tireoidectomia parcial ou total, utilizando DESS – FOCUS comparado à utilização CL, incluindo uso de bisturi bipolar e eletrocautério nesse braço do estudo.  

Desfechos primários avaliados foram paralisia permanente de nervo laríngeo superior e nervo laríngeo recorrente inferior, hipocalcemia permanente e reoperação devido a sangramentos. 

Desfechos secundários avaliados foram paralisia transitória de permanente de nervo laríngeo superior e nervo laríngeo recorrente inferior, hipocalcemia transitória, infecção de ferida operatória, hematoma e seroma cervical, tempo operatório e duração de estadia hospitalar pós-operatória. 

Resultados e discussão 

Foram inicialmente selecionados 645 artigos, após exclusão de duplicados e aplicados os critérios de eligibilidade foram selecionados 43 RCTs envolvendo um total 10.361 pacientes, sendo 5.152 (49%) DESS-FOCUS e 5.209 (51%) CL. A idade variou de 18 a 79 anos e 72% eram mulheres. 

Desfechos primários 

Para os desfechos primários analisados não houve nenhuma evidência de benefício do uso de DESS-FOCUS em comparação ao uso de CL.   

A paralisia permanente de nervo laríngeo inferior, definido por identificação clínica ou por laringoscopia 6 meses após a cirurgia, foi avaliada por 31 RCTs, ocorrendo em 0,57% dos pacientes do DESS-FOCUS versus 0,67% dos pacientes CL (RR 1,11, 95% CI 0,51-2,42). 

Hipocalcemia permanente definida por necessidade de reposição de cálcio ou cálcio sérico < 8mg/dl após 6 meses da cirurgia. Desfecho avaliado por 32 RCTs, ocorrendo em 0,92% do braço DESS-FOCUS versus 1,26% braço CL (RR 0,80, 95% CI 0,50-1,28). 

Paralisia permanente do nervo laríngeo superior, definido por identificação clínica ou por laringoscopia 6 meses após a cirurgia. Desfecho avaliado por 3 RCTs, ocorrendo em 0,9% dos casos DESS-FOCUS versus 0,5% dos casos CL (RR 1,56, 95% CI 0,27-9,14). 

Sangramento pós-operatório necessitando reoperação ocorrendo em 0,21% dos casos DESS-FOCUS e 0,73% dos casos CL (RR 0,47, 95% CI 0,14-1,58).  

Desfechos secundários 

Para os desfechos secundários houve demonstração de evidência de benefício para uso de DESS-FOCUS para evitar paralisia transitória de nervo laríngeo inferior (RR 0,79, 95% CI 0,63-0,99), hipocalcemia transitória (RR 0,67, 95% CI 0,56-0,81), menor tempo operatório (redução média de 27,62 minutos p=0,00001) e tempo de internação (redução média de 0,83 dias, 95% IC -1,10 a -0,56). Não sendo identificado benefício para os demais desfechos secundários avaliados, com especial atenção a hematoma cervical (RR 0,48, 95% IC 0,21-1,07).  

Discussão e Impacto na Prática Clínica 

A revisão sistemática e metanálise foi bastante abrangente e contou com bom número de RCTs, analisando uma grande quantidade de pacientes e avaliou diferentes desfechos pertinentes à prática clínica.  

O benefício do uso de DESS-FOCUS comparado ao CL foi identificado e limitado a alguns desfechos secundários, mas impactantes ao paciente e à equipe cirúrgica, como a hipocalcemia e a paralisia de nervo laríngeo inferior transitórias.  

Para a prática clínica a diminuição do tempo de procedimento e de internação identificadas devem ser analisadas em perspectiva ao custo desses dispositivos ao sistema de saúde que o paciente está inserido. 

Portanto há algum benefício ao uso dos DESS-FOCUS, devendo sempre pesar o seu custo e considerar que tais dispositivos não permitem abandonar por completo o uso do CL para os desfechos primários analisados. 

 

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Referências bibliográficas

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