A insuficiência cardíaca (IC) é uma das principais causas de mortalidade no Brasil e no mundo. Apesar dos avanços no tratamento medicamentoso, muitos pacientes evoluem para sintomas refratários mesmo em repouso e/ou com pequenas atividades, o chamado estágio D da IC (lembrando que aqui estamos falando da ICFER, a IC com fração de ejeção reduzida).
As arritmias ventriculares são uma complicação frequente nesta população ocorrendo em 30 a 45% dos pacientes. As formas mais comuns são extra-sístoles (ESV, 1 ou 2 batimentos), taquicardia ventricular não sustentada (TVNS, 3 ou + batimentos, com duração < 30 seg e sem manifestações clínicas), taquicardia ventricular sustentada (TV) e fibrilação ventricular (FV).
O paciente com arritmia ventricular tem alto risco de morte súbita e por isso hoje é consenso que pacientes com IC e FE < 35%, a despeito do tratamento clínico otimizado, são candidatos à colocação de um desfibrilador implantável como profilaxia primária.
O problema é que mesmo com o desfibrilador implantado (CDI), o paciente pode continuar a apresentar arritmia ventriculares, havendo choques inapropriados e/ou repetidos. O que fazer então?
Passo 1: identifique fatores desencadeadores ou descompensadores. Você deve avaliar eletrólitos (destaque para potássio, cálcio e magnésio), função renal, isquemia residual ativa, interações medicamentosas (atenção especialmente ao QT longo) e doença de base em progressão (ex: Chagas).
Passo 2: peça um ecocardiograma para avaliar a função sistólica geral e regional. Provavelmente será necessário complementar com ressonância, cujo detalhamento anatômico de áreas de cicatriz/fibrose é mais preciso. Diversos estudos mostram correlação entre a presença de cicatriz/fibrose na RM e maior risco de TV/FV. Aqui, há duas menções importantes:
- Pacientes com QRS > 150 ms e padrão de BRE podem se beneficiar de ressincronização cardíaca (CRT). O CRT pode ser combinado a um CDI, caso o paciente ainda não tenha, e há evidências que pacientes ressincronizados têm menor risco de arritmias ventriculares.
- Áreas de fibrose podem ser candidatas a estudo eletrofisiológico e se forem o único foco de uma arritmia ventricular, a ablação é uma excelente opção terapêutica como “primeira linha”. Ou seja, nestes casos peça o parecer de um cardiologista especialista em manejo invasivo de arritmias.
Passo 3: medicação. Em ambiente hospitalar, para uso parenteral, estão disponíveis a lidocaína e a amiodarona. Para uso oral, há apenas a amiodarona. Os demais antiarrítmicos, como sotalol, propafenona e procainamida, estão contraindicados em pacientes com ICFER avançada.
Passo 4: no paciente refratário à amiodarona, há indicação para estudo eletrofisiológico e tentativa de ablação dos focos de arritmia. Há dois problemas nesta estratégia: (1) a origem da arritmia pode ser multifocal ou não identificável, sendo inviável a ablação e (2) o próprio procedimento invasivo pode descompensar a IC. São fatores de risco para descompensação da IC neste contexto: idade > 60 anos, DPOC, anestesia geral, cardiopatia isquêmica, NYHA III ou IV, FE < 25%, diabetes melito ou tempestade elétrica (VT storm). O escore PAINEESD foi desenvolvido com base nestes fatores de risco e a proposta é que os pacientes de alto risco recebam monitorização hemodinâmica invasiva pré, per e pós procedimento e/ou assistência circulatória mecânica. Os pacientes são divididos em baixo (< 10 pontos), médio (10-16 pontos) ou alto (> 16 pontos) risco.
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Variável | Pontuação |
DPOC | 5 |
Idade > 60 anos | 3 |
Anestesia geral | 4 |
Cardiopatia isquêmica | 6 |
NYHA III ou IV | 6 |
FE < 25% | 3 |
Tempestade elétrica | 5 |
Diabetes melito | 3 |
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