A síncope é um problema comum na população idosa, com uma incidência que aumenta para 81,2/1000 pessoas-ano em indivíduos com ≥ 80 anos de idade. A etiologia mais comum é a síncope reflexa, causada por ativação anormal dos centros vasomotores cerebrais, que resulta em vasodilatação e/ou bradicardia. A classificação modificada do Estudo Internacional de Síncope Vasovagal (VASIS) diferencia três tipos: resposta mista, cardioinibitória e vasodepressora. Outras causas de síncope incluem distúrbios cardiovasculares e hipotensão ortostática. Como a síncope em pacientes idosos é frequentemente um problema multifatorial, encontrar a causa nem sempre é tão direto quanto em indivíduos mais jovens. Isso torna mais difícil alcançar um diagnóstico definitivo, especialmente quando a confiabilidade da história clínica do paciente pode ser influenciada por comprometimento cognitivo e/ou amnésia retrógrada, ou apresentação atípica. Consequentemente, os médicos podem precisar confiar em testes adicionais para alcançar um diagnóstico.
O teste de inclinação (HUTT, do inglês head-up tilt testing) tem sido usado para induzir síncope reflexa em indivíduos suscetíveis. Segundo as diretrizes de 2018 da Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC), o HUTT deve ser considerado em pacientes nos quais se suspeita de síncope reflexa e naqueles com suspeita de falência autonômica. No entanto, testes positivos também ocorrem em pacientes com outras causas além da síncope reflexa. Isso se deve à suscetibilidade ao estresse ortostático (isto é, acúmulo venoso que ocorre ao mudar da posição deitada para em pé), o que desempenha um papel na síncope independentemente da etiologia subjacente, particularmente em pacientes mais velhos.
Portanto, um HUTT positivo nem sempre é útil para alcançar um diagnóstico definitivo e pode até causar mais confusão, especialmente em pacientes com síncope de causa incerta. Por isso, as diretrizes da ESC de 2018 consideram o HUTT como um meio de expor a suscetibilidade hipotensiva, em vez de diagnosticar a síncope reflexa. Uma metanálise anterior mostrou que as taxas de positividade do HUTT diminuem com a idade. Portanto, permanece incerto se o HUTT é uma adição útil à avaliação diagnóstica da síncope inexplicada em pacientes mais velhos, nos quais o risco de sobreposição entre hipotensão ortostática e síncope reflexa é maior.
Para esclarecer esse contexto, foi publicada recentemente uma revisão sistemática, que avaliou as evidências sobre taxas de positividade e diagnósticos estabelecidos com o HUTT, especificamente em pacientes idosos com síncope inexplicada.
Critérios de elegibilidade e estratégia de busca
Foi realizada uma busca nas bases MEDLINE e Embase, desde sua criação até 10 de junho de 2024, por publicações envolvendo pacientes idosos (idade média ≥ 65 anos), com síncope inexplicada. Buscou-se HUTT realizado em um ângulo entre 60–80 graus (que é o ângulo usual para essa indicação), com ou sem provocação farmacológica [isoproterenol (IPR) ou nitroglicerina (NTG)] e/ou massagem do seio carotídeo.
Estudos primários e metanálises com ≥ 10 participantes idosos foram considerados elegíveis. Editoriais, comentários, revisões e relatos de caso foram excluídos.
Desfechos
Os desfechos primários foram as taxas de positividade e a distribuição dos diagnósticos estabelecidos pelo HUTT em pacientes idosos com síncope inexplicada. Também foram investigadas diferenças nesses desfechos em comparação a pacientes mais jovens e controles saudáveis. Os desfechos secundários foram o tempo até a síncope (TtS) e a ocorrência de eventos adversos (EAs).
Resultados
Foram incluídos 42 estudos, a maioria estudos transversais ou coortes retrospectivas. No total, foram incluídos 12.378 pacientes idosos com síncope, média de idade de 74 anos.
Vinte e sete estudos relataram taxas de positividade do pHUTT, variando de 0,0% a 90,0% (mediana 21,6%). Dez estudos compararam pacientes idosos e jovens, com resultados variados. As taxas de positividade foram significativamente menores em idosos em três estudos (mediana 7%, intervalo 5%-19,8%, versus 14%, intervalo 12,5%-27,9%), mas significativamente maiores em outro (74,6% versus 20,0%). Vale destacar que Gieroba et al. encontraram uma taxa de positividade maior em pacientes ≥ 75 anos comparado a pacientes de 60–74 anos (21,6% versus 11,5%). Cinco outros estudos não reportaram diferenças entre grupos etários (mediana 31%, intervalo 0%-40%, versus 31,3%, intervalo 7,5%-38%).
O IPR-HUTT foi positivo em mediana de 56,7% dos pacientes idosos. Comparado aos pacientes jovens, dois estudos encontraram taxas de positividade significativamente menores para os idosos, enquanto outro não encontrou diferença entre grupos.
Um NTG-HUTT positivo foi encontrado em 30,1%-90,5% (mediana 58,5%) dos pacientes idosos. Três estudos relataram taxas de positividade significativamente menores em idosos, enquanto seis não encontraram diferença significativa. Dois estudos descreveram taxas de positividade mais altas no NTG-HUTT nos pacientes mais velhos (≥ 75 e ≥ 80 anos) comparados a pacientes mais jovens (≥ 60 anos), mas outro estudo com pacientes ≥ 80 anos não confirmou (46,3% versus 52,5%). Curiosamente, a duração do teste de inclinação não pareceu afetar as taxas de positividade, nem no pHUTT nem no HUTT provocado. As taxas de positividade do NTG-HUTT foram significativamente maiores do que as do Phutt.
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Controles saudáveis pareados por idade apresentaram taxas de positividade significativamente menores (0%-14,2%) do que pacientes em seis dos sete estudos. A especificidade variou de 92,6% a 100% para o pHUTT, 100% para o IPR-HUTT, e 85,5% a 98% para o NTG-HUTT. Em contraste, Hackel et al. relataram pHUTT positivo em todos os cinco controles durante um teste de inclinação de 60 minutos.
O tempo até a síncope (TtS) foi investigado em dezessete estudos. O TtS médio em pacientes idosos com síncope foi 21,2 minutos para o pHUTT, 7,8 minutos para o IPR-HUTT e 4,7 minutos para o NTG-HUTT.
Em relação aos diagnósticos, a mediana foi 23,7% dos casos diagnosticados com pHUTT, 44,8% com IPR-HUTT e 64,2% com NTG-HUTT.
Tanto a hipotensão ortostática quanto a síndrome do seio carotídeo foram mais frequentes em pacientes mais velhos, embora alguns estudos tenham excluído previamente pacientes com essas condições e, portanto, não tenham relatado esses desfechos.
Eventos adversos
Quatorze estudos relataram eventos adversos (EAs). Uma resposta exagerada ao NTG (hipotensão progressiva lenta acompanhada apenas por sintomas leves) ocorreu em 4,8%-24,2% dos pacientes idosos e 1%-13,7% dos pacientes mais jovens.
Nesta revisão sistemática — a primeira a investigar o papel diagnóstico do HUTT especificamente em idosos — não foram encontradas evidências consistentes de que os resultados do HUTT em pacientes idosos com síncope diferem da população mais jovem. Os desfechos dos estudos variaram amplamente; entretanto, no geral, as taxas de positividade e o número de casos diagnosticados foram comparáveis, com baixas taxas de falsos positivos.
O NTG-HUTT resultou em diagnóstico em mediana de 63,3% dos casos. Respostas vasodepressoras foram muito mais proeminentes que respostas cardioinibitórias em pacientes idosos, diferindo da população mais jovem. No entanto, evidências recentes sugerem que isso pode ser devido ao protocolo do teste, e não a uma diferença real na fisiopatologia entre idosos e jovens. Brignole et al. investigaram a taxa de síncope com assistolia em uma população de 1.046 pacientes ≥ 40 anos com síncope reflexa certa ou suspeita que receberam um gravador de eventos interno (ILR). Enquanto a taxa de síncope assistólica induzida por HUTT diminuía com a idade, a síncope assistólica espontânea documentada por ILR ocorreu na mesma taxa em qualquer idade. Achados de Russo et al. indicam que, em pacientes idosos, o reflexo cardioinibitório se desenvolve mais lentamente que a resposta vasodepressora. O retorno antecipado à posição supina (antes da perda total da consciência) pode, portanto, prevenir a resposta assistólica que ocorre nos eventos espontâneos.
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Outro ponto relevante é que, embora a especificidade permaneça alta mesmo em controles idosos, os falsos positivos podem aumentar com a duração maior da inclinação. Contudo, isso se torna menos relevante, já que a prática atual é reduzir, e não aumentar, a duração da inclinação.
Por fim, a revisão mostrou que o NTG-HUTT é seguro mesmo em pacientes idosos, com eventos adversos (principalmente leves) ocorrendo em menos de 6% dos casos, embora alguns pacientes idosos possam não tolerar o HUTT.
Limitações
Primeiramente, deve-se considerar que testar as qualidades diagnósticas do HUTT é um problema, pois não há teste de referência disponível para estabelecer o diagnóstico de síncope reflexa além da história clínica, que frequentemente é insuficiente em pacientes idosos. Como outros autores já apontaram, equiparar um HUTT positivo a síncope reflexa é uma simplificação excessiva, já que múltiplos fatores influenciam os resultados do teste (incluindo protocolo do HUTT e características específicas dos pacientes), e pacientes com síncope por outras causas também podem ter HUTT positivo .
As taxas de positividade e os diagnósticos do HUTT variaram amplamente, provavelmente pela alta heterogeneidade entre os estudos incluídos. Os protocolos dos testes também variaram bastante em duração da inclinação e uso de drogas provocadoras, embora isso tenha melhorado com o tempo, com estudos posteriores adotando o protocolo italiano com NTG. Outra limitação possível foi a decisão de incluir todas as populações com idade média ≥ 65 anos, mesmo contendo pacientes mais jovens, ao invés de limitar a estudos com populações ≥ 65 anos.
Conclusão
Em contraste com relatos anteriores, não foram encontradas evidências consistentes de que as taxas de positividade do HUTT ou o número de diagnósticos em pacientes idosos com síncope inexplicada sejam diferentes da população mais jovem. O NTG-HUTT apresenta a maior taxa de positividade, mantendo alta especificidade, e é seguro mesmo em pacientes idosos. A resposta vasodepressora é a mais frequentemente observada durante o HUTT nesta população.
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